9.2.20

Quinta vida

Faz o que fizeres. Não te esqueças de o fazer bem feito. Tudo o que é feito ou é bem ou não é. Seja o que for. Só uma coisa é difícil fazer bem: ser amado. Deixar-se amar correctamente, sem assimetrizar. Ser amado tanto quanto amas. Como se sintonizasses um rádio nas ondas curtas: é aquele o ponto, o comprimento de onda, percebes tudo o que ela te diz, lá do seu lado da cortina. Leva muito tempo a aprender. Tens de começar por amar-te e só para isso já precisas de uma eternidade. Aceitar-te como és, antes de aceitares que alguém te queira como és. De nada serve fingir. Acertar contigo mesmo, coordenar-te, acordar contigo o que és. Como se a balança tivesse três pratos: dois para ti e um para ela. Depois quatro. E finalmente dois. O amor é uma balança de precisão. Chega um dia em que te descobres afinado, calibrado, equilibrado: estarás pronto para ser amado.

Uma vida, digo-te eu. Sei do que falo: oscilo entre a inquietante dúvida e a  certeza enganadora. O meu equilíbrio é instável. Estou desafinado. Olho com olhos de ver, mas não vejo com olhos de ser visto. Ainda não estou pronto para ser amado. Pelo menos, bem amado.

Já vou na quinta vida.

(Para a P. M.)

3 comentários:

  1. gostei muito de ler.
    https://gatoaurelio.blogspot.com/2020/02/n-vidas.html

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    1. Obrigado de novo. Com um pedido de desculpas pelo atraso na publicação: só agora vi o omentário, por um acaso.

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  2. oh pa gosto quando dizes coisas politcas deste genero!

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Não prometo responder a todos os comentários, mas prometo que fico grato por todos.