30.11.08
Barómetros
Um dos barómetros ontem caiu quase 10mb, e hoje subiu 2. Não chega. O outro não pára de cair, e também não chega.
Os amigos de Karl...
... não são amigos: "O ataque mais sectário jamais feito ao Bloco de Esquerda".
"Viu? Assim é que é."
Por uma razão qualquer que, infelizmente, me escapa a esquerda não gosta das crónicas de Alberto Gonçalves. Na minha humilíssima opinião ele é, não de muito longe mas de cada vez mais longe o melhor cronista português.
Ana Matos Pires, no Jugular, dedica-lhe uma "Posta com dedicatória". A meu ver, o trecho de filme que escolheu não é o melhor. Como de costume, Alberto Gonçalves está cheio de razão e de sarcasmo, duas coisas que, combinadas, reconheço serem difíceis de suportar. Mas podia fazer um esforço, um pequeno esforço, para não ir directamente ao insulto, ao ataque ad hominem, e abordar aquilo que Alberto Gonçalves diz de forma racional. Afinal, o sarcasmo é uma das formas da racionalidade - e responder-lhe com urros não é a melhor forma de mostrar que está (ou estamos) enganados.
PS - Pelo menos, honra lhe seja feita, não escreveu sociólogo entre aspas, como já tenho visto noutros blogs da área.
Ana Matos Pires, no Jugular, dedica-lhe uma "Posta com dedicatória". A meu ver, o trecho de filme que escolheu não é o melhor. Como de costume, Alberto Gonçalves está cheio de razão e de sarcasmo, duas coisas que, combinadas, reconheço serem difíceis de suportar. Mas podia fazer um esforço, um pequeno esforço, para não ir directamente ao insulto, ao ataque ad hominem, e abordar aquilo que Alberto Gonçalves diz de forma racional. Afinal, o sarcasmo é uma das formas da racionalidade - e responder-lhe com urros não é a melhor forma de mostrar que está (ou estamos) enganados.
PS - Pelo menos, honra lhe seja feita, não escreveu sociólogo entre aspas, como já tenho visto noutros blogs da área.
29.11.08
28.11.08
27.11.08
O campo, as cidades e Lisboa
Já experimentei viver no campo várias vezes, mas nunca funcionou. Penso que tenho alergia à clorofila e apanho, muito rapidamente, intoxicações de verde. O meu oxigénio é a cidade. Se bem goste de me passear pelos jardins - são bonitos, verdes e muitos (e dos melhores) estão perto de minha casa.
Não é portanto de estranhar que prefira ver os dois largos ao pé de minha casa sem árvores. Num deles caíram, por causa do vento. No outro foram abatidas, sem dúvida pela mesma razão. Os largos ficam muito melhor assim, nus. Mais claros, luminosos, amplos, espaçosos. A vista melhorou substancialmente, e a luz também. O lugar das árvores é no campo, ou nos jardins das cidades.
As cidades têm coisas que não mudam com o vento: os Alexanders do Procópio, por exemplo, ou os do Pavilhão Chinês; o bacalhau da Floresta do Salitre (o nome é uma doce ironia) onde fui pela primeira vez muito recentemente e descobri que sou cliente desde e para sempre; a promoção da Ribadouro, ao fim da tarde. É possível comer Leitão à Bairrada em Lisboa, mas não comer um bife à Marrare na Mealhada; nas cidades há avenidas como a da Liberdade (que por sinal tem montes de árvores) e vistas como a do jardim de S. Pedro de Alcântara, ou do Miradouro de Santa Catarina; e bairros como o Bairro Azul, que acho muito mais bonito do que Campo de Ourique, ou como o Campo de Ourique, que apesar disso é muito bonito (o meu oxigénio são as cidades, mas o oxigénio das cidades é Lisboa).
As cidades têm pessoas que são excêntricas e não são malucas; ou originais e não são excêntricas; ou malucas e originais, como se tivessem cinco filhos, gostassem de chocolate e aos domingos fossem passear para os jardins. As cidades têm de tudo, porque as cidades são tudo (também gosto do mar, mas isso é porque no mar não há nada, rigorosamente nada do que há nas cidades). As cidades têm tudo aquilo de que um homem - ou mesmo uma pessoa - pode precisar: árvores, o rio Tejo, avenidas e pessoas adoráveis, excêntricas, originais (com filhos ou sem eles), Alexanders sublimes e restaurantes onde os rojões à Minhota não são rojões nem são à Minhota mas apesar disso são bons; têm bairros onde é impossível estacionar mas têm táxis; têm três apresentações de livros no mesmo dia e metro para ir de umas para as outras; senhoras com quem se pode ir jantar, outras que não gostam de nós e outras ainda por quem nos apaixonamos mal as vemos, lemos ou tocamos. Não é por acaso que ser "urbano" é diferente de ser "campónio".
Lisboa é uma cidade como as outras, em melhor, penso eu; apesar de ter coisas que as outras cidades do seu grupo não têm: prédios em ruínas, devolutos, lixo nas ruas, carros estacionados em todo o lado, até em cima das árvores, se pudessem. Lisboa tem isso tudo, e apesar disso tudo resiste. É uma puta linda, Lisboa, linda mas desmazelada porque os chulos que há tanto tempo a chulam não lhe ligam nenhuma - e apesar disso continua a ser a puta mais linda do quarteirão, porque se adivinha, por detrás do desmazelo e dos automóveis e do lixo nos passeios e dos sinais para peões que são mais fugazes do que o cometa Haley e estão verdes ao mesmo ritmo do que ele um corpo lindo, uma resistência férrea, estóica, indomável, subcutânea, intravenosa, arraigada. Lisboa vale mais do que os chulos que a governam; puta velha, esburacada, suja, escanzelada - mas linda. Bastar-lhe-iam um duche e meia dúzia de vestidos novos, e Lisboa seria a mais linda do bairro dela. Já é.
Não é portanto de estranhar que prefira ver os dois largos ao pé de minha casa sem árvores. Num deles caíram, por causa do vento. No outro foram abatidas, sem dúvida pela mesma razão. Os largos ficam muito melhor assim, nus. Mais claros, luminosos, amplos, espaçosos. A vista melhorou substancialmente, e a luz também. O lugar das árvores é no campo, ou nos jardins das cidades.
As cidades têm coisas que não mudam com o vento: os Alexanders do Procópio, por exemplo, ou os do Pavilhão Chinês; o bacalhau da Floresta do Salitre (o nome é uma doce ironia) onde fui pela primeira vez muito recentemente e descobri que sou cliente desde e para sempre; a promoção da Ribadouro, ao fim da tarde. É possível comer Leitão à Bairrada em Lisboa, mas não comer um bife à Marrare na Mealhada; nas cidades há avenidas como a da Liberdade (que por sinal tem montes de árvores) e vistas como a do jardim de S. Pedro de Alcântara, ou do Miradouro de Santa Catarina; e bairros como o Bairro Azul, que acho muito mais bonito do que Campo de Ourique, ou como o Campo de Ourique, que apesar disso é muito bonito (o meu oxigénio são as cidades, mas o oxigénio das cidades é Lisboa).
As cidades têm pessoas que são excêntricas e não são malucas; ou originais e não são excêntricas; ou malucas e originais, como se tivessem cinco filhos, gostassem de chocolate e aos domingos fossem passear para os jardins. As cidades têm de tudo, porque as cidades são tudo (também gosto do mar, mas isso é porque no mar não há nada, rigorosamente nada do que há nas cidades). As cidades têm tudo aquilo de que um homem - ou mesmo uma pessoa - pode precisar: árvores, o rio Tejo, avenidas e pessoas adoráveis, excêntricas, originais (com filhos ou sem eles), Alexanders sublimes e restaurantes onde os rojões à Minhota não são rojões nem são à Minhota mas apesar disso são bons; têm bairros onde é impossível estacionar mas têm táxis; têm três apresentações de livros no mesmo dia e metro para ir de umas para as outras; senhoras com quem se pode ir jantar, outras que não gostam de nós e outras ainda por quem nos apaixonamos mal as vemos, lemos ou tocamos. Não é por acaso que ser "urbano" é diferente de ser "campónio".
Lisboa é uma cidade como as outras, em melhor, penso eu; apesar de ter coisas que as outras cidades do seu grupo não têm: prédios em ruínas, devolutos, lixo nas ruas, carros estacionados em todo o lado, até em cima das árvores, se pudessem. Lisboa tem isso tudo, e apesar disso tudo resiste. É uma puta linda, Lisboa, linda mas desmazelada porque os chulos que há tanto tempo a chulam não lhe ligam nenhuma - e apesar disso continua a ser a puta mais linda do quarteirão, porque se adivinha, por detrás do desmazelo e dos automóveis e do lixo nos passeios e dos sinais para peões que são mais fugazes do que o cometa Haley e estão verdes ao mesmo ritmo do que ele um corpo lindo, uma resistência férrea, estóica, indomável, subcutânea, intravenosa, arraigada. Lisboa vale mais do que os chulos que a governam; puta velha, esburacada, suja, escanzelada - mas linda. Bastar-lhe-iam um duche e meia dúzia de vestidos novos, e Lisboa seria a mais linda do bairro dela. Já é.
