19.6.21

Diário de Bordos - Palma, Mallorca, Baleares, Espanha, 19-06-2021

Deve ser efeito da moda, mas as miúdas estão cada vez mais despidas. De um ponto de vista estético, acho feio: há coisas que não são feitas para ser mostradas na rua a toda a gente. De outros pontos de vista, agradeço à moda. Em mim, a estética não é pervasiva. É uma presença, não uma Panzerdivision

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Vai chover não tarda - na verdade já chove, mas pouco - e o cheiro da chuva invade a cidade. A chuva arrasta o cheiro a perfume das miúdas desnudas (digo miúdas porque o são). Normalmente é demasiado intenso; é outra consequência da moda, suponho: encharcam-se em perfume. Ficam a léguas do «Channel nr. 5 and a smile» da outra, de quem de qualquer forma nunca ouviram falar. A modernidade é uma chatice: ninguém ouviu falar do que nos fez sonhar.

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As chuvas estão a chover. Assim, mesmo, no plural: as chuvas. A real e a metafórica. O meu P. cabreia, impaciente. Contratei mão-de-obra para o termos pronto a tempo do primeiro charter, dia 4 de Julho. É só meio dia, mas é o primeiro meio dia. Muitos se lhe seguirão. 

Muita gente não sabe o que charter significa. Não me refiro ao significado literal, directo, miseravelmente traduzido pelo português administrativo de «Actividades marítimo-turísticas». Charter tem um sentido transcendente, metafísico: é para isso, disso, que o barco vive. Os clientes de charter não o sabem, mas quando entram a bordo têm o estatuto de deuses. Isto é: são deuses. Justificam e dão sentido à nossa existência. Não é como num hotel ou numa pensão. É diferente. Um barco flutua não por causa do banho de Arquimedes, mas porque tem clientes de charter (que o linguarejar moderno transformou em guests, mas eu quero que o linguarejar moderno se afunde, com menos uma sílaba). A expressão «tenho um charter amanhã (ou para a semana, ou daqui a um mês) tem para um tripulante de charter - seja ele skipper ou o último dos deckies - o mesmo significado que para muitas religiões tem «Jesus vai descer à terra amanhã». É de resto por isso que as férias a bordo de uma embarcação são tão diferentes. São experiências religiosas, místicas. Não são férias. 

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Entretanto, Palma ressuscita. Faço parte dos optimistas. Daqui a dois anos ninguém se lembrará disto e daqui a quatro os pró-Covid terão vergonha. Vai uma aposta?

Vai.

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Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.