18.8.22

A cidade e o mar

O que realmente nos atrai noutra pessoa não é a beleza, os olhos, as mamas, seja o que for que faça parte da «superfície». Tudo isso não passa de uma porta. O atraente está no interior, no que não se vê à primeira (ou segunda, ou terceira) vista. Como nas casas ou nas cidades, aliás. Uma pessoa é uma cidade que levamos anos a descobrir. «Uma casa da qual se conhecem todas as divisões não merece ser habitada» (Leopardo dixit). Baricco escreveu um livro que é uma cidade, as personagens ruas e as histórias bairros. Chama-se City (sei, acabei de confirmar). Viver não passa deste esforço contínuo de nadar entre a superfície e o «fundo» (sem aspas seria demasiado pedante).

Uma cidade descobre-se, deixa-se descobrir; como um corpo, como a pessoa que amamos e aos poucos vamos conhecendo. Como a vida: um ano é um anel no tronco da árvore, só que dessa não se vêem os anéis. Acumulam-se na pele, talvez. Nas rugas. Nos silêncios. No ar cálido e finalmente não abafador desta noite nesta cidade. 

As coisas são como são e não como gostaríamos que elas fossem. Ao contrário, as cidades são como queremos que elas sejam: é assim que as vemos, primeiro; e as construímos, depois. As pessoas também. Os livros. O mar não; nem o vento; nem os baixios. 

A cidade e o mar talvez seja um título mais adequado do que a Cidade e as Serras, não? 

Sem comentários:

Enviar um comentário

Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.