11.3.14

Diário de Bordos - Bocas Town, Bocas del Toro, Panamá, 11-03-2014

Os dentes estão arrumados; agora tenho de tratar do resto.

As pessoas que trabalham em terra num emprego fixo, estável, num ambiente conhecido não podem fazer ideia da quantidade de contigências incontroláveis às quais estamos sujeitos, nós pobres marinheiros solitários e longe de casa.

Encontrei uma bomba no Panamá, no Centro Marino, o meu shipchandler de sempre. Falei com Alexis, o melhor chauffeur de táxi do mundo e arredores; falei com Berta, a senhora que me atendia no Centro Marino; voltei a falar com Alexis e com Berta e assim por diante. Ficou combinado que eu enviava dinheiro ao Alexis por Western Union, ele iria ao Centro Marino buscar a bomba e a levava ao aeroporto.

Parece uma coisa simples, e é.

Mas ontem a Western Union não podia enviar dinheiro porque tinha ultrapassado o seu - dela, agência da Western Union em Bocas - limite. Uso a WU há muitos anos e não sabia que as agências têm um limite para os fundos que podem enviar.

Enfim, entretanto a Berta lembrou-se que contra um pagamento módico o Centro Marino podia tratar do envio da bomba para Bocas. Mais e melhor: eu podia depositar o dinheiro directamente na conta deles, evitando assim o custo do Alexis e o da Western Union.

Resumindo: duzentos e cinquenta telefones depois enviei o dinheiro ao Alexis por WU e o Centro Marino trata do envio.

Em Bocas só há um banco, e não é o do Centro Marino. Agora espero na cidade que o Alexis me confirme que recebeu a massa e pagou a bomba: tenho de ir para bordo arrumar coisas, mudar o óleo do motor, etc.

Não controlamos nem um décimo do nosso ambiente de trabalho; nem um por cento. Nada, praticamente nada. Talvez seja por isso que um marinheiro é um ser fundamentalmente pragmático, que sabe que as coisas são o que são; e que apesar disso tem de mudá-las. Se o vento está de Norte e eu quero ir para Norte tenho a) de aceitar que não posso mudar a direcção do vento e b) de inventar a bolina.

Se tudo correr bem amanhã tenho a bomba em Bocas. Se eu trabalhasse em terra num ambiente controlado apostaria que a bomba não vai chegar amanhã. Mas sou marinheiro: tenho de acreditar que vai chegar.

A alternativa seria ir trabalhar para terra. E isso é pior do que mil imprevistos.

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