O meu passaporte está quase a expirar. Não me refiro ao documento em papel. Esse ainda há pouco tempo o renovei. Nada disso. Refiro-me ao outro, aquele que nos dão à nascença e nos permite mudar de vida e não só de país. Transitar de uma vida para outra é diferente de mudar de um país ou de um continente para outro. Para começar, a mudança de vida só tem um sentido. Não se pode voltar atrás.
- Olhe, desculpe, enganei-me. Esta vida não me serve. Posso voltar à anterior?
Com quem estaríamos a falar, se fosse possível dizer isto? Connosco próprios, claro. A resposta seria imediata e lapidar:
- Meu caro, este comboio só tem uma linha e um sentido. Não há maneira de voltares atrás. Desejo-te toda a sorte do mundo.
Depois, as estadias nas vidas são mais longas do que nos países. Contam-se em anos, muitos anos. De maneira tenho de ir tratar do passaporte.
Mas não porque queira mudar de vida. Quero acrescentar outra a esta e para isso preciso de um documento que me permita ter as duas ao mesmo tempo. Não sei se o passaporte será o indicado.
- Quero ter duas vidas, poder mudar de uma para a outra quando me dá na gana, viver as duas em paralelo. Tenho os lugares das duas bem definidos: uma na Europa e a outra no mar. Só me falta o passaporte.
Ou seja lá como aquilo se chama.
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