30.7.08
Sonhos
Um sonho só o é se for partilhado; se não, pouco mais é do que uma obsessão, na melhor das hipóteses; ou uma mania, na pior.
22.7.08
20.7.08
Lisboa
A CML fecha a Praça das Flores 3 semanas por 150,000 euros, e não só "dá" a Casa dos Bicos por 10 anos como ainda paga as obras?
Será que ficámos sem acesso à mais bonita praça de Lisboa para que o senhor José Saramago... Não, claro que não. Mas há aqui qualquer coisa que me está a escapar.
Será que ficámos sem acesso à mais bonita praça de Lisboa para que o senhor José Saramago... Não, claro que não. Mas há aqui qualquer coisa que me está a escapar.
Publicidade subliminal
Saio hoje de Marselha, feliz como um Papa casado, e cansado. Marselha é uma cidade que não se dá a ver, "uma strip-teaser púdica, uma exibicionista tímida, uma puta virtuosa".
Amanhã Lisboa e terça Algeciras. Dia 28 há uma tenda nas Docas, que por lá ficará até dia 16 de Agosto, com bebidas, música marinheiros giros (e marinheiras lindas).
Amanhã Lisboa e terça Algeciras. Dia 28 há uma tenda nas Docas, que por lá ficará até dia 16 de Agosto, com bebidas, música marinheiros giros (e marinheiras lindas).
14.7.08
9.7.08
Um gajo / Restaurantes Lx
Um gajo apanha o táxi para ir jantar e suspeita que tudo está excessivamente mal, ou excessivamente bem, quando à entrada do bairro onde o restaurante fica o chauffeur diz "não gosto deste bairro por razões técnico-estratégicas"; um gajo pensa, claro, que não sabe o que são razões "técnico-estratégicas" mas o chauffeur liga o GPS e leva-o à porta do restaurante sem um ai.
É aí que um gajo pede ao chauffeur de táxi o cartão, porque ele foi porreiro e tudo e etc. e tal e o senhor responde "hoje é o meu último dia de trabalho"; e aí um gajo começa a pensar "será o restaurante bom? Foi-me indicado pelo namorado super-simpático de uma gaja super-bonita (o que só demonstra que Deus não joga aos dados com tudo no Universo) mas será que um gajo vai comer bem aqui"?
A resposta é sim, um gajo vai comer mais do que bem ali; e vai ficar surpreendido no caminho para casa porque passa por uma série de prédios devolutos e a cair de podres e por muito poucas gajas boas e pensa "em Paris seria ao contrário (um monte de gajas boas e poucos prédios devolutos) mas apesar de tudo Lisboa é melhor sob certos aspectos que Paris". O aspecto Tágico, por exemplo: o Tejo em Lisboa é de longe mais bonito e navegável do que o Sena em Paris; ou o aspecto Síntrico: Lisboa está muito mais perto de Sintra do que Paris de qualquer lugar que se veja, incluindo Versailles. Há, claro, este pequeno problema, pensa um gajo, dos prédios devolutos e dos cús bonitos, proporções inversas em Lisboa e Paris, mas que se f..., um gajo pensa que cús (e Sintras) bem podem ficar para depois, enquanto os prédios caírem e Lisboa for tão insuportavelmente bonita, e os cús das lisboetas tão insuportavelmente redondos, altos e firmes e tudo, ao contrário dos prédios devolutos de Lisboa (a diferença entre "vagabundas" e "bundas vagas" sendo, pensa um gajo, a melhor plataforma para discussões sobre semântica, sintaxe e Lisboa).
Um gajo vem a pé para casa porque em Lisboa se pode vir a pé para casa (em Paris também, mas anda-se duas vidas, ou três) e pensa "o simples facto de poder pensar que penso e ando e estou em segurança é uma sorte, e uma falácia; há muito não penso, e muito menos penso que penso e a segurança é ilusória" e aí pensa um gajo que todas as miúdas do restaurante (e mesmo as senhoras) eram giras, o que até nem é frequente num restaurante e todas (até as senhoras) podiam ser namoradas, ou mulheres, que não ficariam nada mal na moldura para fotografias que um gajo comprou há tantos anos e continua vazia.
