21.9.23

Diário de Bordos - Palma, Mallorca, Baleares, Espanha, 20-09-2023

Regresso a Palma, ao meu labirinto, após mais de um mês de ausência. Não se deve escrever sobre o vulcão durante a erupção nem sobre tsunami quando a vaga rebenta na praia. Vá lá: chamar tsunami ou erupção a esta catadupa de emoções é claramente um exagero. É uma cascata, digamos assim. Ou melhor: um remoinho. Uma das cruzes está resolvida, falta outra mais uma dezena de pequenos crucifixos, de tamanho variável. Juntando estes aos da carcaça não se pode dizer que o quadro seja muito animador. Mas olhando para trás, para as paredes do labirinto, tão pouco se pode desanimar. Isto vai passo a passo, esquina a esquina, beco sem saída a beco com saida. Depende apenas da quantidade de curvas a dar e paredes a abater.

O traveller está resolvido, a casa de banho e o esgoto do poço da roda de leme também, amanhã falo com o engenheiro por causa do registo... Não sei se labirinto é a melhor analogia. Às vezes sinto-me num carrocel.

É preciso força para provar que este sentimento está errado e que a analogia está correcta.

ADENDA 

Força - e luz do dia. É preciso acrescentar «quase» a quase tudo. Juro que quando o carrocel parar deixo de utilizar a palavra «quase» para sempre (sem aspas ficaria «deixo de utilizar a palavra quase para sempre», o que seria manifestamente impossível).

........
P., BP., carcaça: devia acrescentar um vértice, prefiro quadrados a triângulos (e na volta estaria mais perto da verdade, vá lá saber-se). Ou cubos a pirâmides, qu'isto 'tá tudo ligado, óviste ó manguelas? Andas práqui com palavras de dois e quinhentos o quilo. Vai mazé vergar a mola, pá.

........
«Labirinto» e «nómada» são duas palavras facilmente conciliáveis, não são? São.

........

Exmos. senhores, 

Por uma razão obscura alguém me deu um número de telefone do «Gabinete do Utente». Na verdade foram dois, mas isso é irrelevante: poderiam ter sido trinta que o efeito seria o mesmo. Telefonar para um organismo português (seja ele público ou - menos - privado) é como telefonar para um buraco negro. As chamadas entram mas não saem. Os portugueses preferem as amálgamas e os ajuntamentos de pessoas que se vêem nas salas de espera dos hospitais a cinco minutos ao telefone. É uma opção e há que respeitá-la. Resta saber se respondem aos e-mails. 

No dia 14 de Setembro deste ano (é importante precisar o ano) um médico do Centro de Saúde de Cascais dirigiu ao hospital Egas Moniz um «Processo P1 completo» (aspas porque cito) a respeito de uma operação que devo fazer. Sei que quem decide a urgência da dita operação são os «triadores» (ditto). «Triadores» esses que nunca sequer falaram comigo ou viram o que se passa. Decidem a urgência baseados em intuições, suponho. Ou ausência de amigos com coisas mais importantes. Ou em função da posição da Lua no céu. Seja qual for o critério que os «triadores» usam - pode até admitir-se que sejam critérios objectivos, «científicos» (aspas porque ironizo) - penso que um bocadinho de transparência não faria mal a ninguém. Sobretudo para que pessoas como eu, que não têm amigos bem colocados e que devido ao seu trabalho viajam muito possam planear, por tenuemente que seja, a sua vida no futuro próximo. 

Este e-mail é um apelo nesse sentido: quanto tempo terei de esperar? Um ano? Dois? Um mês? Terei de passar esta magnífica oportunidade ao meu neto, que faz agora um ano e meio de idade? Qualquer informação seria bem vinda. A simples ideia de que o SNS não pensa que eu sou uma cabeça de gado - ou não me trata como tal, mesmo não o pensando - seria recebida com gratidão e alegria (por esta ordem). 

Cumprimentos,

Luís Serpa


(Descobri agora que tenho outro «processo» pendente há um ano. Já me tinha esquecido dele. Gostaria muito que o último fosse o primeiro e não fosse para a fila...)

Sem comentários:

Enviar um comentário

Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.