Vida, energia
Sempre me surpreendeu a energia com que se levantava, todos os dias. Tanto mais sabendo eu o que, regra geral, a esperava. "Mais vale morta de pé do que viva dormindo", explicou-me, um dia.
Vida, intervalo - II
Passou a vida toda a dizer "Isto é só a primeira parte. O melhor está para vir". Tinha razão, mas não se lembrou que a segunda parte se chama "eternidade".
Vida, intervalo
Ela aceitava tudo menos passar por lamurienta e piegas. Desenvolveu mecanismos de defesa; funcionavam, quase sempre. Isso enfurecia as pessoas, que em geral suportam mal o estoicismo nos outros, porque o ignoram nelas. "Você passa pelas coisas como se nada estivesse a acontecer", disseram-lhe um dia. Por "coisas" deve ler-se "catástrofes", termo que o seu interlocutor não usou porque isso seria legitimar, ou pelo menos dar consistência, à situação que discutiam; o que tornaria a sua atitude, a sua "insensibilidade", a sua arrogância - que não passa, a mais das vezes, do nome que, erradamente, as pessoas dão ao medo - ainda mais incompreensível, ainda "pior".
"Só espero que tudo isto sirva para alguma coisa", disse-me um dia. "Sei que estou perto do fim, mas não sei se é o da primeira parte, se o do filme todo". Ela não estava a dramatizar, antes pelo contrário; era como se estivesse a dizer-me "Vou ao café. Queres vir?"
Vivíamos juntos há 5 ou 6 anos. Conhecera-a na internet, num daqueles fórums da usenet dos quais já ninguém se lembra. Era pequenina, muito magra, mas não tinha o aspecto de fragilidade que as mulheres com esse físico tantas vezes têm. Ainda não sei se alguma vez foi verdadeiramente feliz enquanto viveu comigo, enquanto viveu. Penso que sim. No dia em que se foi embora deixou-me um papel: "«Viveu muito, e sofreu mais ainda. Sofreu muito, e viveu mais ainda» seria um belo epitáfio, adequado, não achas?"
"Acho", quis responder-lhe, "mas só saberei onde colocá-lo se souber onde estás". "Escreve-o no vento, nesse mar de que tanto gostas, na areia de uma praia num dia de inverno - é lá que as nossas vidas, todas as vidas, estão". Esta era a resposta, e era o fim do filme. A vida não tem intervalo.
"Só espero que tudo isto sirva para alguma coisa", disse-me um dia. "Sei que estou perto do fim, mas não sei se é o da primeira parte, se o do filme todo". Ela não estava a dramatizar, antes pelo contrário; era como se estivesse a dizer-me "Vou ao café. Queres vir?"
Vivíamos juntos há 5 ou 6 anos. Conhecera-a na internet, num daqueles fórums da usenet dos quais já ninguém se lembra. Era pequenina, muito magra, mas não tinha o aspecto de fragilidade que as mulheres com esse físico tantas vezes têm. Ainda não sei se alguma vez foi verdadeiramente feliz enquanto viveu comigo, enquanto viveu. Penso que sim. No dia em que se foi embora deixou-me um papel: "«Viveu muito, e sofreu mais ainda. Sofreu muito, e viveu mais ainda» seria um belo epitáfio, adequado, não achas?"
"Acho", quis responder-lhe, "mas só saberei onde colocá-lo se souber onde estás". "Escreve-o no vento, nesse mar de que tanto gostas, na areia de uma praia num dia de inverno - é lá que as nossas vidas, todas as vidas, estão". Esta era a resposta, e era o fim do filme. A vida não tem intervalo.
26.11.08
Frio, fragmento, luz
O frio chegou, finalmente. Hoje a temperatura passou abaixo dos 10º. Felizmente, está sol; e mais felizmente ainda, a luz de Lisboa nunca fica verdadeiramente fria, como a da tua cidade. Mantém sempre a densidade do mel, como na canção de Leonard Cohen; ou esta sensualidade de mulher das ilhas. Uma luz densa e quente num dia frio: podia ser a descrição de uma vida, de uma pessoa ou de um amor, não achas?
25.11.08
Dúvidas
Estava com tantas dúvidas sobre ela própria que ficava contente quando tinha dores de cabeça.
A construção do futuro, e do passado
Um dia, quando nós não fôr mais do que uma memória; quando já nem nos lembrarmos que houve um dia nós, perguntar-te-ei uma coisa. E não me venhas dizer que nunca houve nós, que nunca foi, nunca existiu senão na minha imaginação. Eu sei perfeitamente de que falo. Daqui até esse dia vamos primeiro ter que o fazer, para o podermos em seguida esquecer.
Restaurantes, vida
"...Crédito à habitação, colégio dos miúdos, reparação do automóvel, férias..." Há dias em que a vida se senta ao meu lado, no restaurante.
Justiça
Eu não gosto muito de falar daquilo que não sei, mas parece-me que algo está mal, nesta história: "Condenado por homicídio acaba por ser libertado".
A solidão em slogans
"Solitários de todo o mundo, uni-vos!" não faz muito sentido: unidos, os solitários deixariam de o ser. Já "Sozinhos venceremos" soa melhor aos ouvidos. "A solidão não passará!" é irrealista: ela está em todo o lado. "O povo, solitário, jamais será reaccionário" - não sei, tenho dúvidas. "A solidão ao poder, as moscas já lá estão!" - não funciona, há pouca relação entre solidão e moscas. Creio.
Parabéns
O 31 da Armada faz hoje dois anos. Parabéns.
E chega aos dois milhões de pageviews. São compreensíveis e merecidos. Parabéns.
E chega aos dois milhões de pageviews. São compreensíveis e merecidos. Parabéns.
Destroço
Quando a encontrei era um destroço, devastada por passados que a perseguiam como "facas lançadas por um artista de circo a uma roda que não sabe para que lado girar". Levei-a para casa, dei-lhe de comer e disse-lhe para ir dormir. "Há muito tempo que para mim o sono", explicou-me, "não passa de uma sucessão de pesadelos". "Não são os passados. São os futuros. E não há nada a fazer: tens que passar por lá", respondi.
Um dia disse-me "o futuro é um passado que se enganou, graças a ti".
Um dia disse-me "o futuro é um passado que se enganou, graças a ti".
24.11.08
Vocabulário
Este fim-de-semana ou o Expresso ou o Público, não me lembro, trazia um artigo em cujo título confundia piratas com corsários. É um erro estúpido e lamentável. Apesar de tudo, os corsários eram marginalmente mais respeitáveis do que os piratas. Pouco, mas eram.
Aquilo que se está a passar no Índico norte actualmente é pirataria, pirataria da pior. Não deve ser dignificada (ainda que, repito, pouco) com o termo "corsário". E deve ser combatida como a outra, a do Jolly Roger, de Barba Negra, Jack Rackham, Anne Coby ou Mary Read (sim, havia mulheres piratas. E não ficavam a dever nada aos seus congéneres).
Aquilo que se está a passar no Índico norte actualmente é pirataria, pirataria da pior. Não deve ser dignificada (ainda que, repito, pouco) com o termo "corsário". E deve ser combatida como a outra, a do Jolly Roger, de Barba Negra, Jack Rackham, Anne Coby ou Mary Read (sim, havia mulheres piratas. E não ficavam a dever nada aos seus congéneres).
Uma boa notícia
Para os venezuelanos e para todos os amantes da liberdade. Será que Portugal vai enviar um telegrama de condolências a Chavez?
"Oposición gana cinco gobernaciones y recupera el control de Caracas"
(Via A Origem das Espécies)
"Oposición gana cinco gobernaciones y recupera el control de Caracas"
(Via A Origem das Espécies)
23.11.08
Cambadelas
Uma "chinesa", aqui. (Coisas que acontecem).
[Vidéo (c) Volvo Ocean Race/Team Russia.]
E uma voluntária - e bem executada, aqui.
[Vidéo (c) Volvo Ocean Race/Puma Ocean Race.]
[Vidéo (c) Volvo Ocean Race/Team Russia.]
E uma voluntária - e bem executada, aqui.
[Vidéo (c) Volvo Ocean Race/Puma Ocean Race.]
Apesar de perceber, e aceitar, a importância que todos estes meios de comunicação têm para a vela e o seu desenvolvimento, não consigo deixar de lamentar os tempos em que a única ligação à terra era a rádio SSB, que, vá lá saber-se porquê, só funcionava quando dava jeito...
"Por exemplo"
O melhor artigo que em muito li sobre a escola.Porque será que o sindicato dos professores não defende um modelo deste género?