Um dia um gajo "ouviu" uma senhora dizer "a minha tasca favorita em Lisboa é o Pap'Açorda" (ouviu entre aspas porque não ouviu, na realidade, leu), e pensou "se o Pap'Açorda é uma tasca eu sou a mulher do Papa" e hoje lembrou-se desta história porque esta tasca pode realmente ser a favorita de quem quer que seja desde que quem quer que seja não seja muito pedante, muito;
Porque o Stop do Bairro é quase uma tasca, quase, e come-se duas vezes melhor do que se esperava e paga-se duas vezes menos do que se pensava (o que demonstra que se pensava mal, e que os preços do Stop do Bairro são correctos) e demonstra também que as tascas sabem evoluir (não é sequer objecto de debate, que se f... as tascas e a respectiva evolução). E aí um gajo pensa que se pensasse seria, diz outro gajo, mais fácil, mais fácil, mais rico, ou pelo menos menos pobre.
"Nunca serei rico", pensa um gajo, "enquanto prestar atenção ao cú das senhoras; os cús não enriquecem quem por eles tanto trabalha".
Restaurante Stop do Bairro, rua Tenente Ferreira Durão, 55-A (Campo de Ourique). Fecha às segundas. Não fazem reservas.
É aí que um gajo pede ao chauffeur de táxi o cartão, porque ele foi porreiro e tudo e etc. e tal e o senhor responde "hoje é o meu último dia de trabalho"; e aí um gajo começa a pensar "será o restaurante bom? Foi-me indicado pelo namorado super-simpático de uma gaja super-bonita (o que só demonstra que Deus não joga aos dados com tudo no Universo) mas será que um gajo vai comer bem aqui"?
A resposta é sim, um gajo vai comer mais do que bem ali; e vai ficar surpreendido no caminho para casa porque passa por uma série de prédios devolutos e a cair de podres e por muito poucas gajas boas e pensa "em Paris seria ao contrário (um monte de gajas boas e poucos prédios devolutos) mas apesar de tudo Lisboa é melhor sob certos aspectos que Paris". O aspecto Tágico, por exemplo: o Tejo em Lisboa é de longe mais bonito e navegável do que o Sena em Paris; ou o aspecto Síntrico: Lisboa está muito mais perto de Sintra do que Paris de qualquer lugar que se veja, incluindo Versailles. Há, claro, este pequeno problema, pensa um gajo, dos prédios devolutos e dos cús bonitos, proporções inversas em Lisboa e Paris, mas que se f..., um gajo pensa que cús (e Sintras) bem podem ficar para depois, enquanto os prédios caírem e Lisboa for tão insuportavelmente bonita, e os cús das lisboetas tão insuportavelmente redondos, altos e firmes e tudo, ao contrário dos prédios devolutos de Lisboa (a diferença entre "vagabundas" e "bundas vagas" sendo, pensa um gajo, a melhor plataforma para discussões sobre semântica, sintaxe e Lisboa).
Um gajo vem a pé para casa porque em Lisboa se pode vir a pé para casa (em Paris também, mas anda-se duas vidas, ou três) e pensa "o simples facto de poder pensar que penso e ando e estou em segurança é uma sorte, e uma falácia; há muito não penso, e muito menos penso que penso e a segurança é ilusória" e aí pensa um gajo que todas as miúdas do restaurante (e mesmo as senhoras) eram giras, o que até nem é frequente num restaurante e todas (até as senhoras) podiam ser namoradas, ou mulheres, que não ficariam nada mal na moldura para fotografias que um gajo comprou há tantos anos e continua vazia.
