Isentos, é sabido, são aqueles que pensam como nós. Quem não, obviamente, é um perigoso manipulador (e com obsessões incompreensíveis). Este post de Fernanda Câncio eleva a lata e a má-fé a píncaros artísticos que é forçoso reconhecer. Não é um post: é um monumento, um Everest, uma obra-prima.
30.6.09
O sempre-em-pé
Não partilho da conclusão do post (ao fim de um bocado os piparotes maçam). Mas tudo o resto está mais do que justo. Não há quem tire o Pedro Palhaço Coelho da cena, de uma vez por todas?
Formigas, palavras
Já um dia aqui te falei das formigas, e das palavras. De como vão a ti buscar não sei bem o quê - ou melhor, sei: vão buscar aquilo de que formigas, e palavras, se alimentam. Hoje acabaram, as formigas e as palavras. E tu.
29.6.09
Junção
A estupidez é mortal; e a presunção também, já por aqui algures o escrevi. Mas as duas juntas transformam qualquer pessoa num cemitério ambulante, numa crónica anunciada de morte, num desvario de aborrecimento tão grande que torna a eternidade apetecível, quase.
Mentiras e obscuridades
É apesar de tudo obscura a razão pela qual Sócrates prefere dizer que não sabia de nada, na compra da Media Capital pela PT. De animal feroz a animal doce ainda vá, é confrangedor, mas enfim; agora animal ignorado?
Gazelas (Private joke)
"Sporting-Benfica: confrontos entre adeptos interrompem jogo". Um desporto que é um "espelho da sociedade" é forçosamente bonito. Lindo de se ver. Geométrico.
28.6.09
Time is a fake healer
Quando ela percebeu que "amo-te" é uma palavra proibida, começou a utilizar perífrases. Montes de perífrases. Até que chegou a "não te amo". Sem serem tão antónimas como parecem, as duas expressões estão longe de serem sinónimas, como ela pretendia. Mas não era o tipo de pessoa a quem uma proibição (ou um sentido proibido, se quiserem) impedisse de tentar atingir os seus fins. "Pequenos percalços, nada de grave", explicou-me. "Não te amo, como sabes. Mas quem sabe o que o futuro nos reserva? Entreabramos-lhe a porta: talvez um dia ele chegue de sopetão". "O futuro não chega, B., já to disse dezenas de vezes. O futuro faz-se. E eu não quero fazê-lo contigo; nem para, ou por ti". "Time is a fake healer, anyhow. Vamos jantar-nos?"
Modernidade
Ravel e o seu Bolero, Kafka, Pessoa, Cafavys; e tantos outros. Será a modernidade assíncrona?
Adenda: a pergunta fica melhor no plural: serão as modernidades assíncronas? Sim. Todas foram, sempre.
Conversa
Vamos falar de casais? Não. Vamos falar da chuva. De Tom Waits. De uma noite que começa e não acaba. E de quão difícil e longo é, aprender que há noites que não têm fim.
Desejo
Desculpe: a senhora monopolizou todo o meu desejo. Não sobrou nada para mais ninguém. Importa-se de me emprestar um bocadinho dele, por favor? Eu devolvo-lho, não se preocupe - se o quiser, claro. Isso é consigo. Não faço questão. Preferiria, claro. Mas enfim, não insisto: devolva-me um pouco do meu desejo, só um pouco. Depois veremos que uso dar-lhe.
27.6.09
Equívocos
É muito difícil explicar-te que sou um equívoco. Alívio é saber que tu o descobrirás por ti mesma, um dia.
Estupidez
Quando deixamos de creditar os erros, asneiras, incongruências dos outros à conta - generosa, universal e neutra - da estupidez damos um enorme passo em direcção à sapiência. Mas perdemos muito: o que antes era, indiferenciadamente, "estupidez" começa a ser má-fé, incompetência, incapacidade de raciocínio lógico, desonestidade - ou mesmo, em menos mas mais acertados diagnósticos - estupidez.
Talvez ganhemos em precisão - mas perdemos certamente em benevolência, em optimismo.
Talvez ganhemos em precisão - mas perdemos certamente em benevolência, em optimismo.
Deslumbre
Nenhum dicionário propõe uma boa definição da palavra "deslumbre": nunca dicionário algum me viu olhar para ti.
Inexorável...
...é uma palavra bonita. Dá vontade de nos pormos logo a chorar, mal a lemos ou ouvimos, não é?
