7.11.20

Fácil, lamento

Deito-me no tempo como numa espreguiçadeira, no convés de um paquete, à beira da piscina da primeira classe. Olho para as senhoras que se zangam com os maridos porque eles olham para a concorrência. Se estivesse de pé veria bem a esteira, aqueles remoinhos brancos que desinquietam o azul do mar. Mas não estou. Só te vejo a ti, penso no esforço que fiz para deixar de te amar, no frágil e vacilante resultado ao qual cheguei: o mais pequeno fósforo, daqueles de cera, tão dificeis de acender, chegaria para me fazer dar quinhentos passos atrás e voltar à cama onde pela primeira vez nos amámos. Onde foi, lembras-te? Eu não. Sei que foi numa aldeia, ou numa vila do centro da ilha. Foste tu que me levaste lá, de carro. Nessa altura ainda não tinha carta e ainda não te amava como mais tarde viria a amar-te, como mais tarde viria a lutar para não te amar.  A nossa história de amor foi isso: uma luta contra a vida que te retinha na tua vida, contra o amor que me puxava para o amor. Amor contra vida. Quem ganha? Fácil de adivinhar, não é?

Só uma coisa te posso dizer hoje: lamento ter deixado a vida ganhar.

Sem comentários:

Enviar um comentário

Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.