25.1.21

Diário de Bordos - Palma, Mallorca, Baleares, Espanha, 25-01-2021 / II

«A chuva não pára de chover» (aspas porque a expressão não é minha, infelizmente) e pela primeira vez na vida encomendo um  jantar para me ser entregue a domicílio. Dei as explicações todas ao rapaz da Diner, uma deliciosa casa de hamburgers deliciosos (a repetição é propositada e tem fundamento). Que haja gente a aceitar esta situação ultrapassa-me. É como se o universo se tivesse posto a falar chinês comigo.

Não que percebesse tudo, «dantes». Estava muito longe disso. Mas tinha uma grelha, com as coisas mais ou menos arrumadas, alguns espaços vazios para as novidades, outros ocupados com as «certezas» (aspas porque eram poucas e do tipo «a Terra é redonda», «os governos não são necessariamente bons e precisam de ser controlados», «os nossos impostos são mal utilizados e por isso é um imperativo moral evitá-los») e algumas casas (muitas) para as dúvidas, para as novidades, etc. De um só golpe, esta pandemia varreu tudo. Continuo a estar certo de que a Terra é redonda, o Sol nasce a Leste e põe-se a Oeste ou a água do mar é salgada, mas tudo o mais desapareceu. A minha grelha parece um castelo de cartas depois de um terremoto. Sempre acreditei no poder da inteligência (se bem estivesse na secção «incertezas»), mas ver pessoas inteligentíssimas aceitar a narrativa oficial como qualquer almeida numa taberna depois de três copos de três (sem desprimor para os almeidas ou os copos de três, claro) deixa-me devastado. Nunca acreditei muito nos governos, mas vê-los a fazer o que estão a fazer aos respectivos países (mai-la certeza de que se na Suécia os políticos tivessem algum poder fariam exactamente a mesma coisa) deixa a minha pobre grelha a perguntar-se se não se terá transformado num caleidoscópio com os espelhos partidos.

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Entretanto, o jantar chegou. Um hamburger excelente, dentro do banal (quem já teve o privilégio - meço as palavras - de comer hamburgers na The Burger Point, casa sita no Porto e que caiu vítima deste turbilhão de loucura, sabe que todos os hamburgers são banais, menos aqueles). Desobedeci às minhas normas habituais e comi na mesa de navegação, único sítio onde me posso sentar e ter uma mesa à frente. Amanhã não chove e espero poder não repetir a experiência. Uma mesa de navegação serve para navegar, não para comer, beber ou fazer o que agora faço - escrever disparates (não por muito mais tempo, verdade seja dita. Esta mesa não está feita para se passar aqui horas seguidas, muito menos quando não se vê um palmo à frente do nariz.)

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