6.5.21

Teresa (cont.)

- Tenho demasiados homens na minha vida - diz-me Teresa, após um breve silêncio pós-coital.
- Desde que sejam "na" tua vida e não "da" parece-me bem - respondo. Sei que sou um dos tais homens, mas com Teresa prefiro jogar à defesa. É  mais fácil um tipo apaixonar-se por ela do que desapaixonar-se.
- Se os reduzisse a um, gostarias de ser tu o único homem da minha vida?
- Como é que está a situação da herança do teu pai? Já tens os papéis todos assinados?
- Se pensas que me enganas com um truque tão básico desengana-te.
- Não sou grande coisa na cama. E que fosse. Deixei de acreditar no poder mágico dos orgasmos mal saí da adolescência.
- Eu também.  Se acreditasse, de resto, não estaria aqui.
- Touché.
- Tocado? Tu? Nem com um canhão conseguiria tocar-te, se quisesse. Não é com zarabatanas como esta que o conseguiria. Se quisesse.
- Ficas para dormir ou vais para tua casa?
- Um dia gostaria de me embebedar contigo. Ir por esses bares como vais, mal eu saio.
- Se saíres.
- Saio sempre.
- Verdade. Porquê? Receias que te oiça os sonhos ou que te veja desgrenhada pela manhã? 
- Vês-me desgrenhada depois de me foderes.
- Verdade. Os despenteios da noite são diferentes dos da manhã, não são?
- São.
- Ficas para dormir?
- Não.
- Então vou sair. Veste-te.
- Vou contigo. 
- Veste-te.

...

- Qual a piada que vês nisto?
- Bebe e cala-te. Se quisesse falar teria ficado em casa.
- A falar com as paredes?
- ...
- Quem é aquele gajo?
- Qual?
- Acabaste de lhe dizer olá.
- Não faço ideia. À noite basta encontrar alguém todos os dias à mesma hora no mesmo sítio para se saber que algo nos une. Não tentar saber o que é esse algo ou esse alguém é uma questão de bom senso. A noite é a casa da ilusão. Se alguém te disser o contrário ou está a mentir ou não sabe do que está a falar.
- Tem pelo menos a vantagem de te tornar locaz.

- Obrigado por teres ficado.
- De nada. Há quanto tempo estamos juntos?
- Estamos juntos?
- Fodemos.
- Não sei.
- Dois anos e três meses.
- ...
- Quantas vezes passámos uma noite juntos?
- ...
- Esta é a terceira.
- Obrigado. Não sou bom em contabilidade.

- Nunca tinha reparado que te encolhias tanto para dormir.
- Não estou a encolher-me. Estou a tornar-me invisível. - Acontece-me isto, por vezes: encolho-me de tal forma antes de dormir que os joelhos me entram pelo ventre. Cruzo os braços no peito, ponho as mãos nos ombros - trocadas - baixo o pescoço como um cavalo de dressage e fico como um grão de areia.
- Não te vejo, de qualquer forma, quando estou a dormir.
- Eu vejo-me.
- Fala-me das tuas conquistas.
- Não tenho conquistas. Não sei seduzir ninguém. Só ser seduzido.
- E mesmo para isso tens de treinar um bocadinho. Boa noite. Dorme bem.

- Obrigado. Tu também. 

- ...

- ...

- Dormes?

- Não. 

- Posso perguntar-te uma coisa?

- Podes.

- Não sei se reparaste, mas esta noite foi a primeira vez que saímos juntos depois de fazermos amor. Normalmente encontramo-nos antes. Jantamos, vamos beber um copo, ou vamos ao teatro ou ao cinema, vimos para casa - ou a tua ou a minha - fodemos e o "hóspede", por assim dizer,  vai-se embora.

- ...

- Hoje vi-te sob um ângulo novo. Como se me tivesses aberto a porta de uma divisão da tua casa que eu não sabia sequer que existia.

- ...

- O que me impressionou foi a intensidade com que tu passaste estas horas. Estavas comigo, foste delicado, atencioso e bem-educado - como és sempre, de resto - mas na verdade era como se estivesses sozinho. 

- Cheguei atrasado à vida. Como todos os atrasados tenho de recuperar o tempo que não estive na festa.

- Quanto tempo chegaste atrasado?

- Não sei. Talvez dois séculos, talvez três. Ou quatro. Não sei.

- Tenho vontade de ti. Agora.

- Não posso apaixonar-me por ti. 

- E eu, posso  apaixonar-me por ti?

- Se quiseres. Mas não vejo o que tenho de amável. 

- Esse é problema meu, não é teu. 

-...

- De quem é esta foda - tua, minha ou dos dois?

- Escolhe tu.

- Então é minha. Só minha. Quero-te em mim, para mim, como se a tua pila tivesse migrado. Como se fosses parte de mim. Como se fosses uma máquina, um robô, um boneco. Não quero pensar em ti. Não quero pensar em nada senão nesse caralho que sinto a crescer, que vou pôr na boca e chupar, entre as mamas, que vou esfregar devagarinho à entrada da cona, que vou pôr em mim como se fosse de papel, que se vai vir em mim como se me quisesse expulsar dele; quero acordar amanhã a pensar na sorte que tenho em não te amar. Porque se te amasse, ser-me-ia impossível desamar-te.  Fode-me, por favor.

.........

- Devíamos fazer isto mais vezes, não achas?
- O que é «isto»?
- Tudo. Tudo o que nos trouxe aqui.
- ...
- Tenho demasiados homens na minha vida.

(Cont.)


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Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.