16.7.20

Diário de Bordos - em voo, Palma - Madrid, 16-07-2020

O avião sai atrasado. Pouco, mas sempre é menos tempo que tenho de ficar em Madrid. Desde quatro de Março que não entrava num avião e juro que nunca mais me vou queixar de aviões, aeroportos e arrelias associadas. Quatro horríveis, penosos meses e meio.

A ideia de que o homem é um animal racional apanhou um abanão muito forte com esta crise. Prefiro a alternativa de já não sei quem: o homem é um animal irracional que por vezes é capaz de pensar. Cada vez menos, me parece. A passageira que reclama comigo porque tenho a máscara no queixo é jovem, atlética, viaja com duas crianças muito novas. Mas sente-se no direito de me obrigar a pôr o raio da máscara porque simplesmente não pensa, não usa a razão. É um animal irracional que provavelmente no seu trabalho é competente e reconhecida, quem sabe? Aqui, prefere deixar a razão de lado.

Espero que este pesadelo acabe o mais depressa possível. É horrível ver esta ferida assim exposta. A irracionalidade erigida em gestora do quotidiano. 

A minha máscara tem quatro meses e está a desfazer-se. Ainda é mais incómoda, com este felpo todo a querer entrar pelo nariz cada vez que respiro. Os bebés da senhora choram o tempo todo. Apetece-me mndar-lhe olhares assassinos, apesar de normalmente o choro das crianças não me incomodar. Resisto: não vou eu também ceder a impulsos animais. Já deve estar stressada que chegue. Daqui a pouco chegamos a Madrid e ponho-me num restaurante em Barajas até serem horas de voltar para o aeroporto. 

Na verdade, o único sítio onde provavelmente estarei protegido desta histeria é Mértola. Ou Genebra. Ou no mar, que é onde gostava de estar. 

Sacana do piloto recuperou o atraso.

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