Um dia um gajo "ouviu" uma senhora dizer "a minha tasca favorita em Lisboa é o Pap'Açorda" (ouviu entre aspas porque não ouviu, na realidade, leu), e pensou "se o Pap'Açorda é uma tasca eu sou a mulher do Papa" e hoje lembrou-se desta história porque esta tasca pode realmente ser a favorita de quem quer que seja desde que quem quer que seja não seja muito pedante, muito;
Porque o Stop do Bairro é quase uma tasca, quase, e come-se duas vezes melhor do que se esperava e paga-se duas vezes menos do que se pensava (o que demonstra que se pensava mal, e que os preços do Stop do Bairro são correctos) e demonstra também que as tascas sabem evoluir (não é sequer objecto de debate, que se f... as tascas e a respectiva evolução). E aí um gajo pensa que se pensasse seria, diz outro gajo, mais fácil, mais fácil, mais rico, ou pelo menos menos pobre.
"Nunca serei rico", pensa um gajo, "enquanto prestar atenção ao cú das senhoras; os cús não enriquecem quem por eles tanto trabalha".
Restaurante Stop do Bairro, rua Tenente Ferreira Durão, 55-A (Campo de Ourique). Fecha às segundas. Não fazem reservas.
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Restaurantes Lisboa
8.7.08
Zanga
"Não vais ficar zangada para sempre", perguntei-lhe, e ela disse "claro que não, estúpido, só os idiotas ficam qualquer coisa para sempre", e eu respondi "pois, ficam idiotas" e assim continuámos anos a fio.
Fachadas
Esta preocupação com as fachadas é uma excelente imagem de Portugal. [Bardamerda. Estou a tomar-lhe o gosto].
"Incêndio em prédio de Lisboa
Câmara garante que fachada não corre risco de ruir"
"Incêndio em prédio de Lisboa
Câmara garante que fachada não corre risco de ruir"
Números
Cada vez que alguém me defende uma hipótese com argumentos numéricos penso no Mateus Rosé, e calo-me.
Diálogos banais
- Desculpa, não tive tempo para...
- Eu sei. O tempo é o grande inimigo da boa educação, não é?
- Eu sei. O tempo é o grande inimigo da boa educação, não é?
Sensual e idades
Um bocadinho gorda, muito grande e de uma surpreendente agilidade na cama.
Está sentada à minha frente no restaurante e imagino-a. O ombro de uma camisola descaído pelo braço faz milagres.
Está sentada à minha frente no restaurante e imagino-a. O ombro de uma camisola descaído pelo braço faz milagres.
7.7.08
Simetrias, injustiças
Começo o dia a olhar para um magnífico rabo, na pastelaria onde tomo o pequeno almoço; e quase o acabo cruzando-me com outro, depois de jantar. Há simetrias agradáveis.
Depois, ocorre-me que fico invariavelmente a ganhar, quando olho para uma mulher bonita. A vida é injusta.
Depois, ocorre-me que fico invariavelmente a ganhar, quando olho para uma mulher bonita. A vida é injusta.
Fragmento
Há dias em que chorar é a única forma de te dizer quanto te queria ter aqui.
(Não sei se "chorar" é a designação correcta para esta vontade de explodir, esta necessidade de me desintegrar).
(Não sei se "chorar" é a designação correcta para esta vontade de explodir, esta necessidade de me desintegrar).
6.7.08
Uma frase bonita
"É vital explicar a dissonância cognitiva que consiste em prometer instalar ar condicionado quando se tem a casa a arder." A frase é bonita, e certeira, sem dúvida; a questão é saber se o PSD tem bombeiros e arquitectos e engenheiros para apagar o fogo e reconstruir a casa.
Sobretudo quando os moradores não querem nem ouvir falar em obras.
Sobretudo quando os moradores não querem nem ouvir falar em obras.
Paredão
Há um milhão de coisas piores do que passear no Paredão num dia de sol; não vale a pena enumerá-las, seria fastidioso. E há duas ou três que são melhores; infelizmente, não se podem descrever.
Hugo Boss
À frente da loja da Hugo Boss no Chiado um senhor disforme toca e canta música do Zeca Afonso. Não sei o que me impressiona mais: se a música, se a disformidade do senhor, se os preços da loja.
