28.2.19

"É prá poncha"

Aposto que vos acontece a todos: um gajo volta para casa, tranquilamente na sua bela pasteleira (ou na veloz Vitus). O dia foi bom, mau, assim assim ou não cabe sequer nessas categorias. A noite está fria ma non troppo, ou cálida ou mesmo quente. Um gajo vai pensando no dia de amanhã, evitando pensar no dia de hoje ou vice-versa e quando chega ali a Santos salta-lhe um bar ao caminho. Isto pode parecer uma fórmula retórica, mas não é: o bar salta-lhe literalmente ao caminho, oferece-lhe uma árvore para amarrar a bicicleta ("oferecer" não é o verbo adequado. "Impõe-lhe" está mais perto da verdade) e que pode um homem fazer se não descer da sua burra, amarrá-la à dita árvore e entrar no bar?

Chama-se É prá poncha e pertence ao meu amigo Elmano e ao seu irmão Manuel, que também é meu amigo mas que conheço menos. Com o Elmano fui a La Rochelle, cidade conservadora s'il en est.

Não falo do bar: não é por isso que lá vou. Falo da Poncha, um cocktail que rivaliza com o Painkiller do Soggy Dollar em Jost van Dyke, com o Alexander do Luís do Procópio (e só com este; os outros não são bem Alexanders), com o Dry Martini do Sr. Miguel do Pavilhão Chinês ou com o medronho que neste momento bebo, dádiva do Nuno: todos eles são provas de que Deus existe, escolhe caminhos inesperados para se manifestar e não se importará muito se acabarmos por Lhe preferir as manifestações à existência.

O caso da poncha tem um bónus: ver o Elmano fazê-las. Há uma forma de beleza no trabalho bem feito e esta é particularmente difícil de atingir: gestos rápidos, precisos e por conseguinte belos não estão ao alcance de todos. Uma poncha demora mais tempo a fazer do que qualquer das bebidas que citei, o que lhe demonstra a superioridade. Feitas pelo Elmano ou pelo Manuel não são bebidas: são obras de arte sacra.

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