24.6.25

Diário de Bordos - Sa Calobra, Mallorca, Baleares, Espanha, 24-06-2025

À primeira vista pensa-se que a Tramunttana é masculina, uma versão adocicada - mas igualmente bonita - dos Alpes. Mas quanto mais se a frequenta mais perceptível é a sua natureza profundamente feminina. Por vezes esconde-se, tal menina púdica, por baixo de uma neblina que lhe esconde as formas, as transforma em promessas, nada mais do que promessas. Outras vezes faz-nos pensar naquelas mulheres entre os trinta e os quarentas, pujantes, bonitas, boas, que o sabem e nos espicaçam o desejo cada vez que olhamos para elas - isto é, cerca de cem vezes por dia.

Hoje tive direito às duas. Estes clientes gostam da minha prática de largar muito cedo e quando acordam estão num sítio diferente daquele aonde estavam de véspera. Levantei ferro de Santelmo às sete da manhã e vim por aí fora, como gosto: sozinho, a olhar para a costa, a pensar numa série de coisas - a lista seria demasiado longa e desinteressante para a escarrapachar aqui mas mantém-me ocupado o tempo todo do trajecto. Hoje, como quase sempre, cerca de três horas. Pouco tempo depois a maldita música começa. É uma família peruana do uppercrust e eu não percebo como podem a) ouvir aquilo, b) àquele volume (já lhes pedi duas vezes para a porem mais baixo e ultimamente têm aceitado a sugestão) e c) o tempo todo. É que é todo. Não saem de bordo senão para nadar ou dar uma volta no dinghy e como são muitos - sete ao todo - entretêm-se a si próprios.

Tenho pelo menos a sorte de serem simpáticos e bem-educados, ao menos isso.

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Escapo vindo a terra e todas as noites lhes agradeço não serem de noitadas. Ficam acordados até às tantas mas a bordo, a jogar uma porcaria qualquer que não sei o que é, eu vou deitar-me e o dia esvai-se tranquilamente. Amanhã vai ser assim também: levanto ferro de Sa Calobra, paro para almoçar em Ses Higueras, dormimos em Andratx. Basta não pensar na música.

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