18.11.19

Escala, escada: instruções

Não tens uma mulher em cada porto mas cada mulher é um porto. Nalguns demoras mais: muita carga a descarregar e carregar. Noutros menos. Não depende só de ti.

De qualquer forma,  é preciso ajustar a unidade de conta da permanência no porto, na escala. Um ano tem doze meses, cinquenta e duas semanas, trezentos e sessenta e cinco dias, oito mil setecentas e sessenta horas. Escolhe as horas. Não digas "Estivemos juntos dez anos", mas "Estivemos juntos oitenta e sete mil e seiscentas horas (mais quarenta e oito, para os anos bissextos)". Deixa o teu amor refazer-se a cada hora, põe-o em risco, desafia-o. Faz de cada escala uma escada que sobes e desces sem descanso. Caminha na borda de um precipício no qual ora cais ora mergulhas, ora sais ora te perdes. Ama como vives: entre um deserto e um porto, de carga em descarga, de partida em chegada. Sê honesto, íntegro, "sê inteiro". Falha como vences, vence com a humildade com que falhaste. Ama mais do que és amado: é a única assimetria aceitável. Sai de um porto com o cuidado que puseste para nele entrar.

Uma escala, um porto, um corpo é uma escada, feita para subir e descer. Não a deixes ficar horizontal.

Sem comentários:

Enviar um comentário

Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.