26.6.09
Cenas da vida quotidiana
A senhora que está sentada à minha frente no comboio tem um daqueles cães horríveis, pequenos, feios. Creio que é chinês, mas não tenho a certeza; não percebo nada de cães. Senta-se com os joelhos muito juntos, apertados um contra o outro, apesar de estar de calças. Tem um semblante carregado. Não é bem triste, é fechado, como se houvesse uma parede entre ela e o mundo. Parece-se com o cão, claro - todos os donos de animais se parecem com eles (não sei se os escolhem por serem parecidos ou se ficam assim posteriormente, numa espécie de zelligização animalesca). Mas não é uma parecença superficial, imediata: é profunda, quase psicológica.
Agora entrou outra amante de animais. Mal vê o cão dirige-se para ele com grandes sorrisos e gestos abertos. É pequena, franzina, feia. Começa imediatamente a tutear a dona do cão e fico a saber o nome ("Óscar") e a raça ("Pug") do animal. As cenas de ternura pelo cão são imediatas, melosas, exageradas, feias. Ficamos a saber que o Óscar (que horror!) dorme com a dona na cama, "ao lado". A recém-chegada explica que perdeu uma cadela, "arraçada de ridgeback", e que anda à procura dela - por qualquer razão suspeita que a cadela apanhou o comboio. A cada estação vai à porta e grita o nome da coitada da cadela, para quem a fuga deve ter significado, imagino, uma libertação comparável à de Paris pelos Aliados.
Há uns anos Portugal era um coio de rafeiros e ninguém ligava nenhuma aos animais. Hoje estamos pior do que os franceses. Enfim, talvez não tanto. Mas quase.
A senhora do Pug "Óscar" descontraiu-se: tens os joelhos afastados e sorri. Dá todas as explicações e responde a todas as perguntas que a outra lhe faz, mesmo as mais descabidas, como aquela de saber onde dorme o cão. A outra continua com manifestações exageradas, desadequadas, inconvenientes de ternura para com o "Óscar".
Tenho pena da cadela perdida, dos anos todos que teve de suportar tão feroz ternura; e sinto-me feliz por ela. Imagino-a leve, a trotar livre e anonimamente por todos os sítios que antes lhe eram interditos, sem abraços, beijos, festas e ruídos tão carinhosos como o de um sorvedouro.
Entra o revisor, e a senhora da cadela perdida não tem bilhete. Arma-se uma cena, porque no comboio está uma equipa de controladores e o revisor não pode, de todo, deixar passar. A senhora - pequena, franzina e feia - é malcriada, áspera. A doçura desvaneceu-se-lhe. Para ela, o facto de estar à procura do seu animal justifica que ande sem bilhete - passou o dia todo no comboio, "já viu o que isso não custa?"
A dona do Pug recupera o seu olhar e aperta os joelhos. Penso na canção da Annette Peacock, e na mãe que não a ensinou a sentar-se com os joelhos juntos (ou terá sido ao contrário? Não sei). Na estação a seguir saem os dois, o "Óscar" e a dona. A da cadela pedida está numa discussão violenta com o revisor e a equipa de controladores. O comboio fica parado um largo momento na estação. Pego na bicicleta e saio - pensei que a discussão se ia eternizar.
Mal emerjo do túnel vejo o comboio a partir. É domingo e são onze da noite.
Agora entrou outra amante de animais. Mal vê o cão dirige-se para ele com grandes sorrisos e gestos abertos. É pequena, franzina, feia. Começa imediatamente a tutear a dona do cão e fico a saber o nome ("Óscar") e a raça ("Pug") do animal. As cenas de ternura pelo cão são imediatas, melosas, exageradas, feias. Ficamos a saber que o Óscar (que horror!) dorme com a dona na cama, "ao lado". A recém-chegada explica que perdeu uma cadela, "arraçada de ridgeback", e que anda à procura dela - por qualquer razão suspeita que a cadela apanhou o comboio. A cada estação vai à porta e grita o nome da coitada da cadela, para quem a fuga deve ter significado, imagino, uma libertação comparável à de Paris pelos Aliados.
Há uns anos Portugal era um coio de rafeiros e ninguém ligava nenhuma aos animais. Hoje estamos pior do que os franceses. Enfim, talvez não tanto. Mas quase.
A senhora do Pug "Óscar" descontraiu-se: tens os joelhos afastados e sorri. Dá todas as explicações e responde a todas as perguntas que a outra lhe faz, mesmo as mais descabidas, como aquela de saber onde dorme o cão. A outra continua com manifestações exageradas, desadequadas, inconvenientes de ternura para com o "Óscar".
Tenho pena da cadela perdida, dos anos todos que teve de suportar tão feroz ternura; e sinto-me feliz por ela. Imagino-a leve, a trotar livre e anonimamente por todos os sítios que antes lhe eram interditos, sem abraços, beijos, festas e ruídos tão carinhosos como o de um sorvedouro.
