7.10.22

Diário de Bordos - Porto, 07-10-2022

O Porto transformou-se numa daquelas senhoras de meia-idade que mantiveram a beleza da juventude e a ela juntaram o charme da sabedoria. É um prazer para os olhos e para a imaginação.

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No Porto encontrei os blocos Clairefontaine que já não vejo em mais lado nenhum, canetas e tintas Kaweco, postais giros, o café Império (o decente, da rua Santa Catarina, não o outro, self-service), um restaurante indiano francamente bom - chama-se Real Indiana, se por acaso - amigos recentes e de há muito e todos bons (não há como evitar a repeticção de «bom», no Porto? Não). Tudo isto com os abomináveis ardores no olho esquerdo, que afogo em anestésico a rodos ao primeiro segundo. Para herói e ou estóico já dei. Já comprei mais um frasco, preventivamente, não vá a coisa prolongar-se. Feliz - ou talvez sabiamente - a assistente do médico preveniu-me de que  os ardores de agora seriam piores do que os da última vez, que já não foram tristes. Aqui entre nós, penso que ela disse aquilo só para me preparar, mas pouco importa. Desta vez arrefinfo-lhe com Anestocil sem esperar.

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Porto, mercado do Bolhão, manhã de uma sexta-feira de Outubro. As pessoas preferem turistas a imigrantes. Bem vistas as coisas, os dois são necessários. Mas quando vejo as bichas para a Lello e para o Majestic, quando os vejo a «provar» vinho do Porto aqui no mercado confirmo o que já há muito decidi: a ter de escolher, opto pelos imigrantes. 

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Leio mais um relatório de mais um ataque de orcas. Isto só lá vai a tiro, os animalistas (ou animais, para quem preferir) que digam o que quiserem. Isto dito, pergunto-me: por que esperam os conspiracionistas para dizer que estes ataques são obra dos estaleiros navais coligados?

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Porto cultural

De manhã, uma excelente exposição de fotografia documental na Casa Comum. Fotografias complexas, ambivalentes, simultaneamente próximas e distantes, poderosas de todos os pontos de vista, incluindo o estético. 

À tarde, outra magnífica exposição de fotografia na galeria Pedro Oliveira. A fotógrafa chama-se Rita Magalhães e a exposição consiste em esbater a fronteira entre a pintura paisagista impressionista e a fotografia. Vale pela escolha das paisagens, pela réussite técnica e pela capacidade emotiva das imagens.

À noute, apresentação de um livro chamado Cinco homens que mudaram Portugal para sempre, de Isabel Nery,  no clube de Leça. Ao princípio temi uma seca das piores mas a intervenção da autora convenceu-me a comprar o livro. Sobre o clube e a assistência nada disse. Contas feitas, a seca não foi das piores - está no meio da escala - o livro parece valer os vinte paus que custou e voltei para casa de autocarro, muito melhor do que o táxi. 

O almoço foi com o meu editor do Porto (o gozo profundo que me dão estas duas palavras juntas, "meu editor" é tão legítimo como indescritível) e só ele mereceu a vinda ao Porto. O meu sonho de concurso pode muito bem deixar de ser um sonho, desta vez. Se desta vez isto se concretizar o gozo de "meu editor" vai passar a ser um simples soluço no sismógrafo do gozo,  também conhecido por orgulhómetro.

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