13.5.12

Belém, Pará, Brasil, 12-05-2012

O dia foi de passeio. De manhã para os lados do rio, do mercado, do centro; de tarde para o lado oposto. 

Esta cidade é magnífica. Ver-o-peso deve ser dos mercados mais bonitos, maiores, mais apaixonantes que conheço - e é sem dúvida o que tem melhor vista. É enorme; divide-se por várias áreas, por vários edifícios, pelas ruas. Cheira bem, cheira mal, não cheira, fede, vende tudo e mais alguma coisa e mais ainda. Uma das áreas que não cheira mal é a do peixe, o que pelo menos prova que o peixe é fresco. O resto é uma sequência de barracas, stands, bancas - as da carne são lindas - pessoas aos gritos, música aos gritos, cores aos gritos, tudo grita naquele mercado, mesmo ao lado do rio Guajará, um dos muitos braços do delta do Amazonas. O rio - largo, lento, majestoso - é a única coisa silenciosa naquele mercado.

À tarde foi a vez das ruas largas, passeios larguíssimos - há quanto tempo não via passeios assim - mangueiras grandes e frondosas com as copas a tocarem-se num túnel alucinante, ruas pejadas de autocarros, uns atrás dos outros como só na Londres de antes da taxa vi.

Foi também dos esgotos a céu aberto, dos passeios nos quais não se pode andar a olhar para o ar sob pena de perna partida, ou pior, dos carros com sistemas de som que chegam para pôr um quarteirão inteiro a ouvi-los. Aquilo deve ser a versão brasileira de pôr as canções de que gostamos no Facebook, suponho. Mas no Facebook ouve quem quer, e a música daqueles selvagens ouve-se a centenas de metros - e é má, ainda por cima.

Há aqui um dissonância cognitiva: não consigo imaginar um país assim quinta economia mundial; não bate a bota com a perdigota.

Enfim, amanhã estarei na Guadeloupe, ou seja em França. Vinha a pensar que ali a dissonância é outra: como é possível gostar tanto de la France, e detestar ainda mais la Fraaaaaannnnce? Felizmente é para a primeira que vou, nela que me desloco e respiro; a outra só me chega pelos jornais e pela televisão, que só raramente vejo e leio, graças a Deus. E na qual não penso, porque la France enche-me as medidas todas, faz-me esquecer tudo o mais. Amanhã vai ser dia de vinho tinto, accras de morue, boudin créole, ti'punch e planteur. Dieu est grand et français, tu verras.

A televisão anuncia mais um escândalo com dinheiros públicos. Não há dia, não há jornal que não tenha o seu escândalo; nem o do Cachoeira - um bicheiro que tinha metade da classe política comprada - ofusca os outros. Não sei qual será o resultado disto; de vez em quando matam um jornalista - acho que a conta vai em seis nestes últimos anos - mas, verdade seja dita e honra lhes seja feita, os jornais e telejornais continuam a expor aquilo tudo. É um poço sem fundo.

O fantástico para mim não é que o façam; não sei quando começaram, sequer. É a dimensão e a profundidade da podridão. Esta classe política vê os cargos públicos como um atalho para o enriquecimento imediato; não espera, como a nossa e muitas outras, pela saída do governo para arranjar uns tachos valentes.

Demain la France.


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