Ginginha
Às vezes gostava de ser estrangeiro e descobrir a Ginginha da rua das Portas de Sto. Antão como se nunca a tivesse visto antes.
5.7.08
Fragmento (modificado)
"Dans le temps j'écrivais des lettres, beaucoup de lettres. J'en garde quelques unes, je ne sais pourquoi. Je ne les ai pas relues - si aujourd'hui je suis peut-être mieux qu'il y a quelques années, mes textes, eux, le sont sans doute (ce qui n'est point difficile et ne veut surtout pas dire qu'ils sont bons, aujourd'hui).
Après j'ai cessé: les destinataires ont acquis une vie, la mienne continuait dans ses circonvallations, le papier disparut petit à petit des habitudes, la machine à écrire était lourde et ne se laissait pas transporter facilement, les ordinateurs, lorsqu'ils sont arrivés, servaient à d'autres choses. Je ne regrette pas la qualité de ce que j'écrivais - mais je regrette les lettres, cette façon de nous donner à connaître qui n'est gênante qu'à posteriori, de décaler dans le temps et dans l'espace ce que nous vivons aujourd'hui, ici ou là.
Dans quelques jours je recommence une tournée de voyages - Make Fast a été mal choisi, comme nom, comme projet, comme désir. J'abandonne définitivement l'idée qu'un jour je resterai dans un endroit, un seul, que j'aurais à quitter pour les vacances et pour une occasionnelle escapade professionnelle. Mes escapades sont les séjours chez moi, dans cette ville que j'aime passionnément (et ne me le rétribue pas, il me semble, mais je n'en suis pas sur).
Il y a un mot portugais qui n'a pas d'équivalent en français: "namorar"; ça veut dire un peut plus que "flirter". Peu importe. Lisbonne est une belle ville pour ça, que ta "namorada" soit une personne, la lumière, l'avenir, la vie...
En septembre j'irai à la Rochelle, en octobre à Barcelone, en Décembre à Paris; après, Londres et Düsseldorf. Avant, Salvador et Recife, Marseille, Algeciras et Rabat. Já "namorei" en toutes ces villes, ou presque: au fond, les lieux sont toujours les mêmes; le monde est comme une ville de laquelle rarement on sort de son quartier. De temps en temps une nouvelle rue s'ajoute, un ami à voir qui habite de l'autre côté de la ville, un restaurant qui mérite le déplacement, un document à faire. La stabilité est là, même si "là" est plus grand, plus large que ce que je voudrais.
Je ne me plains pas, remarque: j'aime ce que je fais - ce qui n'est pas très relevant, car je ne saurais faire autre chose. Et la vérité est que je me sens chez moi où que je sois - même si je préférerais te montrer les rues de Lisbonne, m'y perdre avec toi, dans toi, que découvrir un restaurant à Olinda par les mains d'une relation de travail, ou les conseils d'un réceptionniste d'hôtel.
Un jour j'ai comparé les rues de Lisbonne à ta peau; aujourd'hui, je m'aperçois que la lumière, cette incomparable lumière, est ce que je retrouvais dans tes yeux après l'amour; et la "nortada" dans ton souffle, pendant [passe o exagero...]. Peut-être Lisbonne m'aime-t-elle comme tu m'as aimé: avec distance, ironie et sensualité.
..."
Après j'ai cessé: les destinataires ont acquis une vie, la mienne continuait dans ses circonvallations, le papier disparut petit à petit des habitudes, la machine à écrire était lourde et ne se laissait pas transporter facilement, les ordinateurs, lorsqu'ils sont arrivés, servaient à d'autres choses. Je ne regrette pas la qualité de ce que j'écrivais - mais je regrette les lettres, cette façon de nous donner à connaître qui n'est gênante qu'à posteriori, de décaler dans le temps et dans l'espace ce que nous vivons aujourd'hui, ici ou là.
Dans quelques jours je recommence une tournée de voyages - Make Fast a été mal choisi, comme nom, comme projet, comme désir. J'abandonne définitivement l'idée qu'un jour je resterai dans un endroit, un seul, que j'aurais à quitter pour les vacances et pour une occasionnelle escapade professionnelle. Mes escapades sont les séjours chez moi, dans cette ville que j'aime passionnément (et ne me le rétribue pas, il me semble, mais je n'en suis pas sur).
