25.12.19

Francofilia e tudo o que a precedeu

Vou dar uma volta à ilha. É uma tentação estranha, esta: quando se está numa ilha ninguém resiste a dar-lhe a volta, seja de carro, de barco, a pé, de bicicleta. (De avião não creio, é desnecessário: vê-se o território todo de uma vez.) De onde virá esta necessidade de delimitar o território, de lhe percorrer as fronteiras? De nos certificarmos que sim, estes são bem os limites? Ou será antes uma forma simples e pragmática de se maximizar o percurso?

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Tudo fechado. Lembro-me dos domingos na Suiça, quando lá cheguei, dos domingos no Reino Unido quando aquilo ainda era a Inglaterra, dos domingos na Alemanha aqui há um ror de anos e começo a pensar na estranha capacidade que estes povos têm de desligar, de se fechar. Num país latino, penso, haveria montes de cafés e restaurantes abertos, lojas de chineses... Chego à estação e vejo uma tasca (ou aquilo que aqui passa por tal) aberta. Um snack indescritível, com música abominável, sem qualquer espécie de decoração outra do que a simpatia com que sou acolhido.

O senhor é um alemão não se pode mais alemão, pergunta-me se estou com fome - primeiro na sua língua depois em inglês, quando lhe explico que não percebo. Digo-lhe que não: um vinho quente, por favor. Tenho pena de não ter fome, o homem inspira confiança, com o seu casaco de cozinheiro, cabelos brancos e grande barriga. É assim que todos os cozinheiros deviam ser - ou eram, antes de serem chefs e estrelas.

O lugar não tem qualquer espécie de decoração, é feio, mas de tão feio fica bonito. Talvez a estética seja um englobante e fora dela nada exista. Existirá tal coisa como a ausência de estética? Não sei. Para mim, sensível à beleza como sou, a primeira tentação é dizer: 'Sim, existe». Mas olho em redor e vejo que há uma beleza nesta funcionalidade seca; a simpatia do senhor - e da mulher, que deve ser tailandesa - são mais um elemento da decoração, são parte integrante do lugar, como o balcão de vidro e alumínio e as mesas de fórmica.

Se a estética é um englobante, então temos de aceitar que há muitos: a comunicação, por exemplo. O amor? Não, este não.

Penso que é a verdade. Aquele snack é bonito porque é verdadeiro. Ou melhor: honesto. Não pretende ser o que não é. Estética e honestidade são duas irmãs gémeas, simbióticas, siamesas.

Continuo o passeio, reaquecido pelo glühwein e do outro lado da estação há montes de cafés e restaurantes abertos...

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Está frio e o meu equipamento para ele é insuficiente. Lembro-me do norueguês cujo bote fui levar a Copenhaga: «Não existe "está frio." Só existe "Não estou adequadamente vestido."»

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E agora, en route para um poulet à l'antiboise e um gratin dauphinois. Deu-me para a francofilia, hoje (não foi hoje. Foi ontem e em boa hora: não há um supermercado ou uma loja aberta.)

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