4.5.25

Diário de Bordos - Anse Marcel, St.-Martin, Antilhas francesas, 04-05-2025

O começo não foi lá muito auspicioso. Fui ao Cadisco meter água, o que no MADRIGAL VI representa hora e meia de convivência com bêbados e uma luta contra a minha intolerância para a espécie. Hora e meia para meter seiscentos litros de água é um exagero, qualquer que seja o critério ou o ambiente. Depois regressámos ao lugar, comi qualquer coisa - qualquer coisa feita pelo W. é «qualquer coisa» - e fui à D's Beach. A praia é porreira e não muito longe, mas a música estraga tudo. Felizmente esqueci-me da carteira dos euros e dos carttões e só tinha dólares para dois Painkillers que são, devo dizê-lo, os melhores que até hoje bebi nesta ilha. Dois cocktails dão direito a dois mergulhos, na minha contabilidade. Voltei a bordo buscar a supra-mencionada carteira e vim para a Anse Marcel. É a praia mais bonita da ilha, sobretudo para quem não gosta muito de praia: o bar é porreiro, a música má mas baixinha, a paisagem bonita e o Dark'n Stormy relativamente próximo do original. A ideia era relaxar, esquecer-me da merda do bote e escrever meia dúzia de disparates. Neste ponto falhei mas nos outros consegui. Uma coisa é escrever e outra descrever.

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A paisagem é linda, a luz idem, o restaurante está vazio e o homem uma simpatia. Sou sensível à beleza, o que por um lado explica o que me chateia nestas ilhas e por outro me faz ver aquilo que nelas gosto. Basta aprender a separá-las, as coisas de que gosto e as que não suporto. Um dia pô-las-ei numa balança e farei o balanço.

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Ontem troquei o mordedor dos rizos e da escota da grande. Troquei é uma maneira de dizer: quem fez o trabalho foi o Q. Eu limitei-me a explicar-lhe o que queria e a enganar-me na marca do mordedor, o que assim visto de fora parece difícil mas no mundo encantado do Luisinho Serpa não é. Voltei à IWW com o Q., trocámos a peça e tudo correu às mil maravilhas. O Q. não me contou todas as horas e eu convidei-o para almoçar, troca que assim de repente me parece justa. Além de agradável, claro, nada despiciendo.

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O dia cai, o café fecha, a luz alaranja-se e o verde do monte à minha frente torna-se mais denso. O vento rondou ligeiramente - sei porque olho para o cata igual ao meu que está ali fundeado. Só me resta desligar o computador, pagar e pensar na sorte que tenho. Podia ser pior. Muito pior. E melhor? Talvez. De certeza. Não sei. Sendo rico, por exemplo. Mas eu tenho as vantagens da riqueza sem as respectivas desvantagens - tal como, de resto, com a pobreza: oscilo entre uma e outra sabendo que as duas são irreais, passageiras.

A única coisa perene é esta beleza, este fim de dia, esta mistura de verdes, azuis e brancos, esta nostalgia antecipada: um dia não terei nada disto. 

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