24.5.23

Forma, formosura

"Talvez no fundo seja uma simples questão de aerodinâmica", pensou. Não tenho a forma que a vida requer. "O que não deixa de ser bizarro, repara." Inspirava fundo e prosseguia: "Quem é que olhando para uma baleia vê naquilo formas hidrodinâmicas?" Pausa dramática. Um tempo. "E a verdade é que as tem." Um tempo. "Forma e formosura são coisas diferentes." Olhar a pedir aplausos que não chegavam. Os ouvintes distraíam-se a pensar nas diferenças entre forma e formosura, entre um Jaguer E-type e um cachalote e esqueciam-se de aplaudir.

Jeanne não desanimava. Nada a faria desistir, "nem uma sólida parede de provas em contrário". Andava permanentemente naquela estreita linha que separa a estupidez da teimosia, sem se lembrar de que é preciso pouco para que uma e outra se confundam. Muito pouco: o lento escorregar da estupidez pela rampa da teimosia é suficiente para as tornar indiscerníveis. No caso de Jeanne a rampa da estupidez era larguíssima e nada no universo escapava de lá um dia ir parar. Muito menos a teimosia, que parecia ali ter residência. 


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