Entra o revisor, e a senhora da cadela perdida não tem bilhete. Arma-se uma cena, porque no comboio está uma equipa de controladores e o revisor não pode, de todo, deixar passar. A senhora - pequena, franzina e feia - é malcriada, áspera. A doçura desvaneceu-se-lhe. Para ela, o facto de estar à procura do seu animal justifica que ande sem bilhete - passou o dia todo no comboio, "já viu o que isso não custa?"
A dona do Pug recupera o seu olhar e aperta os joelhos. Penso na canção da Annette Peacock, e na mãe que não a ensinou a sentar-se com os joelhos juntos (ou terá sido ao contrário? Não sei). Na estação a seguir saem os dois, o "Óscar" e a dona. A da cadela pedida está numa discussão violenta com o revisor e a equipa de controladores. O comboio fica parado um largo momento na estação. Pego na bicicleta e saio - pensei que a discussão se ia eternizar.
Mal emerjo do túnel vejo o comboio a partir. É domingo e são onze da noite.
Beber, escolhas
Ontem bebi demais. É uma coisa que raramente acontece. Duas, três vezes por semana, no máximo. Mas ontem foi diferente: uma vez por ano, talvez.
Já aqui falei, decerto, da paixão imoderada que tenho por um cálice de Bailey's com uma gota de whisky, ou duas; e gelo, no verão. E da absoluta incapacidade de resistir a um bom Cuba Libre, nos bares em que há Cacique (infelizmente agora tem que ser feito com o velho; o novo está uma m... impotável). E da insensata predilecção por un Gin & Tonic, se for feito com Hendryck's e pepino, em vez do habitual Gordon's e limão.
Por causa disso ontem fui ao bar de um amigo meu e disse-lhe: quero um Bailey's; depois um Cuba Libre; e logo que a mentirita acabe, um G&T - como vêem, não preciso de lhe dar pormenores sobre o meu gosto. Ele conhece-o. - E quando o G&T acabar, recomeças: um Bailey's, um Cuba Libre, um G&T. E assim por diante, até eu dizer chega. Paguei-lhe logo 5 rodadas adiantadas (quem bebe para esquecer paga adiantado).
Devo dizer que tenho imensa dificuldade em escolher: sou o objecto de escolhas, mas nunca escolhi nada nem ninguém. Com as bebidas passa-se o mesmo: foram elas que me escolheram. Eu limito-me a dizer que sim. Ao que parece tenho os dois hemisférios cerebrais do mesmo tamanho, e igualmente amachucados. Isso vê-se, explicou-me uma jovem modista que nas horas vagas fazia coisas alternativas e tinha mamas perfeitamente simétricas, pelo tamanho dos braços: os meus são rigorosamente do mesmo tamanho, dizia ela.
Ou seja: não consigo decidir-me; quero tudo, e se possível ao mesmo tempo. Não sei quantas rodadas bebi: ainda não voltei ao bar. Sei que acordei há pouco com uma indescritível e inelutável necessidade de vomitar, coisa que fiz na casa de banho comum do meu prédio (moro num prédio antigo, que ainda tem casas de banho comuns, nos patamares intermédios).
Enquanto vomitava lembrei-me das admoestações dos meus vizinhos e deixei a casa de banho impecável. Pois bem: voltei para a cama e comecei a ter visões. Três garrafas de mão dada, penduradas do tecto, a dançarem um imaginário French cancan e a cantar "tens que escolher, tens que escolher". Estavam vestidas como as senhoras do Moulin Rouge que vão aos salões de turismo por essa Europa fora - isto é, muito pouco. Foi horrível - as garrafas cantavam mal, e se havia uma coisa que eu não queria ver eram garrafas.
Depois alinharam-se com prussiana precisão e começaram a desfilar à minha frente. Cada vez que uma delas passava, fazia uma vénia e dizia: "tens que escolher-me". Acabei por ir para o frigorífico - não é uma imagem: muitas vezes, quando não sei onde meter-me ou que fazer, tiro as prateleiras todas do frigorífico - de qualquer forma costuma estar vazio - e ponho-me lá dentro. Como sou friorento fico muito rapidamente em hipotermia - às vezes visto uma camisola, para atrasar um bocadinho esse momento. Quando estou quase a adormecer - é um dos primeiros sintomas da hipotermia - empurro a porta com violência. Até agora abriu-se sempre.
Desta vez custou um pouco mais, porque estava enfraquecido pela visão das garrafas penduradas no tecto. Mas enfim, lá consegui abrir a porta. E descobri que não gosto de beber. Nunca gostei, na realidade. Bebo e sempre bebi por mimetismo; ou assim.