Il y a un mot portugais qui n'a pas d'équivalent en français: "namorar"; ça veut dire un peut plus que "flirter". Peu importe. Lisbonne est une belle ville pour ça, que ta "namorada" soit une personne, la lumière, l'avenir, la vie...
En septembre j'irai à la Rochelle, en octobre à Barcelone, en Décembre à Paris; après, Londres et Düsseldorf. Avant, Salvador et Recife, Marseille, Algeciras et Rabat. Já "namorei" en toutes ces villes, ou presque: au fond, les lieux sont toujours les mêmes; le monde est comme une ville de laquelle rarement on sort de son quartier. De temps en temps une nouvelle rue s'ajoute, un ami à voir qui habite de l'autre côté de la ville, un restaurant qui mérite le déplacement, un document à faire. La stabilité est là, même si "là" est plus grand, plus large que ce que je voudrais.
Je ne me plains pas, remarque: j'aime ce que je fais - ce qui n'est pas très relevant, car je ne saurais faire autre chose. Et la vérité est que je me sens chez moi où que je sois - même si je préférerais te montrer les rues de Lisbonne, m'y perdre avec toi, dans toi, que découvrir un restaurant à Olinda par les mains d'une relation de travail, ou les conseils d'un réceptionniste d'hôtel.
Un jour j'ai comparé les rues de Lisbonne à ta peau; aujourd'hui, je m'aperçois que la lumière, cette incomparable lumière, est ce que je retrouvais dans tes yeux après l'amour; et la "nortada" dans ton souffle, pendant [passe o exagero...]. Peut-être Lisbonne m'aime-t-elle comme tu m'as aimé: avec distance, ironie et sensualité.
..."
4.7.08
Serviço público - Exposições
Na Galeria Fernando Santos, 98 rua de S. Paulo, Lisboa, está uma excelente exposição fotográfica, de um jovem fotógrafo chamado André Príncipe.
É a vida, fotografada com maturidade, e sensibilidade.
É a vida, fotografada com maturidade, e sensibilidade.
Uma história breve
Foi uma história breve, muito breve: não chegou sequer a usar todos as camisas-de-vénus que comprara, e foram muito poucas.
Diálogos banais
- Não nos apaixonamos por quem queremos, mas por quem podemos.
- Antes isso do que apaixonares-te por quem não deves.
- Seriam todas.
- Antes isso do que apaixonares-te por quem não deves.
- Seriam todas.
Aritmética
Há muitos anos fui jantar a um restaurante com uma namorada que entretanto se fatigou, justificadíssima e justamente, das minhas desesperadas tentativas para me apaixonar por ela. Hoje voltei lá, sozinho [lembram-se, quando "sozinho" tinha um acento grave, igualmente justificado?]. Não guardei grandes recordações do restaurante: não sei se a horrível televisão lá estava, uma coisa que não nos sai do campo visual, incómoda como um mosquito que nos picou numa noite de bebida; e se a cozinha está melhor ou pior - na altura não saímos, recordo-me, nem muito agradados nem muito desagradados (aliás, não voltei lá durante todos estes anos; e só fui hoje porque queria estar com ela, um bocadinho).
As diferenças são poucas, provavelmente; vejo a cadeira à minha frente e vejo-a a ela também, com um olhar bonito, triste e irónico ao mesmo tempo; e apercebo-me, coisa de que na altura só suspeitava, que o amor é muito mais do que a soma das suas partes, das circunstâncias e da vontade. Ou muito menos, vá saber-se.
As diferenças são poucas, provavelmente; vejo a cadeira à minha frente e vejo-a a ela também, com um olhar bonito, triste e irónico ao mesmo tempo; e apercebo-me, coisa de que na altura só suspeitava, que o amor é muito mais do que a soma das suas partes, das circunstâncias e da vontade. Ou muito menos, vá saber-se.
