15.8.24

Diário de Bordos - Palma, Mallorca, Baleares, Espanha, 15-08-2024

Chegada a Palma, chegada a casa. A primeira coisa que noto é a temperatura: vinte e três graus, segundo o comandante do avião (e eu acredito). É a fronteira do frio, para mim. Menos do que isso vence mangas compridas e calças. Felizmente amanhã sobem de novo e voltam aos trinta, aonde deveriam andar sempre e em todo o lado, se Deus existisse. (Isto não é inteiramente verdade mas não estou a fazer uma prelecção sobre a metafísica das temperaturas atmosféricas). Depois houve o episódio dos táxis vs. autocarros. Há muito tempo que não vejo uma fila para os táxis tão longa. A do autocarro - não é propriamente uma bicha, é um magote - idem. Volto para os táxis - na verdade aquilo avança bastante depressa - e lá vim, confortável como a idade exige (e ao arrepio do status social, mas isso é outra história).

O P. estava bem. Na verdade aqui em Palma houve pouco mais de trinta nós, força que ele já suportou galhardamente, e mesmo essa durante muito pouco tempo. 

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Jantar no Bar Coto, a solução de facilidade. Têm um caril tailandês que costumava ser bom. Desta vez não foi. Perguntei se mudaram de cozinheiro e a miúda disse-me que não. Deve ser partida da memória, respondo-lhe. Mas tem a vantagem de ser perto, barato e geralmente bom, três qualidades apreciáveis. Além de que com esta quantidade de gente esperar que uma cantina do tipo do Coto prepara comida com o nível habitual é sonhar com ladrões ou com génios dentro de lâmpadas.

Venho para bordo, troco a garrafa de vermute pela de rum, começo com a Anette Peacock e logo passo para o Keith Jarrett - Köln, claro - e deixo-me embalar pelo cansaço, pela memória da D. que tanto gostava deste disco, pelos ruídos do pontão, pelo balançar do P. Isto é: deslizo gentil e suavemente para o meu estado habitual de felicidade melancólica ou melancolia feliz. O feeder do enrolador caiu à água e vai ser praticamente impossível recuperá-lo - o mergulhador já tentou, mas agora tenho de lhe dizer para insistir e com estas vagas ele vai dizer-me que não vale a pena e eu sei que ele tem razão e isto revolta-me de uma revolta profunda, violenta, tectónica, tsunâmica. Vai ser preciso esperar por Setembro para ver se encontramos um igual, mas o modelo é antiquérrimo e... Bebe mais um rum, Luís, bebe um rum e ouve a música e esquece o feeder e lembra-te de que o P. não sofreu com este tempo e que um dia tudo estará no seu lugar e de vez em quando a M. tem ataques de razão, é só uma questão de apanhar a Lua no sítio certo.

Dá-lhe, Keith. Dá-lhe. Esmurra-me esse piano e bufa-lhe para cima que não há melancolia que resista ou felicidade que se deixe vencer.

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