Memória
Quando tu fores pó, e eu também; quando não formos os dois mais do que o pó do pó; quando aquilo que de nós restar fôr a memória do pó - mesmo aí me lembrarei de ti; e tu serás, para mim, o que sempre foste: a imagem de tudo o que é.
Serviço Público - Cinema
"Do outro lado", em exibição no Nimas. Pensava ir ver um filme sobre a emigração e a identidade e fui ver uma xaropada sobre a família e o acaso.
"Xaropada" é um bocado exagerado: com menos meia hora e um trabalho decente de direcção de actores o filme até poderia ser interessante: mas o hábito europeu de sobrecarregar e dizer (a leitura do diário da filha pela mãe é completamente supérfluo, por exemplo) tornam o filme longo, pesado e só me suscitou uma furiosa vontade de gostar dele, da ideia de acaso, das coincidências e da importância daquilo que desconhecemos que o atravessam, e são dele o mais interessante.
Já não sei quem é que dizia que os bons escritores são aqueles que confiam na inteligência dos leitores. Não se poderia aplicar a mesma máxima aos realizadores europeus (ou turcos, ou ambos)?
Isto dito, a jovem actriz turca é linda. Chama-se Nurgül Yesilçay. Gostaria de a ver nas mãos de um George Cukor.
"Xaropada" é um bocado exagerado: com menos meia hora e um trabalho decente de direcção de actores o filme até poderia ser interessante: mas o hábito europeu de sobrecarregar e dizer (a leitura do diário da filha pela mãe é completamente supérfluo, por exemplo) tornam o filme longo, pesado e só me suscitou uma furiosa vontade de gostar dele, da ideia de acaso, das coincidências e da importância daquilo que desconhecemos que o atravessam, e são dele o mais interessante.
Já não sei quem é que dizia que os bons escritores são aqueles que confiam na inteligência dos leitores. Não se poderia aplicar a mesma máxima aos realizadores europeus (ou turcos, ou ambos)?
Isto dito, a jovem actriz turca é linda. Chama-se Nurgül Yesilçay. Gostaria de a ver nas mãos de um George Cukor.
Não é verdade, mas é bonito
Tenho ido muito ao cinema, ultimamente. Sempre a filmes com muito pouca gente - e em número ímpar.
Crises
Dizem que é nas crises que os grandes estadistas se revelam. Eu não acredito: teríamos o país cheio deles, a ser verdade.
Castigo
Tal como, na escola, escrevia 100 vezes a palavra na qual me tivesse enganado, aceitas que corrija aquele beijo que no outro dia te dei distraído com 100 beijos atentos, e ternos?
22.11.08
Injustiças
Como me apercebo que não incluí Angélique Ionatos na lista ali de baixo...
(Não sei o nome desta canção. Angélique Ionatos num registo que lhe é pouco habitual):
(Não sei o nome desta canção. Angélique Ionatos num registo que lhe é pouco habitual):
Música
Graças a uma dessas correntes da net - que eu recebo com prazer mas às quais não sou, infelizmente, capaz de dar seguimento - descobri que no youtube há videos com música de Hildegard von Bingen.
"O magne pater"
"O magne pater"
"O Praesul Verae Civitatis"
Música de que eu gosto
Se bem percebi a ideia, trata-se de escolher um dos nossos músicos favoritos, e responder a 10 perguntas com títulos de canções dele (ou dela, claro, se fôr uma senhora).
A minha música favorita presta-se pouco a isso: jazz, música do medieval ao barroco, blues...; ainda por cima muitos dos meus discos não estão comigo. Poderia, claro, incluir o Leonard Cohen no desafio, mas isso seria a fuga pelo lado fácil. É exactamente o que vou fazer:
1) És homem ou mulher? "I'm your man"
2) Descreve-te: "Who by fire"
3) O que as pessoas acham de ti? "Sing another song, boys"
4) Como descreves o teu último relacionamento: "Hey, that's no way to say goodbye"
5) Descreve o estado actual da tua relação: "Avalanche"
6) Onde querias estar agora? "Chelsea Hotel"
7) O que pensas a respeito do amor? "Diamonds in the mine"
8) Como é a tua vida? "Tonight will be fine"
9) O que pedirias se pudesses ter só um desejo? "Dance me to the end of love"
10) Escreve uma frase sábia: "True love leaves no traces"
Agradeço à Luísa, a simpatia da escolha e a generosidade com que julga o Don Vivo. Se eu tivesse sido totalmente honesto, teria feito este exercício com uma mistura de Miles Davis, Keith Jarrett, Hildegard von Bingen, Carmina Burana, Gesualdo, Bach, Vivaldi, Marenzio, Johnny Cash, Rachamaninov (o das Vésperas, e poderia com ele ter respondido à primeira pergunta: "Blessed is the Man", um dos meus temas favoritos); teria incluido Mahler, da Segunda Sinfonia, a "Ressurreição"; um disco chamado "Music from the Court of King Janus at Nicosia", que é de uma beleza, de uma suavidade e profundidade só comparáveis à da Hildegard; teria incluido alguns temas de Salif Keita e da Bamako Railway Band; Jeanne Lee, claro - cito os nomes como me vêm à mente, na desordem total. Vejo que há pouco rock - é verdade, é uma música que não oiço muito. Mas os Pink Floyd, Jimi Hendrix, Nico deviam fazer parte da lista... Credo, como ordenar isto? Como ter esquecido Ornette Coleman? E John Lee Hooker, Lightnin' Hopkins ou T-Bone Walker? Frank Zappa? Um disco de Lou Reed chamado "Magic and Loss"?
A lista é longa e maçadora. Para minha grande surpresa, encontrei no Youtube muitos videos com música de Hildegarde von Bingen. Aqui lhe deixo uma peça da qual gosto muito. Diga-me o que pensa desta beleza tão tranquila, segura, profunda:
"Spiritus Sanctus"
A minha música favorita presta-se pouco a isso: jazz, música do medieval ao barroco, blues...; ainda por cima muitos dos meus discos não estão comigo. Poderia, claro, incluir o Leonard Cohen no desafio, mas isso seria a fuga pelo lado fácil. É exactamente o que vou fazer:
1) És homem ou mulher? "I'm your man"
2) Descreve-te: "Who by fire"
3) O que as pessoas acham de ti? "Sing another song, boys"
4) Como descreves o teu último relacionamento: "Hey, that's no way to say goodbye"
5) Descreve o estado actual da tua relação: "Avalanche"
6) Onde querias estar agora? "Chelsea Hotel"
7) O que pensas a respeito do amor? "Diamonds in the mine"
8) Como é a tua vida? "Tonight will be fine"
9) O que pedirias se pudesses ter só um desejo? "Dance me to the end of love"
10) Escreve uma frase sábia: "True love leaves no traces"
Agradeço à Luísa, a simpatia da escolha e a generosidade com que julga o Don Vivo. Se eu tivesse sido totalmente honesto, teria feito este exercício com uma mistura de Miles Davis, Keith Jarrett, Hildegard von Bingen, Carmina Burana, Gesualdo, Bach, Vivaldi, Marenzio, Johnny Cash, Rachamaninov (o das Vésperas, e poderia com ele ter respondido à primeira pergunta: "Blessed is the Man", um dos meus temas favoritos); teria incluido Mahler, da Segunda Sinfonia, a "Ressurreição"; um disco chamado "Music from the Court of King Janus at Nicosia", que é de uma beleza, de uma suavidade e profundidade só comparáveis à da Hildegard; teria incluido alguns temas de Salif Keita e da Bamako Railway Band; Jeanne Lee, claro - cito os nomes como me vêm à mente, na desordem total. Vejo que há pouco rock - é verdade, é uma música que não oiço muito. Mas os Pink Floyd, Jimi Hendrix, Nico deviam fazer parte da lista... Credo, como ordenar isto? Como ter esquecido Ornette Coleman? E John Lee Hooker, Lightnin' Hopkins ou T-Bone Walker? Frank Zappa? Um disco de Lou Reed chamado "Magic and Loss"?
A lista é longa e maçadora. Para minha grande surpresa, encontrei no Youtube muitos videos com música de Hildegarde von Bingen. Aqui lhe deixo uma peça da qual gosto muito. Diga-me o que pensa desta beleza tão tranquila, segura, profunda:
"Spiritus Sanctus"
Uma agradável surpresa
Fui ver In Bruges, um belíssimo filme sobre o remorso, a culpa, a redenção, o amor e a vontade de viver e, obviamente, Bruges, uma linda cidade na qual um realizador com menos talento do que Martin McDonagh não conseguiria fazer mais do que uma publicidade de 30 segundos (exagerando um pouco, muito pouco).
Não estava à espera que fosse tão bom.
Não estava à espera que fosse tão bom.
