8.12.18

Quase

Foi numa praça deserta, só estávamos ela e eu, noite cedo (quase se via o dia ainda), eu bebia um vermute e ela dizia-me "estou comovida".

- Descomove-te, mulher - respondi. - Não há quem não tenha um amor assim, antigo e eterno como a dor nas costas. Aprende-se a viver com ele, é como ser um bocadinho surdo, muda o mundo mas pouco, ouve-se tudo na mesma, quase tudo e o meu amor por ti é esse quase, é o que me falta para ter o mundo todo, o que falta para que esta noite seja noite, para que esta praça se encha de miúdos a andar de skate ou de jovens senhoras trintonas a comentar as últimas compras que fizeram ou os últimos engates que aceitaram, falta pouco, não passa de um pequeno quase, habituamo-nos a viver com ele (ou sem ele, se preferires), é como ter fome e saber que o jantar está quase apesar de saber que o teu amor não está quase, se te descomoveres é mais fácil apreciar a beleza desta praça tão pequena, tão elegante, bem proporcionada e acabarmos o vermute em paz.

Enfim, quase paz. 

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