(Refiro-me à política nas democracias ocidentais. Nas ditaduras, autocracias e cardumes de robalos é diferente e muito pior.)
A política é um mal necessário. Consiste basicamente numa troca: uma pessoa com um ego muito grande, motivações diversas - que podem ir da megalomania ao altruísmo, com vários desvios e desvarios de permeio - promete às pessoas as coisas que ela pensa elas querem ouvir. Em troca, os eleitores elegem-na e esperam que ela cumpra as promessas ou pelo menos parte significativa delas. De vez em quando aparece um político cuja motivação pende mais para o lado do altruísmo, o que é louvável e desejável; não é, contudo, frequente. A megalomania e a vontade de «fazer coisas» são de longe dominantes. A única forma que o eleitorado tem de manter o acordo é ser exigente e não ser ingénuo, resignado ou esperar que da mesa do poder caiam algumas migalhas. Essa exigência, abundante em países como a Alemanha, os países Nórdicos, a Suíça e por aí fora falta em Portugal, o que explica a fraca qualidade da nossa política (fraca se aferirmos pelos resultados. Se o critério for outro a apreciação é diferente). Por isso é preferível julgar quem nos governa pelo que faz a pelo que diz.
(Ou melhor: pelo que deixa fazer. Deus nos livre de políticos que fazem. Seria como um polícia sinaleiro que descesse do seu pedestal e começasse a conduzir os automóveis que por ali engarrafam. A paralisia não só não se resolveria como ficaria mil vezes pior - como de resto vemos no nosso país.)
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No sábado fui assistir à cerimónia de lançamento da candidatura de uma senhora à presidência da câmara de Caminha. A apresentação seguiu o cânone: discurso de amigos - cultura - mais amigos - video sobre a senhora - discurso da candidata. De entre os amigos ressalto o discurso do alcaide de La Guarda, o menos langue de bois de todos. A cultura foi representada por música tradicional portuguesa tocada ao cavaquinho e à guitarra, o que faz sentido. Jazz, música tradicional irlandesa ou togolesa não seriam adequados. O video foi um slideshow. A candidata sendo fotogénica a coisa passou bem. Chegou finalmente o discurso da senhora. Se há coisa a que resisto mal é a uma boa retórica. Há um elemento emotivo na política, por muito racionais que sejam os olhos com que a olhamos. A forma é um elemento fundamental na constituição dessa emoção. Resultado: decidi que votarei nessa candidata.
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Caminha é uma jovem bonita parada à beira da estrada à espera de uma boleia, mas o único carro em vista está parado por incapacidade do condutor. Penso - ou melhor, acredito - que a candidata cuja apresentação fui ver ontem tem qualidades para conduzir o automóvel e dar boleia à jovem - que de resto não é assim tão jovem, de onde o seu enorme charme. No que pessoalmente me toca, a actual câmara municipal parece uma corrida dos cem metros barreiras com atletas tetraplégicos. Entre estes e a senhora, a escolha é simples, inevitável: uma promessa de competência vale mais do que a paralisia comprovada.
É claro que o meu voto não fará diferença nenhuma no cômputo geral dos votos. Não é por eu pensar que Caminha precisa de uma marina (e nisso estar envolvido), que a ponte sobre o Coura deve incluir uma passagem para peões e ciclistas (interesse próprio), que esta foz devia estar cheia de velas de miúdos a aprender a navegar ou que explorar lítio na serra de Arga é um disparate (para todos) que isso acontecerá ou não. Esse é o lado emotivo, quase camusiano, da política democrática. Mas, parafraseando alguém que muito admiro: a política sem emoção é uma vergonha, sem Razão uma chatice.
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Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.