Já aqui falei, decerto, da paixão imoderada que tenho por um cálice de Bailey's com uma gota de whisky, ou duas; e gelo, no verão. E da absoluta incapacidade de resistir a um bom Cuba Libre, nos bares em que há Cacique (infelizmente agora tem que ser feito com o velho; o novo está uma m... impotável). E da insensata predilecção por un Gin & Tonic, se for feito com Hendryck's e pepino, em vez do habitual Gordon's e limão.
Por causa disso ontem fui ao bar de um amigo meu e disse-lhe: quero um Bailey's; depois um Cuba Libre; e logo que a mentirita acabe, um G&T - como vêem, não preciso de lhe dar pormenores sobre o meu gosto. Ele conhece-o. - E quando o G&T acabar, recomeças: um Bailey's, um Cuba Libre, um G&T. E assim por diante, até eu dizer chega. Paguei-lhe logo 5 rodadas adiantadas (quem bebe para esquecer paga adiantado).
Devo dizer que tenho imensa dificuldade em escolher: sou o objecto de escolhas, mas nunca escolhi nada nem ninguém. Com as bebidas passa-se o mesmo: foram elas que me escolheram. Eu limito-me a dizer que sim. Ao que parece tenho os dois hemisférios cerebrais do mesmo tamanho, e igualmente amachucados. Isso vê-se, explicou-me uma jovem modista que nas horas vagas fazia coisas alternativas e tinha mamas perfeitamente simétricas, pelo tamanho dos braços: os meus são rigorosamente do mesmo tamanho, dizia ela.
Ou seja: não consigo decidir-me; quero tudo, e se possível ao mesmo tempo. Não sei quantas rodadas bebi: ainda não voltei ao bar. Sei que acordei há pouco com uma indescritível e inelutável necessidade de vomitar, coisa que fiz na casa de banho comum do meu prédio (moro num prédio antigo, que ainda tem casas de banho comuns, nos patamares intermédios).
Enquanto vomitava lembrei-me das admoestações dos meus vizinhos e deixei a casa de banho impecável. Pois bem: voltei para a cama e comecei a ter visões. Três garrafas de mão dada, penduradas do tecto, a dançarem um imaginário French cancan e a cantar "tens que escolher, tens que escolher". Estavam vestidas como as senhoras do Moulin Rouge que vão aos salões de turismo por essa Europa fora - isto é, muito pouco. Foi horrível - as garrafas cantavam mal, e se havia uma coisa que eu não queria ver eram garrafas.
Depois alinharam-se com prussiana precisão e começaram a desfilar à minha frente. Cada vez que uma delas passava, fazia uma vénia e dizia: "tens que escolher-me". Acabei por ir para o frigorífico - não é uma imagem: muitas vezes, quando não sei onde meter-me ou que fazer, tiro as prateleiras todas do frigorífico - de qualquer forma costuma estar vazio - e ponho-me lá dentro. Como sou friorento fico muito rapidamente em hipotermia - às vezes visto uma camisola, para atrasar um bocadinho esse momento. Quando estou quase a adormecer - é um dos primeiros sintomas da hipotermia - empurro a porta com violência. Até agora abriu-se sempre.
Desta vez custou um pouco mais, porque estava enfraquecido pela visão das garrafas penduradas no tecto. Mas enfim, lá consegui abrir a porta. E descobri que não gosto de beber. Nunca gostei, na realidade. Bebo e sempre bebi por mimetismo; ou assim.
22.6.09
Absence, ausência
- Laisse-moi m'exprimer ainsi: la lourde présence de ton absence.
- Est-ce ainsi que les hommes s'expriment?, perguntas.
- Je m'en fous - respondo-te. - Não falo pelos homens; nem mesmo por parte deles. Falo por mim, só por mim. Et pour ton absence, si lourde, si présente. Je parle pour tes yeux, qui me regardent muets de désir et de doute et pour la longiligne absence de ton corps. Falo por mim: sem ti, nem a ausência é a mesma; elle est obsédante, e pesada, a presença da tua ausência.
- Est-ce ainsi que les hommes s'expriment?, perguntas.
- Je m'en fous - respondo-te. - Não falo pelos homens; nem mesmo por parte deles. Falo por mim, só por mim. Et pour ton absence, si lourde, si présente. Je parle pour tes yeux, qui me regardent muets de désir et de doute et pour la longiligne absence de ton corps. Falo por mim: sem ti, nem a ausência é a mesma; elle est obsédante, e pesada, a presença da tua ausência.
