21.3.25

Espera, desnorte e outros diabos

Está desorientado quem não sabe aonde está ou para onde ir; e desnorteado quem não sabe o que fazer. Desocidentado não existe e desolado não é sequer para aqui chamado. Ou seja: certos e seguros só o sul e o ocidente - o que explica, sem dúvida, a velha expressão "vai para oeste, jovem" tão usada no cinema, na música e na má literatura. F. não estava nem desorientado nem desnorteado. Estava desesperado, mas a espera não sendo um ponto cardeal de nada lhe servia tentar encontrar soluções para esse doloroso estado. A menos, claro, que dissolvesse a angústia em água, sempre seria uma solução. F. pensava nisso seriamente.  Estava farto do café, vinho e sumo de  kiwi em que dissolvia os estados de profunda prostração que regularmente o submergiam. "Água", pensou, "é a solução. Resta saber se lisa se gasosa."

Dilema esse que não resolveu. O simples facto de ter de fazer uma escolha magoava-o. Passara a viver num café aberto vinte e quatro horas por dia, todos os dias. A cada meia hora consumia uma água, alternadamente com e sem gás. Pagava-as mal chegavam à mesa, para não dar pretextos de expulsão ao dono e aos empregados. Quand dormia, os empregados deixavam-lhe as águas na mesa. Pagava-as quando acordava.

Um dia acordou. Bastar-lhe-ia encontrar um norte e o caminho para lá chegar e deixaria de estar desesperado, apesar de continuar sem saber aonde fica a espera.

Ninguém sabe, excepto o Diabo.

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Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.