5.2.08

Estacionamento

Há vários pontos interessantes nesta série de posts (Pilaretes e Estacionamento) e respectivos comentários:

a) A "civilidade" dos estrangeiros quando comparada à dos portugueses: a mera existência de pilaretes nos exemplos apresentados deveria chegar para demonstrar que os "estrangeiros" não são mais civilizados do que os portugueses - se fossem, não precisaria de pilaretes. O que os distingue é que em vez de se lamentar sobre a civilidade ou educação das pessoas tomam medidas baseadas naquilo que elas (pessoas) são, e não naquilo que deveriam ser;

b) As reticências da CML têm, penso, duas razões de ser: uma é política - a verdade irrefutável é que não há parques de estacionamento em número suficiente, e começar a restringir agora o estacionamento sem dar alternativas provocaria decerto uma mais do que justificada revolta. A outra é económica: nesse paradigma da civilização que é Genebra, onde se andam a aplicar políticas de restrição à circulação automóvel há mais de 20 anos (e onde essas políticas são eficazes e as punições severas), houve há pouco mais de meia-dúzia de anos um debate na Câmara Municipal sobre o aumento das multas de estacionamento. O partido no poder (extrema-esquerda) propunha um aumento de 200% - de 20 para 60 francos a multa-base, digamos. Nenhum partido constestou a necessidade de aumentar o valor - mas alguns questionaram um aumento tão grande, argumentando que teria um efeito dissuasivo enorme e diminuiria radicalmente as receitas que as multas proporcionavam (o aumento foi de 200% e as receitas aumentaram, o que demonstra que a extrema-esquerda às vezes é capaz de decisões válidas de um ponto de vista económico. Infelizmente é muito raro).

Não tenho automóvel e nada me irrita mais do que o estacionamento selvagem em Lisboa. Mas seria talvez útil começar por construir a casa pelas fundações: criar parques de estacionamento para locais, dificultar a entrada de automóveis do exterior, melhorar a rede de transportes públicos de superfície, e só depois agir sobre o estacionamento - por muito que nos custe ver como é Lisboa, e como poderia ser.

PS - até se poderia aplicar o dinheiro das multas de estacionamento para este objectivo. Não seria decerto suficiente, mas pelo menos daria uma boa razão para as pessoas estacionarem mal...

PS2 - esta história da falta de civilidade irrita-me sempre um bocadinho, mesmo que por vezes ceda, anche io, à tentação. E nesses momentos lembro-me sempre de uma história que se passou comigo há muitos anos, em Cascais: ia no carro de um amigo e um peão tentou atravessar numa passadeira à nossa frente. O condutor não só não parou, mas ainda gritou para o senhor "Pensas que estás no estrangeiro?". Naquela altura, dizia-se que os portugueses eram irremediavelmente selvagens e nunca aprenderiam a dar a prioridade aos peões. Hoje, os carros em Lisboa param nas passadeiras mais do que em qualquer grande cidade europeia, com a possível excepção de Londres.

O que mudou? Um chauffeur de táxi disse-me um dia que foi uma "medonha" (ou "pavorosa", já não me lembro) campanha de repressão. Não sei se é verdade ou não, mas vinte e tal anos de vida na Europa "civilizada" levam-me a crer que sim.

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Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.