20.4.19

Quando?

À sua volta, o mundo refazia-se diariamente. Porém, ao fim de tantos anos ele aprendera a ver o sentido das mudanças, antes imperceptível. No fundo, um funil é apenas a forma portátil de um turbilhão, de um remoínho. Aprender a ler quando se transvasa um líquido qualquer para um recipiente mais pequeno, com a ajuda desse precioso instrumento; sobreviver quando no estreito de Messina um gigantesco remoínho nos agarra a embarcação pela quilha e dela faz um pião; usar da vida os turbilhões como as crianças um escorrega no parque infantil - formas diferentes dessa coisa una, indivisa que se chama vida? Ou formas fundamentalmente semelhantes de uma vida múltipla? Pouco importa. Tudo toma forma, pouco a pouco.

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A verdadeira questão não é a vida. É a morte, é saber quando passamos para o lado de lá da linha: ainda estaremos a usar os anos de vida, ou já estamos do outro lado, a consumir os que a morte tão generosamente nos emprestou? Onde situar essa linha? Os árabes diziam: "plantar uma árvore, escrever um livro, fazer um filho". Sabe a pouco, ou temos a mania das grandezas e não nos apercebemos de que tudo o mais é fútil, é vinho num funil, seio bonito que o desejo nos faz esquecer quantas vezes acariciámos, lábios já tão beijados... Para que queremos mais?

Começamos do lado da vida; um dia passamos para o da morte. Não perguntes porquê ou como. Pergunta quando.

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Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.