PSF
"PS : le camp de Martine Aubry revendique la victoire" - uma má notícia para o PS francês, e boa para quem não o quer ver no poder tão cedo.
21.11.08
O pior
Caro Paulo,
O que acho injusto nesta história é não haver jornais de outras áreas que, como o FT, avaliem os respectivos ministros dos diferentes países europeus. Teixeira dos Santos estaria, tenho a certeza, muito acompanhado.
"O Estado dos Bancos".
"O Estado dos Bancos".
Não digas nada
Já me disseram tudo o que havia para dizer; já ouvi tudo e nunca disse nada, quase nada - mal conheço os sons, quanto mais as palavras, coitadas, úteis como cumulus num céu de verão: enfeitam, mas não mudam nada.
Não me fales, não me peças para falar: deixa que as mãos, a pele, os ventres o façam; deixa que os nossos dentes se toquem, que os cabelos se emaranhem, que as mãos se confundam e as pernas se entrelacem; deixa as línguas explicarem-se, elas que têm tanto a dizer-se. Não me peças para falar: nada tenho a dizer. Sou um deserto sem oásis, um mar sem ilhas, uma lua sem crateras, uma árvore sem folhas, e sem raízes.
Sou eu sem ti.
Não me fales, não me peças para falar: deixa que as mãos, a pele, os ventres o façam; deixa que os nossos dentes se toquem, que os cabelos se emaranhem, que as mãos se confundam e as pernas se entrelacem; deixa as línguas explicarem-se, elas que têm tanto a dizer-se. Não me peças para falar: nada tenho a dizer. Sou um deserto sem oásis, um mar sem ilhas, uma lua sem crateras, uma árvore sem folhas, e sem raízes.
Sou eu sem ti.
Deixa-me dizer-te uma coisa, posso?
Já vi seios de todos os tamanhos e feitios, ventres lisos, coxas intermináveis, gordas e magras, demasiado magras; já vi sorrisos bonitos, outros falsos; já fui acariciado por mãos que me queriam e por - muitas mais - algumas que nem o meu nome sabiam; já amei e fui amado, em todas as latitudes e em todas as longitudes; já fiz amor e já fui feito, desfeito, refeito; já fiz muitas coisas em muitos lugares da Terra, e já mas fizeram; já quis amar e não ser amado, não amar, já quis a Lua (que ainda hoje é o meu planeta favorito) e o mundo todo. Já vi muitas coisas de que não gostei, e muitas mais pelas quais daria uma volta ao mundo; já e já e já - poupo-te as descrições todas, seriam enfadonhas.
Mas estou, ainda e sempre, pronto a amar. Basta querer. Ou crer.
Mas estou, ainda e sempre, pronto a amar. Basta querer. Ou crer.
20.11.08
Não é só a da Educação
"É sempre interessante assistir a uma entrevista televisiva da ministra da Educação. Ela tem o discurso bem articulado dos fanáticos. São pessoas que não cometem gaffes. Estas, não.
E mentem sempre."
Não é só a da Educação. O que eu admiro (mas não invejo) é a capacidade de dizer mentiras como se estivessem a dizer que a água é transparente.
E mentem sempre."
Não é só a da Educação. O que eu admiro (mas não invejo) é a capacidade de dizer mentiras como se estivessem a dizer que a água é transparente.
Serviço Público - Estrelas
Ao contrário do que muitas vezes se pensa, as estrelas não são todas iguais. São diferentes, únicas. Já neste blog falei, uma vez e de modo indirecto, se bem me lembro, de Canopus (aqui, para responder a um pedido exógeno, alienígeno, exotérico e respeitável), que tem oscilações de cor de fazer empalidecer um artista da música rock sob influência de LSD.
Antigamente, quando navegava com sextante, gostava muito de Sirius, porque é a mais brilhante do céu e mais fácil de apanhar. E de Betelgeuse por causa do nome, que nunca soube o que queria dizer (até hoje, obrigado Wikipedia). Do lado oposto a Sirius (se tomarmos Orion como eixo) havia Aldebaran, que também era fácil de identificar, e estava sempre lá.
Aconselho uma pequena visita a Canopus, pelas cores; a Sirius, pela simpatia; a Aldebaran, pela constância.
E claro, a Pollux e Castor, os dois Gémeos. Mas esses ficam para depois.
Antigamente, quando navegava com sextante, gostava muito de Sirius, porque é a mais brilhante do céu e mais fácil de apanhar. E de Betelgeuse por causa do nome, que nunca soube o que queria dizer (até hoje, obrigado Wikipedia). Do lado oposto a Sirius (se tomarmos Orion como eixo) havia Aldebaran, que também era fácil de identificar, e estava sempre lá.
Aconselho uma pequena visita a Canopus, pelas cores; a Sirius, pela simpatia; a Aldebaran, pela constância.
E claro, a Pollux e Castor, os dois Gémeos. Mas esses ficam para depois.
19.11.08
Serviço Público - Cozido à Portuguesa
Aos Domingos, no restaurante do Mercado de Sta Clara, há um excelente Cozido à Portugesa. É melhor marcar.
PS - O cozido já de si é muito bom, mas se for degustado em excelente companhia fica divino.
Mercado de Sta. Clara
Tel.: 210 996 164
PS - O cozido já de si é muito bom, mas se for degustado em excelente companhia fica divino.
Mercado de Sta. Clara
Tel.: 210 996 164
Diplomacia do croquete
Sábado fui almoçar com um jovem que tem, como eu, uma atracção por croquetes, e que deles fez, também, um ranking - com o qual eu não concordo, isto deve ficar dito desde já. Mas a verdade é que os meus favoritos estão todos na lista dele - estão é fora dos lugares, claro.
De qualquer forma o blog dele deve ser visitado - se estiverem à procura de adjectivos, por exemplo, digam-me o que pensam deste post.
De qualquer forma o blog dele deve ser visitado - se estiverem à procura de adjectivos, por exemplo, digam-me o que pensam deste post.
Tudo isto
Nunca acedo a pedidos idiotas, como sabes. O resultado é inevitavelmente uma série de idiotices, quer tu te chames Vida, Inferno, Princesa ou Maria, simplesmente Maria.
Mas tudo isto se deve a um pedido que me fizeste: "mostra o que és, realmente; corre com elas todas. Não te merecem: se eu quisesse, serias meu".
Mas tudo isto se deve a um pedido que me fizeste: "mostra o que és, realmente; corre com elas todas. Não te merecem: se eu quisesse, serias meu".
Espera, espera, espera
Estou velho, como sabes; já não sei correr - nem mesmo atrás de quimeras. Tão pouco quero, ou quereria, mesmo que. Não.
De tudo o que vejo, só te vejo a ti; de tudo o que sinto, só te sinto a ti; de tudo o que quero, só te quero a ti. Nada mais é, no mundo. Espera: acreditas realmente que se o ar acabasse tu serias o ar?
Eu penso que sim.
De tudo o que vejo, só te vejo a ti; de tudo o que sinto, só te sinto a ti; de tudo o que quero, só te quero a ti. Nada mais é, no mundo. Espera: acreditas realmente que se o ar acabasse tu serias o ar?
Eu penso que sim.
Ouve
Ouve, couve: achas realmente que sem ti não sei viver? Acreditas nisso? Eu, que cozo botões como tu pegas no telefone? Pensas, realmente, que sem ti a música não é a mesma, é surda; o chá não tem o mesmo sabor; o sol, mesmo o sol, brilha diferente; a vista é ensonsa, a cozinha um vasto deserto do qual nem o frigorífico, coitado, é o oásis?
Pensas realmente assim? Achas que contigo a cama é melhor, o jantar menos solitário, as ruas menos cinzentas, os restaurantes menos estúpidos? Achas - veramente? - que contigo faria melhores compras no supermercado, escolheria melhor os meus filmes, iria mais vezes ao teatro, receberia os neus amigos (e os teus, claro)?
Se calhar tens razão.
Pensas realmente assim? Achas que contigo a cama é melhor, o jantar menos solitário, as ruas menos cinzentas, os restaurantes menos estúpidos? Achas - veramente? - que contigo faria melhores compras no supermercado, escolheria melhor os meus filmes, iria mais vezes ao teatro, receberia os neus amigos (e os teus, claro)?
Se calhar tens razão.
Ainda não
Não te vás embora, ainda não. Mal nos conhecemos: um chá à varanda, um amor à parede, uma travessia do mar da Irlanda, muitas noites no mar - nada.
O amor é muito mais que isso: terramotos, ciclones, casas destruídas, janelas pretas e sóis encandeantes; luas tristes, planetas embriagados, estrelas cadentes que em vez de cair sobem, como se fossem jovens, inconscientes ou idiotas.
Não te vás embora, ainda não: mal começámos. Um passeio pelo Alentejo e mil noites no mar - o que é isso, num amor?
Não te vás embora, ainda não: achas realmente que amar outro é suficiente?
