30.8.24

Diário de Bordos - Giardini Naxos, Sicília, Itália, 30/08/2024

[O que se segue foi escrito antes de me ter apercebido de que me esqueci das injecções a bordo. A raiva e o desespero que se seguiram - e ainda não se dissiparam - são enormes.]

A decisão é difícil mas tem de ser: volto a pé para o hotel. São vinte minutos a andar mas em troca como uma sobremesa. Esta história dos vinte euros que perdi devido à habitual mistura de negligência e distracção enfurece-me apesar de saber que a reacção é desproporcionada - o dinheiro veio da massa que o D. me deu para o jantar e para os transportes até Palermo (outra asneira, mas esta não particularmente grave. Só chata). Era um extra, por assim dizer. Porém a verdade é que ando hiper-sensível. A massa que sobra chega perfeitamente para tudo [chegava, agora vai ser bastante insuficiente] mas o meu amor por mim, que nunca foi grande coisa, está cada vez mais estralhaçado.

O restaurante Al Fangio, aonde vim jantar, é bom e não excessivamente caro. Foi-me recomendado pelo chauffeur de táxi que me trouxe do porto para o hotel. É frequentado por italianos e estranho esta ausência de línguas exógenas. Penso na sobremesa, no táxi, nos vinte euros, ponho tudo dentro de copo de jogar aos dados, deito para a mesa e sai sobremesa.  Gelado de limão, delicioso, que acompanhei devidamente por alguns limoncello, o melhor que já bebi, só equiparável ao da mulher do Hugo, em Palma. A verdade é que me queixo frequentemente de um dos inconvenientes deste meu trabalho ser andar pouco. Tenho aqui uma boa oportunidade de compensar essa falta. (Na verdade, duas porque também fui a pé para o restaurante.)

A viagem correu bem, sem incidentes. Uma Ferretti 720 novinha em folha, tripulação porreira, bom tempo, uma costa bonita quando estava à vista. Bebo os limoncello e penso «poderia passar o resto da minha vida a fazer isto» sem na realidade me aperceber a que me refiro: à bebida ou a esta vida?

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Isto até ter descoberto que deixei as injecções a bordo. Fico demasiado furioso para sequer conseguir dormir. Como é que é possível? Porque não fiz uma nota no telefone (ultimamente tem funcionado)? E agora? Agora é a) Chatear o D., que já tem os proprietários a bordo e tem muito com que se ocupar; b) Mudar os planos de transporte para Palermo (ou seja, pagar muito mais caro porque muito provavelmente terei de ir de táxi até Catania; c) Esperar que o D. não se tenha ido embora, ontem o barco rolava imenso no fundeadouro e a maioria dos proprietários não gosta (não compram barcos. Compram casas que flutuam).

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Vou atravessar a metade norte da Sicília de autocarro. Ao menos isso. Penso na Goliarda Sapienza, no Patton, no Princípe, no C. M. F., que escreveu algumas páginas lindas sobre Palermo. A ver - agora sim, literalmente. (Não percebo de onde saiu a mania de usar este termo a torto e a direito, mas agora é legítimo: a ver).

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O D. já não está no porto. Vou para a viagem sem o maldito dulaglutido. Merda!!! para esta cabeça de merda.

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(Catania)

O bar aonde espero pelo autocarro chama-se Sapienza, o que não posso deixar de interpretar como sendo um bom augúrio. Tudo o que tenha uma relação, por ténue que seja, com aquela génia só pode ser bom.

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Discrepâncias 

Giardini Naxos - Catania
Táxi: 130 euros;
Autocarro: 4,50 euros;

Catania - Palermo
Táxi: 500 - 600 euros;
Autocarro: 14 euros.

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Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.