21.6.09
Aritméticas - II
Duas meias ou três terços ou mesmo quatro quartos de relações não fazem uma relação.
Serviço Público - Exposições
Na galeria Arthobler, Lx Factory, está uma exposição de um artista checo chamado Jakub Nepras. Pela primeira vez - reconhecidamente não sou um especialista - vejo uma exposição de arte contemporânea que utiliza as tecnologias modernas, tem humor, não é agressiva, não é "procurada" (não sei se posso traduzir assim o recherché com que os franceses descrevem a originalidade a martelo), e tem um trabalho técnico impressionante.
Aritméticas
Quando ela vinha para a cama éramos três; do meu lado também, quando me juntava a ela éramos três. Dá um total de seis. Não era amor: era uma orgia.
20.6.09
19.6.09
Francofobias
Hoje fui ouvir Olivier Rolin ler alguns dos seus textos. Fiquei com inveja dos verdadeiros francófobos. Eu sou um falso francófobo.
Janela, música
A ideia é sentares-te à janela e ouvires a música passar. Não é complicado: tens o Blues do Catacumbas, o rock do Santiago Alquimista, o Bach de Glenn Gould ou as Vésperas, de Rachmaninov. Pouco importa: deixa que elas todas te passem à janela. E vai atrás: boa música é boa música, qualquer que ela seja, ou onde.
18.6.09
Diálogos possíveis
- Amo-te.
- Ainda bem que és tu a dizê-lo; se não, teria que ser eu, e não me apetece nada.
- Se tivesses dito eu nunca to diria.
- Ainda bem que és tu a dizê-lo; se não, teria que ser eu, e não me apetece nada.
- Se tivesses dito eu nunca to diria.
17.6.09
Muletas, alma
A melancolia e o humor são as duas muletas da alma. As duas muletas aceitáveis, quero dizer.
15.6.09
Vague, vague Léonore
Je dis: vague; et vague encore, Léonore, désir et corps. Lorsque tu dors à côté de moi dans mon vide, mon abisme, mon gouffre - éternelle ritournelle qui tourne sans cesse dans l'arc du temps, ton regard - je pense, Léonore, à ce ventre que je caresse et à la chance que j'ai, de pouvoir caresser une peau qui tant adore.
14.6.09
Portugal é uma ideia
"Portugal é uma ideia" - e uma língua. O projecto Mares - Olhares ambiciona ser a materialização desta ideia, aberto a todos os que fazem do português a sua pátria.
Respeito, simples respeito; ou bom senso.
"Não se entende este absurdo de o Governo não fazer o que deve e teimar no que não deve. Não espanta, por isso, que lhe atirem bonés (pese a discutibilidade do gesto) ou o penalizem nas urnas. Isto de governar virtualmente tem os seus limites e ninguém engana todos todo o tempo."
A ler na totalidade, aqui.
A ler na totalidade, aqui.
Mais um
Acabo de ser convidado - a generosidade, ou inconsciência não têm limites - para escrever no blog do S/Y "TAL A ROZ". Não vou ser um cronista "náutico" mas vou tentar, de vez em quando, transmitir um pouco do prazer que se tem numa embarcação de vela orientada para o cruzeiro, o lazer, o bem estar.
A pouco e pouco, claro.
A pouco e pouco, claro.
Conselhos
Falar às pessoas de um problema que nos aflige não serve para nos ajudar a resolvê-lo; só serve para vermos até que ponto estamos irremediavelmente sós.
12.6.09
Privilégios, milagres
Amar é um privilégio; ser amado uma sorte. Milagre é o encontro de dois privilégios, e duas sortes.
10.6.09
O blues está definitivamente mais blues
Depois de saber da morte de Koko Taylor, fico a saber da de Snooks Eaglin, mais cedo este ano.
Snooks Eaglin e George Porter Jr - You don't have to go
Não consegui encontrar um video de Careless Love cantado por ele, infelizmente.
Talk To Your Daughter.
Talk To Your Daughter.
