9.9.05

Todos iguais

O ministro francês da Economia, o senhor Thierry Breton, quer que as empresas petrolíferas adoptem um comportamento "cidadão". A "comportamento cidadão" atribui ele o sentido de "não repercutir nos preços de venda ao público o aumento do preço de petróleo nos mercados".

Eu acho, humildemente, que ele tem toda a razão. A tendência das empresas para fazer variar os seus preços de revenda quando os custos da matéria prima variam é bem conhecida, e é claramente um comportamento anti-cidadão - ou a-cidadão? - e anti-social (excepto quando baixam os preços, naturalmente, mas quando a variação é nesse sentido nem se fala no assunto).

Por uma razão incompreensível, quase todas o fazem - com a excepção notável dos agricultores, que são depois recompensados pelo seu "comportamento cidadão" com latas subvenções - o que de resto demonstra que se pode ter um "comportamento cidadão" e ganhar muito dinheiro com isso (neste caso, duplamente "cidadão" porque são, claro, os cidadãos quem paga os subsídios).

Mas há, senhor Ministro, mais áreas de actividade que, acho eu humildemente, requerem urgentemente a sua intervenção benigna e atenta.

Em primeiro lugar, refiro-me, está bem de ver, aos restaurantes; os quais, ao adoptar uma lista de preços independente do estado emocional e afectivo do cliente dão provas de uma intolerável indiferença ao sofrimento humano. Por exemplo, ainda recentemente comi um sublime, um magnífico, um enorme desgosto de amor - que me custou 60 euros! Sessenta euros, senhor Ministro. É manifestamente exagerado para quem sofria como eu sofria - mesmo tendo em conta o facto singelo, irrefutável mas compreensível de eu ter bebido vários aperitivos e um conhaque (ou ao contrario, não me lembro bem). Outro exemplo: ontem, acometido que estava de ligeira nostalgia - muito ligeira (tingida, é verdade, de uma ponta de dor: mas leve, muito leve): 33 euros. 33 euros por uma nostalgia ligeiramente tingida de sofrimento? Senhor Ministro, por favor, veja como essa corja de restauradores enche os bolsos à custa das emoções dos cidadãos! Imagine quanto vou pagar se tiver, um dia, de pagar uma euforia ou - tudo é possível - uma vitória? Eu acho, senhor Ministro, que o senhor devia chamar os restaurantes à pedra e obrigá-los a ter uma lista de preços com preços estabelecidos em função do estado afectivo e emocional do cliente. Começava na dor profunda, com uma redução muito grande, a qual iria gradualmente decrescendo á medida que as emoções das pessoas se fossem tornando mais positivas, mais ligeiras.

Repare, senhor Ministro, que o controle seria facílimo: quem, mas quem, se atreveria a pedir um desconto "dor profunda" se entrasse no restaurante, por exemplo, a sorrir alarvemente? Quem iria, suponhamos, pedir uma tarifa "dor de corno" se estivesse acompanhado por uma bonita mas ingénua loira, ou com uma morena densa e misteriosa?

Quem ousará pedir uma "nostalgia dolorosa" se estiver, visivelmente, em estado de "nostalgia ligeira"? Acresce, senhor Ministro, que quem usufrui dos restaurantes são os cidadãos, incapazes, eles, de adoptarem o comportamento ganancioso, especulativo e anti-social das maléficas empresas petrolíferas que se aproveitam de um mísero aumento de 200 ou 300% no preço do crude para nos aumentarem a gasolina 5 ou 10%? Que desplante!

Defenda, senhor Minsitro, os cidadãos do seu pobre país, que estão nas garras malvadas das sociedades que ganham dinheiro a vender esse inútil e poluente produto que é a gasolina. (Já agora, por solidariedade: eles que baixem também o preço da cerveja. Imagine que acabo de pagar 5 euros por uma imperial. Cinco euros!!! - apesar de estar num estado emocionalmente neutro, acho que devia ter um desconto porque me comportei como um verdadeiro cidadão quando pedi e esperei - oh se esperei - pela cerveja: não cuspi no chão, não arrotei antes de beber, não acariciei os seios à senhora da mesa ao lado (se bem tivesse muita vontade); nem sequer me zanguei com o empregado por causa da espera. Apesar disso paguei cinco euros por um copo de Fosters. Senhor Ministro, acuda!.

(cont.)

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