23.1.16

Diário de Bordos - Kalamakis, Atenas, Grécia, 23-01-2016

Esperava gostar de Atenas; tudo o que viesse depois do que por aqui passei seria bom. Nunca pensei que gostaria tanto e pelas razões porque gosto: a simpatia das pessoas, prestáveis e sempre com um sorriso na cara; a beleza absolutamente deslumbrante das mulheres - foi a isso que o Chico escreveu aquele magnífico hino, aposto -; a comida; poder andar de táxi à frente sem ser chateado com o cinto de segurança.

Há muito naturalmente duas ou três coisas que não mudaram. São poucas, felizmente. Uma delas, a pior, é a a absoluta falta de respeito dos automobilistas pelos peões.

Com o Mark em 1981 chegámos a um ponto tal de saturação que um dia começámos a dar murros num autocarro que nos tinha cortado o caminho numa passagem de peões. O condutor saiu, contornou o veículo pela frente e veio para nós. Quando nos viu parou e começou a desafiar os passageiros para virem também. O Mark e eu decidimos que não era o momento certo para criar um incidente diplomático envolvendo três países e saímos dali calma mas rapidamente, com a namorada dele, uma miúda magrinha e com as pernas em forma de x cujo nome acaba de me ocorrer - Debbie - pela mão. Ela não conseguia andar depressa e tínhamos de a puxar.

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Ontem voltava do Agora e tive uma pequena e esperava eu passageira necessidade de comer. Era meia-noite e queria comer uma coisa rápida. Entrei num restaurante no qual um trio tocava música grega. Bouzouki, voz e viola. O bouzouki era excepcional, a viola seguia e a voz acompanhava (como era bonita não se notava muito que havia um pequeno desfazamento). Acabei por ficar, pedir mais deste vinho tinto tão leve que parece água com um bocadinho de corante e mesmo assim consegue não ser rosé. Às duas o dono do restaurante veio chamar-me para a sua mesa, onde estava com a mulher e alguns amigos.

Fiquei até às três e quase meia, a conversar sobre o Tsipras, Syriza, Merkel e companhia. As opiniões na mesa divergiam mas a conversa foi civilizada. Hoje vou lá jantar com a tripulação.

O grupo é tão bom que merecia um convite para tocar em Portugal.

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E é isto. Amanhã largo. Se tudo corresse bem só pararia nas Canárias. Mas é raro as coisas correrem bem. Só espero que não corram muito mal e não apanhe nenhum arraial pela proa. É pedir muito, eu sei. O Mediterrâneo no inverno é um horror.

Mas são quinze dias. É um piscar de olhos.

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Se bem com o frio que está até passarmos a Sicília vai ser uma seca.

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Tenho tido sorte com as tripulações, ultimamente. Esta excede tudo o que tive até agora. Bato na madeira três vezes, ou as que forem precisas para que continuemos como estamos agora.

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Os gregos não são propriamente silenciosos mas numa mesa na outra ponta do restaurante está um grupo de brasileiros. São os únicos que se ouvem. No Brasil as pessoas habituaram-se a falar aos gritos por causa do ruído ambiente e depois é difícil adaptarem-se a outras necessidades.

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