Sem título
O quadro é sempre o mesmo: um homem senta-se a uma mesa, num restaurante; está sozinho. Ninguém - e muito menos eu - sabe se ele é feliz ou não, se está sozinho porque quer, se está perto de concretizar os sonhos de uma vida ou, pelo contrário, de os perder.
Lá fora, a luz rasante do fim do dia ilumina os prédios de frente; as ruas, e os veículos que nelas circulam ficam na contra-luz. O efeito é surpreendente, saisissant: a luz e o seu contrário, o escuro e a ausência de escuro, as velhas linhas de eléctrico encandeantes no meio do negro do alcatrão, como duas linhas da luz de um farol numa noite de tempestade, duas linhas.
O homem fala num modo neutro com a empregada. Visivelmente não é cliente habitual. Na realidade, tem aspecto de quem não é cliente habitual de lado nenhum: há muito que não habita um mundo - ou melhor: há muito que o único habitante do seu mundo é ele, isso é visível. Que mundo é o dele? Que sou eu, a empregada do restaurante, as pessoas com quem se cruzou para aqui chegar, nesse mundo?
Não sei. Levanto-me e contemplo a luz, a contra-luz, o homem sozinho e a empregada sorridente, ligeira, resplandecente, no seu uniforme florido. É pequena, magra, estrábica e quase bonita, quase: o sorriso franco, aberto, claro compensa largamente o pouco que lhe falta para o ser. Será que o homem a viu, quando falou com ela? Penso que não; é míope, totalmente míope. Vê ainda menos para dentro do que para fora; não deve haver muitas coisas, muitas pessoas, muitos sonhos capazes de passar para o lado de dentro daquela face que se imagina tratada com uma mistura de vento, rum, mar, sol, whisky e solidão, em doses variáveis. Nada passa para o lado de fora, igualmente: as anteparas são estanques, naquele mundo.
A empregada diz-me adeus, mas não a oiço.
Lá fora, a luz rasante do fim do dia ilumina os prédios de frente; as ruas, e os veículos que nelas circulam ficam na contra-luz. O efeito é surpreendente, saisissant: a luz e o seu contrário, o escuro e a ausência de escuro, as velhas linhas de eléctrico encandeantes no meio do negro do alcatrão, como duas linhas da luz de um farol numa noite de tempestade, duas linhas.
O homem fala num modo neutro com a empregada. Visivelmente não é cliente habitual. Na realidade, tem aspecto de quem não é cliente habitual de lado nenhum: há muito que não habita um mundo - ou melhor: há muito que o único habitante do seu mundo é ele, isso é visível. Que mundo é o dele? Que sou eu, a empregada do restaurante, as pessoas com quem se cruzou para aqui chegar, nesse mundo?
Não sei. Levanto-me e contemplo a luz, a contra-luz, o homem sozinho e a empregada sorridente, ligeira, resplandecente, no seu uniforme florido. É pequena, magra, estrábica e quase bonita, quase: o sorriso franco, aberto, claro compensa largamente o pouco que lhe falta para o ser. Será que o homem a viu, quando falou com ela? Penso que não; é míope, totalmente míope. Vê ainda menos para dentro do que para fora; não deve haver muitas coisas, muitas pessoas, muitos sonhos capazes de passar para o lado de dentro daquela face que se imagina tratada com uma mistura de vento, rum, mar, sol, whisky e solidão, em doses variáveis. Nada passa para o lado de fora, igualmente: as anteparas são estanques, naquele mundo.
A empregada diz-me adeus, mas não a oiço.
3.7.08
2.7.08
Gaulices
Sarkozy promete "Não baixar os braços", e diz que "não há que ter medo da palavra protecção". Pergunto-me o que dirá quando as empresas francesas forem impedidas de se expandir pela "protecção" dos outros países.
1.7.08
Um video educativo...
...em dois sentidos: a) Não é só em Portugal; b) São estes senhores que propõem legislação, e dão lições de moral a meio mundo?
(Via Falta de Tempo)
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