Venho ao lado francês. O objectivo era procurar um tripulante, mas perco-me num Planteur (a versão francesa do Rum Punch), num copo (ou dois) de rosé, nesta calma absoluta: não há barulho de motas ou carros a acelerar, o empregado não vem perguntar-me de cinco em cinco minutos se está tudo bem (está). Até o vento parece ralentir.
Esta - já aqui o devo ter dito algumas vinte vezes - é uma das coisas que me faz gostar de St. Martin: poder mudar de país em dois driver stop, please (faço questão no please. A norma dispensa-o). Um vai da marina até à Rotunda; o outro desta a Marigot. Dois dólares e cinquenta cêntimos, dois Driver, stop, please e muda-se de mundo.
Daqui a pouco vou às accras da Cisca, aos boudin créole e a um ou dois (se houver) crabe farci. Depois volto para bordo. Sem tripulante mas de alma cheia. (Não que tenha a alma na barriga. Não tenho, ou não tenho só. Mas rima com calma e dizer "volto para bordo de calma cheia" não funcionaria...)
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Gosto de Marigot, mas tenho a alma noutro lado, noutra praia. Quero chegar depressa a Los Angeles. Que estranho, não é? Estar aqui e ali e querer estar acolá e ser daqui e querer ser dali... Como se o mundo fosse uma pastilha elástica com a qual se fizessem balões que não rebentam.
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Mar. A viagem até ao Panamá vai ser rápida. Já a fiz duas vezes no sentido inverso, à bolina. Agora vai ser uma longa descida à popa. Vou fazer em oito dias o que da primeira vez me levou quinze e da segunda um mês - incluindo quinze dias na Jamaica, é preciso dizê-lo -.
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A ferida do pulso está quase fechada, quase tratada, como se o corpo tivesse decidido, ele também, concentrar-se no que é essencial e deixar de lado o que não o é.
Sobrevivi a quase todas as feridas que me fiz ou fizeram. Ou a todas, se considerarmos que ainda estou vivo. Cicatrizado, mas vivo.
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[Adenda]
Acabei por voltar de gipsy. Gosto desses táxis clandestinos que me deixam entrar a fumar e não me obrigam a pôr o cinto. Pago cinco dólares em vez de dois e meio, mas demoro menos de metade do tempo, não páro de cinco em cinco minutos e o homem só me diz para apagar o cigarro quando este está no fim. Não sei se fez de propósito, mas que foi elegante foi.
Que noite tão boa, tão St. Martinienne...
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Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.