Ani DiFranco
"Untouchable Face"
A letra é tocante:
think i'm going for a walk now
i feel a little unsteady
i don't want nobody to follow me
'cept maybe you
i could make you happy you know
if you weren't already
i could do a lot of things
and i do
tell you the truth i prefer
the worst of you
too bad you had to have a better half
she's not really my type
but i think you two are forever
and i hate to say it but
you're perfect together
so fuck you
and your untouchable face
and fuck you
for existing in the first place
and who am i
that i should be vying for your touch
and who am i
i bet you can't even tell me that much
two-thirty in the morning
and my gas tank will be empty soon
neon sign on the horizon
rubbing elbows with the moon
a safe haven of sleepless
where the deep fryer's always on
radio is counting down
the top 20 country songs
and out on the porch the fly strip is
waving like a flag in the wind
y'know, i don't look forward
to seeing you again soon
you'll look like a photograph of yourself
taken from far far away
and i won't know what to do
and i won't know what to say
except fuck you...
i see you and i'm so perplexed
what was i thinking
what will i think of next
where can i hide
in the back room there's a lamp
that hangs over the pool table
and when the fan is on it swings
gently side to side
there's a changing constellation
of balls as we are playing
i see orion and say nothing
the only thing i can think of saying
is fuck you...
A letra é tocante:
think i'm going for a walk now
i feel a little unsteady
i don't want nobody to follow me
'cept maybe you
i could make you happy you know
if you weren't already
i could do a lot of things
and i do
tell you the truth i prefer
the worst of you
too bad you had to have a better half
she's not really my type
but i think you two are forever
and i hate to say it but
you're perfect together
so fuck you
and your untouchable face
and fuck you
for existing in the first place
and who am i
that i should be vying for your touch
and who am i
i bet you can't even tell me that much
two-thirty in the morning
and my gas tank will be empty soon
neon sign on the horizon
rubbing elbows with the moon
a safe haven of sleepless
where the deep fryer's always on
radio is counting down
the top 20 country songs
and out on the porch the fly strip is
waving like a flag in the wind
y'know, i don't look forward
to seeing you again soon
you'll look like a photograph of yourself
taken from far far away
and i won't know what to do
and i won't know what to say
except fuck you...
i see you and i'm so perplexed
what was i thinking
what will i think of next
where can i hide
in the back room there's a lamp
that hangs over the pool table
and when the fan is on it swings
gently side to side
there's a changing constellation
of balls as we are playing
i see orion and say nothing
the only thing i can think of saying
is fuck you...
The Who
See me, feel me, touch me
Credo, onde nos leva a busca de uma jovem cantora norte-americana recente, com um nome italiano e que usa muitos palavrões nas letras das canções.
(Não me lembro do ... ooops, Ani DiFranco. Obrigado, Ani. O caminho das associações de ideias é inefável).
(Não me lembro do ... ooops, Ani DiFranco. Obrigado, Ani. O caminho das associações de ideias é inefável).
Deep Purple / The Who
Algo me diz que tenho de comprar discos novos, um dia destes.
Smoke on the water:
Pinball Wizard
Smoke on the water:
Pinball Wizard
Willie Nelson & Sinnead O'Connor
Não gosto particularmente da senhora. Mas Willie Nelson é um dos muito grandes, no meu panteão. A letra da canção é muito bonita.
Don't Give Up
In this proud land we grew up strong
We were wanted all along
I was taught to fight, taught to win
I never thought I could fail
No fight left or so it seems
I am a man whose dreams have all deserted
I've changed my face, I've changed my name
But no one wants you when you lose
Don't give up 'cos you have friends
Don't give up you're not beaten yet
Don't give up
I know you can make it good
Though I saw it all around
I never thought that I could be affected
I thought that we would be the last to go
It is so strange the way things turn
Don't give up you still have us
Don't give up we don't need much of anything
Don't give up
'Cause somewhere there's a place
There's a place where we belong
'Got to walk out of here
I can't take anymore
I'm gonna stand on that bridge
Keep my eyes down below
Whatever may come
And whatever may go
That river's flowing
That river's flowing
Moved on to another town
Tried hard to settle down
For every job, so many men
So many men no-one needs
Don't give up 'cause you have friends
Don't give up now we're proud of who you are
Don't give up you know it's never been easy
Don't give up
'Cause I believe there's a place
There's a place where we belong
Terapias
Um dia como hoje no mar (e a perspectiva de mais dois ou três), e saímos a pensar em coisas deste género:
(Louis Armstrong, Beautiful World)
Ou deste:
(Dean Martin, Volare)
Koko Taylor
Ao que parece morreu Koko Taylor, uma das minhas cantoras de blues favoritas. Era senhora de uma voz potente e de uma indomável energia. Já por aqui passou.
I'm ready - Koko Taylor:
I'm ready - Koko Taylor:
9.6.09
Pressões, opressões
O verdadeiro amor é por natureza desigual, desequilibrado, assimétrico. É isso que o torna estimulante. É um desafio, um risco, uma conquista, um milagre quotidiano, uma surpresa. É andar no fio de uma navalha que sabemos afiada, é termos que recorrer às palavras para as lágrimas e às mesmas palavras (mas outras) para as alegrias. Amar e não ser amado (ou não ser amado da mesma forma), ser amado e não amar sem que estas assimetrias sejam pesadas, dolorosas ou apareçam como pressões é um privilégio.
