Ao contrário de Bruno, e como todos os imbecis, Daniel era muito ambicioso. E pensava que a sua relação com Hannah o ajudaria nas outras cadeiras do curso. Enganava-se, claro, redondamente.
Mas antes de prosseguir, sintetizemos e fixemos:
Hannah é uma senhora de quarenta anos, alta, magra, de cabelos castanho claro, encaracolados. Olhos: verdes, grandes e bem abertos. Dá aulas de História Judaica numa Universidade local. Tem um amante; para além do nome, só o sentido de humor, a sensualidade e um nariz muito ligeiramente adunco traem as suas origens. Não sabe se o marido sabe, mas suspeita que ele suspeita, da sua relação adúltera.
É casada com Bruno, sensivelmente da mesma idade - talvez um pouco mais velho. Decidamos agora que tem quarenta e dois anos, e foi recentemente nomeado director de um jornal diário de prestígio. É bonacheirão, pouco ambicioso, mas extremamente inteligente. Ganhou peso (ele prefere dizer "densidade"), pois gosta de comer e beber - aliás, a cozinha é o seu hobby.
Daniel é o amante de Hannah: tem vinte e poucos anos, é magro, não é muito bonito e é burro. Inscreveu-se em História Judaica porque tinha poucos alunos, e ele julga-se talhado para vôos altos - menos concorrência, pensava, facilitar-lhe-ia o acesso a notas mais altas. Mas Daniel era aquilo a que os franceses chamam um coureur de jupons; e caíu direitinho no habitual jogo de sedução de Hannah - que, desta vez, não teve vontade de o interromper e decidiu levá-lo até ao fim. Ela não percebe bem porquê; Daniel não percebe de todo; e eu próprio tenho algumas dúvidas.
Hannah e Bruno, um pouco contra a vontade do autor, tiveram dois filhos: Tomás, de doze anos (não confundir com Tomás, de quinze, meu filho) e Helena, de dez (idem com Helena, minha filha, de doze). Livremo-nos deles: inscrevem-se numa escola de vela - o que tem a vantagem dupla de justificar a presença dos pais num restaurante "marítimo" de Cascais por uma tarde chuvosa de sábado, e de os afastar das nossas preocupações, pelo menos por agora. Resisto à tentação de os colocar internos num colégio da Suiça, por exemplo: isso implicaria telefonemas, e-mails, webcams, viagens, lágrimas e suspiros, grandes abraços e deslocações frequentes ao aeroporto de Lisboa (de resto bastante bonito, e onde gosto bastante de chegar).
Hannah e Bruno têm uma vida sexual "saudável", como se dizia nos anos sessenta; ela diz que ele faz o melhor cunnilingus do hemisfério norte - tendo uma certa prática pré-matrimonial do assunto podemos acreditar nela. De facto a sensualidade requer inteligência: sem esta aquela não passa de lascívia. E os dois completam-se bem.
- Devias aprender a fazer um cunnilingus decente -, disse um dia a Daniel (se fosse com Bruno, teria utilizado o termo "minete", que achava muito mais bonito. Contudo, não gostava de estragar palavras bonitas com o amante). - Já te expliquei que "suave" é a palavra-chave.
- E tu, pensas que és uma rainha do sexo? - retorquiu ele, zangado.
(Aproveito para dizer ao simpático leitor e explorador que todos os dias utiliza o seu Satphone, nas profundezas da Amazónia, para me ler, que os hábitos sexuais e alimentares das tribus rivais Guaranápati e Guaranápraqui me interessam pouco. Já a leitora de Heidelberg, simpática vila da qual tive um dia oportunidade de conhecer uma digníssima e fogosa filha, me pode mandar, por favor, uma fotografia e um número de telefone, que prometo não divulgar).
- Ora aqui está o meu ursinho todinho zangadinho coitadinho, chincalhava ela. E chupáva-lhe o dedo grande do pé, técnica aprendida em Amsterdam com um vago conhecimento asiático, que o punha imediatamente com uma erecção indesejada, por vingança. Hannah troçava de Daniel. Uma das suas "piadas" favoritas era fazê-lo terminar muito depressa. Ele enchia-se de má consciência e ela dizia-lhe que não fazia mal - enquanto pensava "meu burrinho, um homem só ejacula quando está farto, e eu limito-me a fartar-te depressa." O que não era difícil.
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Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.