4.3.24

Diário de Bordos - Le Marin, Martinique, DOM-TOM França, 04-04-2024 / II

A chuva ainda não parou. Limitou-se a abrandar até ser quase imperceptível. Mas deitado no beliche oiço-lhe os pingos. Em miúdo li um livro que contava a vida a bordo de um submarino alemão na segunda grande guerra. Na altura impressionou-me bastante, tanto mais que a maioria dos livros de guerra que lia eram vistos pelo lado dos aliados. Uma das coisas de que me lembro é da descrição do que os marinheiros sentiam quando ouviam o ping de um sonar. Lembro-me sempre dessas páginas quando oiço a chuva assim, escassa, gota a gota, pingo a pingo.

(Claro que não é comparável,  eu sei, escusam de me chamar exagerado ou pé-de-salsa ou coisa que o valha.)

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Mais uma conversa com o puto etíope. Desta vez falei também com a namorada dele, igualmente adorável. É novinha, deve ter pouco mais de vinte anos. Estão verdadeiramente apaixonados, querem casar ou viver juntos (pacser, para quem sabe o que isso é), mas isso implica uma estadia longa na Martinica e sem garantia de sucesso. O que ele quer, obviamente, é evitar que as autoridades o ponham num avião a caminho da Etiópia.

Disse-me que não precisa de um visa para entrar na Dominica. Vai tentar ir para lá.  Acabei por convidá-lo a beber uma cerveja a bordo. Se não conseguir encontrar maneira de o trazer - ou de o fazer apanhar um avião - lembrar-me-ei dele como ainda hoje me lembro do terror dos submarinistas quando ouviam o sonar.

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E ainda há quem acredite na bondade dos Estados.

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