O amor que se quer recíproco, simétrico, eterno, puro é sempre, inelutavelmente uma intolerável opressão, porque é uma humanidade, uma artificialidade (ia dizer um "humanismo", mas contive-me. Não fosse chocar algum leitor mais sensível, longe de mim tal ideia).
Ou então é uma chateza, e não sei se não será pior ainda.
PS - O pior é a dor, eu sei. Mas isso fica para outro dia.
O amor que se quer recíproco, simétrico, eterno, puro é sempre, inelutavelmente uma intolerável opressão, porque é uma humanidade, uma artificialidade (ia dizer um "humanismo", mas contive-me. Não fosse chocar algum leitor mais sensível, longe de mim tal ideia).
Ou então é uma chateza, e não sei se não será pior ainda.
PS - O pior é a dor, eu sei. Mas isso fica para outro dia.
Linhas, palavras
Umas linhas, meia dúzia de palavras, um sorriso para te dizer que me faltas, e faltas à vida porque sem ti a vida não é bem vida, é uma coisa sem linhas, sem palavras e sem ti, uma coisa triste sem formas nem disformas, palavra sem sílabas, amor sem peles sem dedos sem mãos sem deslumbre.
Diálogos Reiserianos; ou: o Pateta dos Afectos
Situo este diálogo em vários locais possíveis, mas a primeira vez que o ouvi foi num avião da TAP, creio. Momentos depois, a senhora e o senhor que falavam levantaram-se e dirigiram-se para a parte traseira do avião, de onde regressaram cerca de 20 minutos depois.
- Já não tenho vida sexual; agora, só vida afectiva - dizia ele, antes da tal deslocação.
As respostas variam, consoante o local onde a frase foi dita.
Num bar do Bairro Alto pela barmaid, uma brasileira estonteante de boa:
- Sem vida sexual não tem vida de todo. Só vida afectiva é foda, viu?
Numa cama da classe média de Cascais:
- Oh, cala-te e fode. Já chateias, com essa merda do afecto e do amor e de sei lá que mais.
Num bar do Intendente:
- Afé quê? (Em aparte): Ó Manecas, olhá'qui pra este gajo qu'anda com coisas esquisitas.
Num jantar em Campo de Ourique não houve propriamente diálogo, mas a anfitriã, à saída, deixou um bilhetinho na mão do senhor que proferiu tão profunda frase. Ele mostrou-mo (era tão mal-educado como sensível): "N., adorei aquilo que disseste hoje. Pf telefona-me amanhã à tarde" (A., o marido da senhora, ia para Nova Iorque no dia seguinte de manhã).
- Já não tenho vida sexual; agora, só vida afectiva - dizia ele, antes da tal deslocação.
As respostas variam, consoante o local onde a frase foi dita.
Num bar do Bairro Alto pela barmaid, uma brasileira estonteante de boa:
- Sem vida sexual não tem vida de todo. Só vida afectiva é foda, viu?
Numa cama da classe média de Cascais:
- Oh, cala-te e fode. Já chateias, com essa merda do afecto e do amor e de sei lá que mais.
Num bar do Intendente:
- Afé quê? (Em aparte): Ó Manecas, olhá'qui pra este gajo qu'anda com coisas esquisitas.
Num jantar em Campo de Ourique não houve propriamente diálogo, mas a anfitriã, à saída, deixou um bilhetinho na mão do senhor que proferiu tão profunda frase. Ele mostrou-mo (era tão mal-educado como sensível): "N., adorei aquilo que disseste hoje. Pf telefona-me amanhã à tarde" (A., o marido da senhora, ia para Nova Iorque no dia seguinte de manhã).
7.6.09
Reboques
De todas as profissões do mar a mais nobre é - para mim, e a opinião está longe de ser partilhada - a dos rebocadores salvádegos.
Uma das coisas mais dificeis num reboque é calcular a dimensão do cabo de reboque: demasiado curto (ou tenso, se preferirem) e ele parte-se; demasiado longo (ou "solto") e o rebocado pôe-se a bailar de tal forma que por vezes arrasta com ele o rebocador. É preciso ajustar constantemente a tensão do cabo ao estado do mar.
Por vezes é mesmo preciso largar completamente o rebocado; deixá-lo a pairar, até o mau tempo passar. Depois vai-se buscá-lo, e continua-se: perderam-se alguns dias, quando muito. E o que são alguns dias, numa viagem?