O amor é muito mais que isso: terramotos, ciclones, casas destruídas, janelas pretas e sóis encandeantes; luas tristes, planetas embriagados, estrelas cadentes que em vez de cair sobem, como se fossem jovens, inconscientes ou idiotas.
Não te vás embora, ainda não: mal começámos. Um passeio pelo Alentejo e mil noites no mar - o que é isso, num amor?
Não te vás embora, ainda não: achas realmente que amar outro é suficiente?
Palavras
Um dia pediste-me palavras. Disse-te que sim, porque não sei dizer que não. Mas, como sabes, tão pouco sei dizer "palavras", essas coisas bizarras e independentes que se nos escapam quando não queremos e não aparecem quando delas, desesperadamente, precisamos.
Só sei dizer "vidas", mas isso tu não queres.
Só sei dizer "vidas", mas isso tu não queres.
Olhos
Uma vez conheci uns olhos. Não me lembro se eram verdes, mas penso que sim. Só os vi uma vez ou duas; amei-os outras tantas. Ainda hoje é neles que me perco, quando me perco em ti.
Tu és
Dave Brubeck, whisky e uma terrível melancolia fazem misturas ricas, talvez, mas dolorosas. Sobretudo se essa melancolia tiver o teu nome, a tua cara, a tua pele, na qual tantas vezes passeei; o teu riso, no qual me perdi; os teus olhos, através dos quais a vida, o mundo e o futuro me apareceram diferentes do que eles são, sem eles. Já to disse muitas vezes: quem não pode amar não sabe amar; e uma: mesmo quem não sabe talvez possa, se tu quiseres.
Estas horríveis horas sem ti: cada minuto é uma vida. Contigo também: cada segundo é uma vida, uma eternidade - uma magnífica, soberba, deliciosa eternidade.
Tu és a vida, a que foi e será. Tu és a ausência toda, toda do que foi. Tu és, serás, foste. "Amo-te" não faz sentido, porque "Não te amo" tão-pouco o faz; tu és o sentido das coisas, das palavras que as designam, do tempo no qual elas vivem, viveram, foram. Em ti tudo foi; sem ti nada.
És aquilo que o tempo gostaria de ser, se não fosse um projecto. A flor para a qual a cidade olha, através da minha janela; a serenidade que seria a noite contigo, à noite depois de ti. O tempo é o sorriso com que me olhas, saciada, grata, feliz. Tu és a figura do tempo; a figura imóvel e feliz do tempo.
Aquilo que eu serei quando te conhecer, quando te amar, quando me disseres: "tu és o que sempre fui. Tu és o que seremos, quando formos". Tu és - e eu sem ti não sou.
Estas horríveis horas sem ti: cada minuto é uma vida. Contigo também: cada segundo é uma vida, uma eternidade - uma magnífica, soberba, deliciosa eternidade.
Tu és a vida, a que foi e será. Tu és a ausência toda, toda do que foi. Tu és, serás, foste. "Amo-te" não faz sentido, porque "Não te amo" tão-pouco o faz; tu és o sentido das coisas, das palavras que as designam, do tempo no qual elas vivem, viveram, foram. Em ti tudo foi; sem ti nada.
És aquilo que o tempo gostaria de ser, se não fosse um projecto. A flor para a qual a cidade olha, através da minha janela; a serenidade que seria a noite contigo, à noite depois de ti. O tempo é o sorriso com que me olhas, saciada, grata, feliz. Tu és a figura do tempo; a figura imóvel e feliz do tempo.
Aquilo que eu serei quando te conhecer, quando te amar, quando me disseres: "tu és o que sempre fui. Tu és o que seremos, quando formos". Tu és - e eu sem ti não sou.
Um dia
Um dia reconhecerás que ter sido amada por mim não foi doloroso. Enfim, não tanto como pretendes.
Sinais exteriores de pobreza
Recentemente li um blog no qual uma senhora dizia que quem não sabe dançar não sabe fazer amor. Como, no meu caso, ela está terrivelmente correcta, dou-lhe outra dica: quem come muito depressa também não.
E outra ainda: quem fala muito depressa.
E outra ainda: quem fala muito depressa.
Semântica, amor e ambiguidades
Já te disse: "Amo-te" não significa que te amo. Quer dizer "quero amar-te, gostaria de te amar, vou amar-te".
Ou, mais realisticamente "quero ser amado por ti".
Ou, mais realisticamente "quero ser amado por ti".
Ironias e vergonha
Vai por aí um debate em torno da pretensa (ou não) ironia de Manuela Ferreira Leite sobre a suspensão da democracia para "pôr tudo na ordem" (as aspas são minhas, a falta de paciência chega aí).
Há várias expressões que me ocorrem; uma já mencionei. As outras são ligeiramente mais expressivas. Em termos de sentimentos, o mais forte é sem dúvida o espanto. Onde é que eles vão buscar pachorra, energia e criatividade para tantas inanidades?
En attendant, acho que se deve ler isto
Há várias expressões que me ocorrem; uma já mencionei. As outras são ligeiramente mais expressivas. Em termos de sentimentos, o mais forte é sem dúvida o espanto. Onde é que eles vão buscar pachorra, energia e criatividade para tantas inanidades?
En attendant, acho que se deve ler isto
18.11.08
15.11.08
Serviço Público - Marrabenta
O som é horrível; e a imagem só marginalmente é melhor. Mas passei muitas horas, muitas, e algumas das melhores, no Gil Vicente.
Isso perdoa tudo, e autoriza quase tudo:
Dilon Djindji e Chikito no Gil Vicente, Maputo
Isso perdoa tudo, e autoriza quase tudo:
Dilon Djindji e Chikito no Gil Vicente, Maputo
Serviço Público - Leitão
Na Av. da Liberdade há uma cervejaria chamada Quebramar (logo a seguir à Praça da Alegria, quando se desce) que tem o melhor leitão que jamais comi em Lisboa. Como nunca comi um decente, até conhecer a Quebramar, aceito que relativizem. Mas "juro, palavra d'honra, sinceramente vou morrer assim", é muito muito bom.
Labels:
Restaurantes Lisboa
Serviço Público - café
- 40% de Timor;
- 40% de S. Tomé;
- 20% do lote Robusta (Angola e Indonésia, esta última dispensável, a meu ver).
14.11.08
Lisboa, cantores populares, restaurantes indianos e homens do Norte
Mentiria se dissesse que não sei quem é Tony Carreira: acho - hoje tenho a certeza - que é um cantor; e sei que tem um filho, chamado Mike se a memória não me falha. O que eu de todo não sabia é o vasto poder de atracção que o senhor, a julgar pela multidão que hoje se juntou à frente do Coliseu, em Lisboa, tem.
A força de venda ambulante da rua das Portas de Sto. Antão foi toda mobilizada para a distribuição de cachecóis "Tony Carreira". E, a certa altura passou por mim um Mercedes muito grande com um senhor lá dentro que eu pensei ser um Ministro, ou coisa que o valha - até o insultei, mentalmente, claro "não podes ir a pé, ...?"; mas afinal era o dito Tony Carreira, a julgar pelos gritos que se ouviam na rua.
O que mais me fascinou foi a amplitude do leque de pessoas que ali estava: tanto em termos de idade - havia gente desde a pré-adolescência obesa e borbulhenta até à quarta idade bengalada e carcomida; como de estratos sociais - enfim, reconheço que para além do dito Tony Carreira não vi muitos A e B, mas do C para baixo todos os segmentos estavam representados; como, ainda, da distribuição geográfica (e neste aspecto o título do post é enganador) - havia pelo menos uma pessoa, ou um grupo, do Norte.
Penso que eram do Norte porque uma senhora, de cachecol "Tony Carreira" nos cabelos como se fosse um lenço, copo de cerveja (de plástico) na mão e uma pequena audiência à volta dizia, alto e bom som, que os homens do Norte é que são bons. Quando olhei para ela - com um vasto sorriso, de passagem seja dito - ela perguntou-me "não acha?". Respondi-lhe que não sabia, nunca tinha experimentado (o que é verdade). "Pois eu garanto-lhe que sim", retorquiu. E pôs-se a cantarolar uma música que falava de "bigodes" e "podes", mas que não percebi bem, nem sequer tenho bigode, aliás.
Havia muita gente, muita - uma Lisboa como há muito tempo não vejo, cheia de "pintas", mânfios", brejeira. E com um cantor que se desloca em carro de Ministro (se calhar é ao contrário, são os Ministros que se deslocam em carro de cantor, vá saber-se).
O frio era pouco e eu estava sentado na esplanada de um restaurante indiano chamado "O Sitar", do qual posso afiançar que pelo menos as chamuças, não sendo extraordinárias, são boas; e comi pela primeira vez no nosso país chicken chat, uma entrada da qual gosto muito.
