1.2.24

Diário de Bordos - Fort-de-France, Martinique, DOM-TOM França, 01-02-2024

As viagens nunca acabam, mas começam. Esse começo é muitas vezes imperceptível, parece não estar ligado à viagem. Frequentemente, não se consegue sequer discernir aonde está. O da viagem que estou a preparar, por exemplo, quando começou? No dia em que confirmei ao A. G. que sim, podia vir com ele? No dia em que o projecto do Mediterrâneo foi cancelado, abrindo assim a porta (a cancela?) para a viagem aos EUA? Na prévia tentativa, quando o transporte da Suécia se interpôs? Não sei. O mais fácil seria dizer «A viagem ainda não começou». Porém, isso não seria verdade. A minha cabeça já está no primeiro encontro com o A., no desembarque do avião, na chegada a S. Francisco, de que gostei tão pouco as duas primairas vezes que lá estive.

«Gostei tão pouco» não é inteiramente verdade. Digamos antes que a cidade não me entusiasmou tanto quanto a perspectiva desta viagem me entusiasma os dias, situação essa que espero se altere, desta vez.

Vai ser uma viagem cheia de novidades. Não tantas, contudo, quantas as que de repente me pareceu. Já fui turista bastantes vezes: basta contar quando deixava o trabalho na Suíça e ia para a Itália - uma vez fui até à jugoslávia, ainda se cahamava assim - gastar o dinheiro que ganhara a limpar a neve dos telhados, mochileiro avant la lettre, a dormir em tudo quanto era sítio, desde conventos de freiras até estações de caminho-de-ferro, passando por barcos squattés, cabines de camiões, eu sei lá. Que era então, se não um turista? E quado fui de Parnaíba para Cayenne por terra? Na Venezuela íamos muitas vezes visitar os F. à sua finca, uma coisinha pequena demais - só tinha três mil e quinhentos hectares e era difícil rentabilizar aquilo, dizia o P., p de nome e de pater familias. Turismo. Talvez já nessa altura fosse o nómada em que me tornaria mais tarde, mas o que fazia era turismo.

E também já andei por terra adentro, não como turista, é certo, numa viagem memorável que fiz por Moçambique com uma equipa de televisão inglesa. Negra, ¿endonde estás? Conheço bem a França - sobretudo o norte, se bem com a memória que me resta daquilo me pergunte se «conhecer» é o verbo adequado.

Enfim, pouco importa. A viagem que aí vem é sempre a melhor de todas e até lá ainda tenho um bom par de milhas para navegar. 

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Tenho o P. registado. Agora falta a inspecção para o registo comercial. Para quem não está a par destas coisas: é como se tivesse conseguido convencer uma miúda a vir jantar comigo. Só falta o resto.

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Amanhã vem o mergulhador dar uma raspadela ao casco do S. D. Vamos ver como ficou com um mês de imobilização e a partir daí pode aferir-se uma regularidade. Não há marinheiro que durma bem num casco sujo, mesmo que esteja parado. 

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Mudei para os Z'Abricots há pouco menos de três semanas. Ainda não conheço Fort-de-France, coma excepção do mercado e do Impératrice. Hoje, porém, foi um dia memorável: encontrei um senhor que vende cigarros à unidade. É um passo importante num conhecimento de uma cidade. Comprei três cigarros, a minha dose habitual quando fumo muito.

Ah, e sei aonde é o shipchandler. É o equivalente para um hipocondríaco de saber aonde fica a farmácia mais próxima.

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