20.9.23

Diário de Bordos - Palma, Mallorca, Baleares, Espanha, 20-09-2023

Regresso a Palma, ao meu labirinto, após mais de um mês de ausência. Não se deve escrever sobre o vulcão durante a erupção nem sobre tsunami quando a vaga rebenta na praia. Vá lá: chamar tsunami ou erupção a esta catadupa de emoções é claramente um exagero. É uma cascata, digamos assim. Ou melhor: um remoinho. Uma das cruzes está resolvida, falta outra mais uma dezena de pequenos crucifixos, de tamanho variável. Juntando estes aos da carcaça não se pode dizer que o quadro seja muito animador. Mas olhando para trás, para as paredes do labirinto, tão pouco se pode desanimar. Isto vai passo a passo, esquina a esquina, beco sem saída a beco com saida. Depende apenas da quantidade de curvas a dar e paredes a abater.

O traveller está resolvido, a casa de banho e o esgoto do poço da roda de leme também, amanhã falo com o engenheiro por causa do registo... Não sei se labirinto é a melhor analogia. Às vezes sinto-me num carrocel.

É preciso força para provar que este sentimento está errado e que a analogia está correcta.

ADENDA 

Força - e luz do dia. É preciso acrescentar «quase» a quase tudo. Juro que quando o carrocel parar deixo de utilizar a palavra «quase» para sempre (sem aspas ficaria «deixo de utilizar a palavra quase para sempre», o que seria manifestamente impossível).

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P., BP., carcaça: devia acrescentar um vértice, prefiro quadrados a triângulos (e na volta estaria mais perto da verdade, vá lá saber-se). Ou cubos a pirâmides, qu'isto 'tá tudo ligado, óviste ó manguelas? Andas práqui com palavras de dois e quinhentos o quilo. Vai mazé vergar a mola, pá.

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«Labirinto» e «nómada» são duas palavras facilmente conciliáveis, não são? São.

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Exmos. senhores, 

Por uma razão obscura alguém me deu um número de telefone do «Gabinete do Utente». Na verdade foram dois, mas isso é irrelevante: poderiam ter sido trinta que o efeito seria o mesmo. Telefonar para um organismo português (seja ele público ou - menos - privado) é como telefonar para um buraco negro. As chamadas entram mas não saem. Os portugueses preferem as amálgamas e os ajuntamentos de pessoas que se vêem nas salas de espera dos hospitais a cinco minutos ao telefone. É uma opção e há que respeitá-la. Resta saber se respondem aos e-mails. 

No dia 14 de Setembro deste ano (é importante precisar o ano) um médico do Centro de Saúde de Cascais dirigiu ao hospital Egas Moniz um «Processo P1 completo» (aspas porque cito) a respeito de uma operação que devo fazer. Sei que quem decide a urgência da dita operação são os «triadores» (ditto). «Triadores» esses que nunca sequer falaram comigo ou viram o que se passa. Decidem a urgência baseados em intuições, suponho. Ou ausência de amigos com coisas mais importantes. Ou em função da posição da Lua no céu. Seja qual for o critério que os «triadores» usam - pode até admitir-se que sejam critérios objectivos, «científicos» (aspas porque ironizo) - penso que um bocadinho de transparência não faria mal a ninguém. Sobretudo para que pessoas como eu, que não têm amigos bem colocados e que devido ao seu trabalho viajam muito possam planear, por tenuemente que seja, a sua vida no futuro próximo. 

Este e-mail é um apelo nesse sentido: quanto tempo terei de esperar? Um ano? Dois? Um mês? Terei de passar esta magnífica oportunidade ao meu neto, que faz agora um ano e meio de idade? Qualquer informação seria bem vinda. A simples ideia de que o SNS não pensa que eu sou uma cabeça de gado - ou não me trata como tal, mesmo não o pensando - seria recebida com gratidão e alegria (por esta ordem). 

Cumprimentos,

Luís Serpa


(Descobri agora que tenho outro «processo» pendente há um ano. Já me tinha esquecido dele. Gostaria muito que o último fosse o primeiro e não fosse para a fila...)

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