O melhor restaurante indiano onde já comi chama-se Haandi e fica em Nairobi, num centro comercial em Westland. É um bocadinho como o Méson Andaluz, um restaurante excelente no Centro Comercial de Cascais Shopping. Outro dos meus restaurantes indianos favoritos é em Londres e chama-se India Club, no Strand. Em Lisboa, recomendo vivamente o Haweli, na Graça.
E (nos dias em que Tony Carreira canta no Coliseu) o Sitar, claro.
A força de venda ambulante da rua das Portas de Sto. Antão foi toda mobilizada para a distribuição de cachecóis "Tony Carreira". E, a certa altura passou por mim um Mercedes muito grande com um senhor lá dentro que eu pensei ser um Ministro, ou coisa que o valha - até o insultei, mentalmente, claro "não podes ir a pé, ...?"; mas afinal era o dito Tony Carreira, a julgar pelos gritos que se ouviam na rua.
O que mais me fascinou foi a amplitude do leque de pessoas que ali estava: tanto em termos de idade - havia gente desde a pré-adolescência obesa e borbulhenta até à quarta idade bengalada e carcomida; como de estratos sociais - enfim, reconheço que para além do dito Tony Carreira não vi muitos A e B, mas do C para baixo todos os segmentos estavam representados; como, ainda, da distribuição geográfica (e neste aspecto o título do post é enganador) - havia pelo menos uma pessoa, ou um grupo, do Norte.
Penso que eram do Norte porque uma senhora, de cachecol "Tony Carreira" nos cabelos como se fosse um lenço, copo de cerveja (de plástico) na mão e uma pequena audiência à volta dizia, alto e bom som, que os homens do Norte é que são bons. Quando olhei para ela - com um vasto sorriso, de passagem seja dito - ela perguntou-me "não acha?". Respondi-lhe que não sabia, nunca tinha experimentado (o que é verdade). "Pois eu garanto-lhe que sim", retorquiu. E pôs-se a cantarolar uma música que falava de "bigodes" e "podes", mas que não percebi bem, nem sequer tenho bigode, aliás.
Havia muita gente, muita - uma Lisboa como há muito tempo não vejo, cheia de "pintas", mânfios", brejeira. E com um cantor que se desloca em carro de Ministro (se calhar é ao contrário, são os Ministros que se deslocam em carro de cantor, vá saber-se).
O frio era pouco e eu estava sentado na esplanada de um restaurante indiano chamado "O Sitar", do qual posso afiançar que pelo menos as chamuças, não sendo extraordinárias, são boas; e comi pela primeira vez no nosso país chicken chat, uma entrada da qual gosto muito.
O melhor restaurante indiano onde já comi chama-se Haandi e fica em Nairobi, num centro comercial em Westland. É um bocadinho como o Méson Andaluz, um restaurante excelente no Centro Comercial de Cascais Shopping. Outro dos meus restaurantes indianos favoritos é em Londres e chama-se India Club, no Strand. Em Lisboa, recomendo vivamente o Haweli, na Graça.
E (nos dias em que Tony Carreira canta no Coliseu) o Sitar, claro.
Impunidade
Os portugueses - incluindo, claro, os seus políticos - não são intrinsecamente diferentes dos alemães, suecos ou togoleses. O que nos separa dos primeiros e aproxima dos últimos é a impunidade.
13.11.08
Evacuação de Kindu
Fiz uma pesquisa no blog e não encontrei este texto, já antigo. Se por acaso aí estiver, as minhas desculpas - e um obrigado antecipado por mo dizerem. Faz parte de uma série de textos com os quais procurei fechar a porta. Não sei se consegui; pelo menos terei tentado. A qualidade literária não será grande coisa; mas tem uma vantagem: é a reprodução fiel do que se passou.
Fizemos o trajecto de Mueda para Quissanga, onde devíamos apanhar o barco para a Grande Quirimba, a uma velocidade estonteante. Chovia como se as comportas do céu tivessem sido abertas por engano, depois de um período de falta de água. Os pneus estavam carecas e por duas vezes saí da estrada, como se estivesse a deslizar em manteiga. Não tinha o mais pequeno controle sobre carro até ele bater nos taludes que ladeavam a estrada e perder, progressivamente, velocidade. Uma vez, no Zaire, fiz uma viagem semelhante, só que não estava a chover e a velocidade era ainda maior.
O Governador ("La Force Tranquille du Manyema") quis fazer uma reunião num buraco qualquer 120 km a leste de Kindu, para mostrar a toda a gente que quem mandava era ele, e que Kabila não lhe metia medo. A reunião começou por estar marcada para uma quarta feira, mas por qualquer razão mudou para quinta. As peripécias começaram logo à partida: o "capitão" do ferry boat não apareceu, fez esperar sua majestade, foi despedido mas obrigado, naturalmente, a fazer a travessia. Íamos em dois jipes: num - convenientemente desnudado do emblema da Cruz Vermelha - o Governador e respectiva escolta, armada até aos dentes. O carro estava cheio a abarrotar, de fora só se viam os canos das Kalashes que sobressaíam da massa escura dos soldados. Noutro, o pessoal da Cruz Vermelha e eu.
Quando chegámos ao outro lado, o condutor do jipe do Governador disse-me que queria ir à frente e pediu-me para o seguir. Tentei fazê-lo e quase o consegui, mas foi o trajecto mais alucinante da minha vida: raramente íamos a menos de 120 numa picada cheia de buracos, com capim mais alto que os carros e exactamente da largura destes. Não tirei a mão da buzina desde que parti, com medo que uma criança se me atravessasse à frente.
Os Toyotas saltavam, dançavam, voavam por aquela picada fora e embora eu soubesse que as armas não se iam pôr a disparar sózinhas não conseguia impedir-me de pensar que uma granada ia cair, ou um soldado destravar a segurança e via constantemente à minha frente uma grande bola de fogo - e nós, no outro carro, alvo da fúria popular - o bem-amado Governador tinha, literalmente, explodido. Era coisa que ele parecia ir fazer a cada instante, o gajo era gordo, enorme, inchado ainda mais pelos 10% que comia da ajuda que nós levávamos para Kindu - coisa que escandalizou as chefias da Cruz Vermelha, coitadas, quando souberam.
Chegámos finalmente a Kalungo, ou coisa que o valha, não me lembro do nome. As outras agências, que não estavam em Kindu, tinham ido de avião. A excitação era enorme, os zairenses andavam cinzentos de medo e nós, os brancos, só por meias palavras percebemos que o Kabila estava perto, muito perto. A reunião foi nessa mesma tarde, e totalmente inútil. O objectivo era atribuir tarefas a cada uma das agências, mas ninguém ligava ao Governador, de qualquer forma. Ele queria igualmente explicar-nos que estávamos visivelmente a ajudar o Kabila e as consequências seriam graves. Nessa noite houve um jantar, no dia seguinte uma visita à aldeia e respectivo campo de aviação. Deixei lá um gajo nosso, Jean Longo, um homem extraordinário, corajoso e generoso como só os Zairenses sabem ser, quando querem e quando gostam das pessoas para quem o fazem.
Mas a excitação nas hostes zairenses estava a aumentar indisfarçavelmente e a seguir a um almoço apressado viémo-nos embora, ainda mais depressa do que fôramos. O batelão estava à nossa espera, com o capitão despedido a implorar clemência ao Governador e este a negá-la. Atravessámos para Kindu, fui para casa descansar e tentar repôr os meus orgãos internos nos respectivos lugares. Ao fim da tarde saí e fui para a beira do Rio, o grande rio. Era um daqueles crepúsculos africanos, mágicos, calmos, lindos, em que o dia parece parar e se interroga se deve deixar chegar a noite. O rio em Kindu tem quase um quilómetro de largura, e eu por ali me fiquei, a fumar um cigarro e a falar com o soldado que guardava, solitário, o cais. Estava tudo côr-de-laranja e a noite chegou, como de costume, com licença ou sem ela. Não devia estar ali, era perigoso passear na cidade mesmo de dia, quanto mais à noite, mas a calma e a beleza da tarde eram irresistíveis. O rio fluía, grande, largo, enorme, era sexta feira e parecia que o Kabila não o atravessaria antes do fim do século.
No sábado levantei-me muito cedo e fui para a rádio, como de costume. Estava à espera do resto do material rádio para instalar na agência e era preciso comunicar com Lubumbashi. Para grande espanto meu o Jean bateu-me à porta ainda não eram seis da manhã. Kabila tinha chegado a Kalungo na sexta feira logo depois de nós saírmos. Jean tinha-se safado num camião do exército que fugira logo após as habituais pilhagens. Estava a comunicar com Lubumbashi e a dar-lhes estas últimas novidades quando o tiroteio começou.
