22.10.23

Diário de Bordos - Palma, Mallorca, Baleares, Espanha, 22-10-2023

Começo o dia com as Quatro Estações, história de celebrar a chegada do Outono, finalmente; e passo a manhã em modo outonal: a não fazer nada. Passar o aspirador, seleccionar algumas fotografias, ouvir música, beber o vinho que ficou de quinta-feira, responder a um pedido de informação sobre o BP. A lista poderia continar mas o resultado seria o mesmo: nada. «Um voo cego a nada»? Nem por isso. Mas não vamos agora estragar tão linda e terna melancolia com laivos de realismo, de explicações ou de desculpas. Basta vivê-la na sua plenitude e ir saltitando até a fome me obrigar a ir almoçar. Ou a cozinhar as costeletas que comprei ontem no Pere Garau. Quem falou em «nada»? Há lá coisa menos vazia do que saltitar de indecisão em indecisão, de dúvida em dúvida, de espera em espera, de desespero em desespero, de esperança em esperança? 

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Fast forward umas horitas.

As indecisões musicais levam-me a Patti Smith e a energia da senhora (fortemente aliada à fome) arrancam-me da letargia. Começo por terminar o pão que tinha a bordo com uma boa barradela de harissa, continuo por tomar a decisão de fazer harissa na terça-feira, quando o Cristian abrir e puder comprar alcaravia, pego decididamente na burra e vou almoçar ao Bar Coto Dos que é barato, está perto da marina e é bom. Dali vou ao El Corte Inglés comprar alho para as costeletas de logo, aproveito e compro uma cervejas checas para alargar o meu leque gambrinus-empírico (piada semi-privada), não menciono o gelado que comi no quinto andar porque tenho vergonha e ooops, venho para bordo. No caminho a Cantina salta-me à frente, obriga-me a parar e agora escrevo relaxadamente à frente daquela mistura de gelado de chocolate e rum perante a qual todas as indecisões, melancolias e desesperanças se desvanecem como alguns amores e as decisões, esperanças e alegrias se fortalecem como outros. (Ontem a garrafa de Cacique acabou e hoje bebo Matusalem. A ver se esta energia toda não se dissolve quando vir a conta. Isto dito, acho inadmissível que os encarregados dos diferentes waterholes por onde passo não consigam prever o fim portanto anunciado das garrafas de rum.)

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Penso na C. V., a quem de resto vou dedicar este post, mas não menciono o resultado de tão aturados pensamentos pela razão simples de que não os há; e se os houvesse seriam para mim (e quando muito para ela), não para um blogue público.

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De entre as decisões firmes: comprar uma garrafa de rum para o meu P. Bem sei que não sou grande bebedor quando estou sozinho a bordo, mas as porções que os empregados dos já mencionados waterholes me servem têm a curiosa e comum característica de se medirem mais em gotas do que em goles. Tudo isto sem proporção com o que as ditas gotas pesam no porta-moedas, coitado.

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Escrevi finalmente à Angel Pilot. O que é demais é demais. Se não me responderem publico a carta.


(Para a C. V.)

PS - A garrafa de hierbas secas que tenho a bordo está quase a acabar, eu sei. Mas a substituição está prevista, não está nas mãos desses indiferentes empregados de bares, cafés e restaurantes.

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