É no mau tempo, e na maneira de o enfrentar, que o rebocador salvádego mostra o que vale: o critério é chegar com os bens e as vidas. Não é mostrar que se é o mais valente, o mais forte, o mais whatever. Chegar, com os corpos e os bens intactos. É tudo, e é muito.
Uma falácia aparente
Os acidentes de viação ocorrem devido às infracções às regras da condução; se não houver regras, não há infracções; logo, não há acidentes.
Fragilidade
Precisamos de ser muito fortes, se quisermos exibir as nossas fragilidades. As mulheres não as apreciam (quando as compreendem, o que é raro); e os homens desprezam-nas.
6.6.09
Liberdade - II
Paguei muitas vezes a liberdade com a falta dela - mas nunca por nunca ser achei o preço alto demais.
La petite mort et la résurrection
Todos somos suicidas: experimentem viver sem uma petite mort de vez em quando.
O princípio, o meio e o fim
Nunca sei bem como hei-de começar estas coisas; nem como as hei-de acabar. Só o que está pelo meio me interessa, o que fica entre a infinita magia do princípio e a previsível - e, espero-o de cada vez, eterna - melancolia do fim.
Pedantice e pedantice
Como roupagem, adorno, fingimento a pedantice é adorável; enquanto substância é abominável.
PS - como projecto...
PS - como projecto...
5.6.09
Amanhã, sempre
Todas as relações são efémeras, ou deviam ser: não devem durar mais do que um dia de cada vez. Um amor que não viva no fio da navalha é indigno desse nome; se não for um risco todos os dias não é nada, nunca.
Um amor de «hojes» e de «sempres», sem «amanhãs», nem «ontens».
Um amor de «hojes» e de «sempres», sem «amanhãs», nem «ontens».
A ver, absolutamente
Não sei se é verdade esta ideia de que os conservadores gozam mais do que os outros quando descobrem qualquer coisa nova de que gostam. Espero que não.
(Via Poesia Incompleta, o mais completo dos blogs incompletos.)
(Via Poesia Incompleta, o mais completo dos blogs incompletos.)
4.6.09
Ideia
Vê-se que uma ideia é boa quando ela não encaixa nos moldes, quando é difícil adaptá-la ao que existe. Enfim, pelo menos original. Nem sempre são sinónimos.
Língua
Nous pourrions peut-être nous taire en français; mais mon silence preferé se dit en portugais.
Silêncios
O encontro de duas liberdades, duas independências é o choque mais silencioso do mundo. O mais nobre.
Conselho
Ontem fui ouvir poesia dita por Mário Guerra, da Poesia Incompleta. Há muito tempo que não ouvia poesia tão bem dita, tão bendita.
3.6.09
Grandinha
Sonhos pequenos, sentimentos pequenos, palavras pequenas; em Portugal só a pequenez é grande.
Sim, não
Sim, não, talvez: devíamos eliminar estas palavras do nosso vocabulário; como as estrelas, o mar ou o tempo.
Caminhos
Um caminho de lava, sobre o qual andamos aos saltos até ele nos prender para sempre, e nos conservar imutáveis, intocáveis até ao fim do tempo.
Não ditos
Por vezes pergunto-me se o hábito português do não-dito é uma consequência do medo das palavras, que é muito maior do que o medo das coisas, ou actos, que elas designam.
2.6.09
Paris et al.
Oui, c'est vrai. J'ai l'ennui de Paris et de chaque fois que je m'y suis ennuyé. Et Londres, Barcelone, Marseille (je ne me suis jamais ennuyé à Marseille).
Silences
Point de silence plus dense que celui d'une femme qui a quitté un homme sans raison, ou pour une raison inavouable.
Policial
É a história de um tipo que foi pago para se matar a si próprio - chegou por acaso à fala com um gajo que por razões de dinheiro quer mandar matar alguém que não conhece pessoalmente; numa situação financeira aflitiva oferece-se para o job e só depois se apercebe que o alvo é ele. Com medo de dar a conhecer quem é na realidade, mas cheio de dívidas a outras tantas personagens sinistras aceita o adiantamento - que gasta, claro, a pagar aos outros credores. Propõe também uma parte ao que lhe dá o trabalho, para reduzir o montante em dívida, mas ouve-se dizer que é demasiado tarde: ou paga tudo ou vai desta para melhor.
Hesita: ou se mata e fica com as dívidas pagas - mas há que organizar o testamento - ou não se mata e a sua dívida para quem se quer vingar aumentou. Dilema chato.
Hesita: ou se mata e fica com as dívidas pagas - mas há que organizar o testamento - ou não se mata e a sua dívida para quem se quer vingar aumentou. Dilema chato.
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