Jean foi esconder os jipes e eu fiquei na rádio. Era preciso decidir se o Dakota vinha para Kindu ou não. Às oito fui falar com o Governador, os tiros ainda estavam longe, do outro lado do rio, mas as tropas começavam a afluir. Ninguém gostava de nós, como de costume: é uma das ironias da ajuda humanitária, cada lado pensa que estamos a ajudar o outro - e inveja os nossos meios de comunicação, os nossos carros, o nosso dinheiro. Marie, a minha cozinheira, tremia. Mandei-a embora, e a todo o pessoal. O Governador queria que o Dakota viesse, mais para o levar a ele que para trazer o material, mas às nove e meia dei ordem ao avião para voltar para trás. Deu meia volta e cinco minutos depois um dos motores avariou e parou.
O tiroteio intensificava-se, as colunas de soldados que fugiam eram cada vez maiores, a pilhagem estava perto. Comecei a desmontar todo o material rádio que já tínhamos instalado. Tudo: a única coisa que não embalei mas desmontei e escondi foi o mastro da antena. Tudo o resto foi posto em caixas. A única pessoa que ficou comigo foi o Jean, que arriscava a vida se fosse apanhado ali. Mas ficou. E ajudou-me até eu lhe dar ordens terminantes para se ir embora. Era meio dia e era preciso tomar uma decisão quanto à evacuação: por estrada era impossível, mas eu hesitava em mandar vir um avião. Acabei por dizer que sim, o Gordo dizia-me que era possível. O King Air vinha para Kindu, ETA 4 da tarde. Havia lugar para mim e seis pessoas mais. Uma das minhas empregadas tinha seis filhos e um marido que era médico do Governador. Este queria vir mais o séquito todo. O tiroteio estava cada vez mais forte, mais próximo e o olhar dos soldados quando passavam à frente da delegação cada vez mais agressivo. Fui ao palácio falar com o gordo mas ele não desmordia: era ele que ia, mais o chefe de segurança dele, mais o chefe da polícia, mais não sei quem. Não havia lugar para a empregada, também não me lembro do nome dela.
Argumentei durante uma hora. O homem estava nervoso, tinha a Kalash ao lado e a certa altura pô-la no colo, não para me ameaçar mas porque estava inseguro. Ao fim de uma hora de conversa de chacha disse-lhe: "Monsieur le Gouverneur, agora eu não sou o representante de Cruz Vermelha e o senhor não é o Governador. Sou um homem a falar para outro homem. O que está em causa é saber se vamos salvar a vida de uma mulher e de alguns dos seus filhos ou se o vamos salvar a si, um homem, um soldado". A raiva transpareceu-lho no olhar e na resposta: "Fils de pute" foi a única coisa que me disse, baixinho. Depois de um longo silêncio continuou: "eu fico, ela vai, mas o meu chefe de segurança vai também e amnhã vêm-me buscar".
O mais agoniante foi assistir à senhora a escolher quais dos filhos levava, e a dizer adeus aos outros e ao marido.
Às três da tarde tinha tudo desmontado, empacotado e no jipe que tínhamos mantido. Fui buscar a senhora e segui para o palácio do Governador. O avião não havia maneira de chegar, já não tinha comunicação com eles. A espera foi interminável. Havia tiros por todos os lados. Eu queria ir para o aeroporto mas o gordo não me deixou, mandou-me esperar ali. A tensão era espessa, palpável, transmíssivel, podia cheirar-se e apalpar-se e tocar-se - e ouvir-se. Às quatro e meia consegui estabelecer contacto com o avião por VHF, estavam a quinze minutos e queriam saber se podiam aterrar. Perguntei ao gordo. Disse-me que sim e fez-me jurar que no dia seguinte o ia buscar a ele e ao resto do séquito - tinha sido uma das condições do deal, de qualquer forma. Que sim, claro; ele mandou-me esperar até termos o King Air à vista. Foi aí que arrancámos para o aeroporto. Devagar, muito devagar. As ruas estavam pejadas de soldados que olhavam para nós com uma fúria mal contida. A senhora fazia o que podia para acalmar os filhos e eu fazia o que podia para a acalmar a ela, que tinha deixado os dois mais velhos com o pai. O chefe da segurança acalmava-se com a pistola que levava na mão. Eu ia a guiar o carro, mas havia connosco um soldado para o levar de volta para o gordo. Não havia estradas, ele não o poderia utilizar para fugir.
O avião aterrou e nem desligou os motores: enfiámos as caixas todas lá para dentro, sob a vista dos soldados que enchiam o aeroporto como eu nunca o tinha visto. Fui o último a entrar, por uma questão de teatro ou de treino. Arrancámos e quando chegámos a Lubum bebi um grande, infinito whisky. Nunca mais voltei a Kindu; não sem como é que o Governador de lá saíu.
A nossa casa foi pilhada logo no dia seguinte, mas já lá não havia nada de valor. Das muitas críticas que recebi do pessoal do CICR que me substituiu em Lubum constava o facto de não ter o recibo do dinheiro que tinha deixado ao Jean.
Fiquei em Lubum mais um mês, até ser de novo evacuado, desta vez por estrada. Foi nesses dias que soube que um grupo de 19 padres e duas freiras que tinham passado dias e semanas a pedir-me para os ir buscar tinham sido mortos.
Fizemos o trajecto de Mueda para Quissanga, onde devíamos apanhar o barco para a Grande Quirimba, a uma velocidade estonteante. Chovia como se as comportas do céu tivessem sido abertas por engano, depois de um período de falta de água. Os pneus estavam carecas e por duas vezes saí da estrada, como se estivesse a deslizar em manteiga. Não tinha o mais pequeno controle sobre carro até ele bater nos taludes que ladeavam a estrada e perder, progressivamente, velocidade. Uma vez, no Zaire, fiz uma viagem semelhante, só que não estava a chover e a velocidade era ainda maior.
O Governador ("La Force Tranquille du Manyema") quis fazer uma reunião num buraco qualquer 120 km a leste de Kindu, para mostrar a toda a gente que quem mandava era ele, e que Kabila não lhe metia medo. A reunião começou por estar marcada para uma quarta feira, mas por qualquer razão mudou para quinta. As peripécias começaram logo à partida: o "capitão" do ferry boat não apareceu, fez esperar sua majestade, foi despedido mas obrigado, naturalmente, a fazer a travessia. Íamos em dois jipes: num - convenientemente desnudado do emblema da Cruz Vermelha - o Governador e respectiva escolta, armada até aos dentes. O carro estava cheio a abarrotar, de fora só se viam os canos das Kalashes que sobressaíam da massa escura dos soldados. Noutro, o pessoal da Cruz Vermelha e eu.
Quando chegámos ao outro lado, o condutor do jipe do Governador disse-me que queria ir à frente e pediu-me para o seguir. Tentei fazê-lo e quase o consegui, mas foi o trajecto mais alucinante da minha vida: raramente íamos a menos de 120 numa picada cheia de buracos, com capim mais alto que os carros e exactamente da largura destes. Não tirei a mão da buzina desde que parti, com medo que uma criança se me atravessasse à frente.
Os Toyotas saltavam, dançavam, voavam por aquela picada fora e embora eu soubesse que as armas não se iam pôr a disparar sózinhas não conseguia impedir-me de pensar que uma granada ia cair, ou um soldado destravar a segurança e via constantemente à minha frente uma grande bola de fogo - e nós, no outro carro, alvo da fúria popular - o bem-amado Governador tinha, literalmente, explodido. Era coisa que ele parecia ir fazer a cada instante, o gajo era gordo, enorme, inchado ainda mais pelos 10% que comia da ajuda que nós levávamos para Kindu - coisa que escandalizou as chefias da Cruz Vermelha, coitadas, quando souberam.
Chegámos finalmente a Kalungo, ou coisa que o valha, não me lembro do nome. As outras agências, que não estavam em Kindu, tinham ido de avião. A excitação era enorme, os zairenses andavam cinzentos de medo e nós, os brancos, só por meias palavras percebemos que o Kabila estava perto, muito perto. A reunião foi nessa mesma tarde, e totalmente inútil. O objectivo era atribuir tarefas a cada uma das agências, mas ninguém ligava ao Governador, de qualquer forma. Ele queria igualmente explicar-nos que estávamos visivelmente a ajudar o Kabila e as consequências seriam graves. Nessa noite houve um jantar, no dia seguinte uma visita à aldeia e respectivo campo de aviação. Deixei lá um gajo nosso, Jean Longo, um homem extraordinário, corajoso e generoso como só os Zairenses sabem ser, quando querem e quando gostam das pessoas para quem o fazem.
Mas a excitação nas hostes zairenses estava a aumentar indisfarçavelmente e a seguir a um almoço apressado viémo-nos embora, ainda mais depressa do que fôramos. O batelão estava à nossa espera, com o capitão despedido a implorar clemência ao Governador e este a negá-la. Atravessámos para Kindu, fui para casa descansar e tentar repôr os meus orgãos internos nos respectivos lugares. Ao fim da tarde saí e fui para a beira do Rio, o grande rio. Era um daqueles crepúsculos africanos, mágicos, calmos, lindos, em que o dia parece parar e se interroga se deve deixar chegar a noite. O rio em Kindu tem quase um quilómetro de largura, e eu por ali me fiquei, a fumar um cigarro e a falar com o soldado que guardava, solitário, o cais. Estava tudo côr-de-laranja e a noite chegou, como de costume, com licença ou sem ela. Não devia estar ali, era perigoso passear na cidade mesmo de dia, quanto mais à noite, mas a calma e a beleza da tarde eram irresistíveis. O rio fluía, grande, largo, enorme, era sexta feira e parecia que o Kabila não o atravessaria antes do fim do século.
No sábado levantei-me muito cedo e fui para a rádio, como de costume. Estava à espera do resto do material rádio para instalar na agência e era preciso comunicar com Lubumbashi. Para grande espanto meu o Jean bateu-me à porta ainda não eram seis da manhã. Kabila tinha chegado a Kalungo na sexta feira logo depois de nós saírmos. Jean tinha-se safado num camião do exército que fugira logo após as habituais pilhagens. Estava a comunicar com Lubumbashi e a dar-lhes estas últimas novidades quando o tiroteio começou.
Jean foi esconder os jipes e eu fiquei na rádio. Era preciso decidir se o Dakota vinha para Kindu ou não. Às oito fui falar com o Governador, os tiros ainda estavam longe, do outro lado do rio, mas as tropas começavam a afluir. Ninguém gostava de nós, como de costume: é uma das ironias da ajuda humanitária, cada lado pensa que estamos a ajudar o outro - e inveja os nossos meios de comunicação, os nossos carros, o nosso dinheiro. Marie, a minha cozinheira, tremia. Mandei-a embora, e a todo o pessoal. O Governador queria que o Dakota viesse, mais para o levar a ele que para trazer o material, mas às nove e meia dei ordem ao avião para voltar para trás. Deu meia volta e cinco minutos depois um dos motores avariou e parou.
O tiroteio intensificava-se, as colunas de soldados que fugiam eram cada vez maiores, a pilhagem estava perto. Comecei a desmontar todo o material rádio que já tínhamos instalado. Tudo: a única coisa que não embalei mas desmontei e escondi foi o mastro da antena. Tudo o resto foi posto em caixas. A única pessoa que ficou comigo foi o Jean, que arriscava a vida se fosse apanhado ali. Mas ficou. E ajudou-me até eu lhe dar ordens terminantes para se ir embora. Era meio dia e era preciso tomar uma decisão quanto à evacuação: por estrada era impossível, mas eu hesitava em mandar vir um avião. Acabei por dizer que sim, o Gordo dizia-me que era possível. O King Air vinha para Kindu, ETA 4 da tarde. Havia lugar para mim e seis pessoas mais. Uma das minhas empregadas tinha seis filhos e um marido que era médico do Governador. Este queria vir mais o séquito todo. O tiroteio estava cada vez mais forte, mais próximo e o olhar dos soldados quando passavam à frente da delegação cada vez mais agressivo. Fui ao palácio falar com o gordo mas ele não desmordia: era ele que ia, mais o chefe de segurança dele, mais o chefe da polícia, mais não sei quem. Não havia lugar para a empregada, também não me lembro do nome dela.
Argumentei durante uma hora. O homem estava nervoso, tinha a Kalash ao lado e a certa altura pô-la no colo, não para me ameaçar mas porque estava inseguro. Ao fim de uma hora de conversa de chacha disse-lhe: "Monsieur le Gouverneur, agora eu não sou o representante de Cruz Vermelha e o senhor não é o Governador. Sou um homem a falar para outro homem. O que está em causa é saber se vamos salvar a vida de uma mulher e de alguns dos seus filhos ou se o vamos salvar a si, um homem, um soldado". A raiva transpareceu-lho no olhar e na resposta: "Fils de pute" foi a única coisa que me disse, baixinho. Depois de um longo silêncio continuou: "eu fico, ela vai, mas o meu chefe de segurança vai também e amnhã vêm-me buscar".
O mais agoniante foi assistir à senhora a escolher quais dos filhos levava, e a dizer adeus aos outros e ao marido.
Às três da tarde tinha tudo desmontado, empacotado e no jipe que tínhamos mantido. Fui buscar a senhora e segui para o palácio do Governador. O avião não havia maneira de chegar, já não tinha comunicação com eles. A espera foi interminável. Havia tiros por todos os lados. Eu queria ir para o aeroporto mas o gordo não me deixou, mandou-me esperar ali. A tensão era espessa, palpável, transmíssivel, podia cheirar-se e apalpar-se e tocar-se - e ouvir-se. Às quatro e meia consegui estabelecer contacto com o avião por VHF, estavam a quinze minutos e queriam saber se podiam aterrar. Perguntei ao gordo. Disse-me que sim e fez-me jurar que no dia seguinte o ia buscar a ele e ao resto do séquito - tinha sido uma das condições do deal, de qualquer forma. Que sim, claro; ele mandou-me esperar até termos o King Air à vista. Foi aí que arrancámos para o aeroporto. Devagar, muito devagar. As ruas estavam pejadas de soldados que olhavam para nós com uma fúria mal contida. A senhora fazia o que podia para acalmar os filhos e eu fazia o que podia para a acalmar a ela, que tinha deixado os dois mais velhos com o pai. O chefe da segurança acalmava-se com a pistola que levava na mão. Eu ia a guiar o carro, mas havia connosco um soldado para o levar de volta para o gordo. Não havia estradas, ele não o poderia utilizar para fugir.
O avião aterrou e nem desligou os motores: enfiámos as caixas todas lá para dentro, sob a vista dos soldados que enchiam o aeroporto como eu nunca o tinha visto. Fui o último a entrar, por uma questão de teatro ou de treino. Arrancámos e quando chegámos a Lubum bebi um grande, infinito whisky. Nunca mais voltei a Kindu; não sem como é que o Governador de lá saíu.
A nossa casa foi pilhada logo no dia seguinte, mas já lá não havia nada de valor. Das muitas críticas que recebi do pessoal do CICR que me substituiu em Lubum constava o facto de não ter o recibo do dinheiro que tinha deixado ao Jean.
Fiquei em Lubum mais um mês, até ser de novo evacuado, desta vez por estrada. Foi nesses dias que soube que um grupo de 19 padres e duas freiras que tinham passado dias e semanas a pedir-me para os ir buscar tinham sido mortos.
O último foi
O único músico que restava de um grupo que me acompanhou na adolescência foi-se.
"Acompanhou" não é bem o verbo exacto.
"Le batteur du Jimi Hendrix Experience, Mitch Mitchell, est mort"
Manhã
São três da manhã e já hoje te disse, duas - ou três? - vezes para não dizeres a ninguém aquilo que todos os dias te digo, todo o dia. Não digas que te amo, porque não é verdade; nem que não te amo - tão pouco o é. Não digas que jantei hoje contigo, ou vou jantar amanhã, ou almocei ontem; não digas que nos amámos, ou não.
Não digas nada, porque nada do que eu digo, ou fiz, foi. Não digas nada, porque nada do que és foi, é. Tu és uma miragem que aconteceu a quem saiu do deserto; um deserto de quem não é, és uma duna num mar de areia, uma gota de água num deserto onde há séculos não chove.
Não digas nada, porque uma gota pode ser toda a água do mundo, um grão de areia o mundo todo, o deserto a vida, todas as vidas.
Não digas nada, porque nada do que eu digo, ou fiz, foi. Não digas nada, porque nada do que és foi, é. Tu és uma miragem que aconteceu a quem saiu do deserto; um deserto de quem não é, és uma duna num mar de areia, uma gota de água num deserto onde há séculos não chove.
Não digas nada, porque uma gota pode ser toda a água do mundo, um grão de areia o mundo todo, o deserto a vida, todas as vidas.
O país que temos
Num blog que muito aprecio há um desabafo sobre a qualidade dos nossos políticos. Eu não concordo inteiramente com o que a Luísa diz: os nossos políticos não são piores do que os dos outros, da mesma forma que nós, portugueses, não somos intrinsecamente piores do que os alemães, suíços, franceses ou togoleses. Temos, nós e têm eles, os políticos, as suas qualidades e os seus defeitos. E é evidente (enfim, parece-me) que como toda a gente os políticos respondem a estímulos: se esses estímulos os puxam para cima eles são melhores do que se não houver estímulos, ou não forem suficientemente estimulantes, os estímulos. Há só um ponto, um só, em que por vezes me acontece pensar que a Luísa tem razão, talvez tenha. Pode parecer trivial, banal, vulgar, ordinário - mas é importante e, quiçá, significativo.
Refiro-me às casas de banho dos locais públicos em Portugal. Mesmo para uma pessoa como eu, que poderia ser pequenina e ágil se quisesse - mas não quer - entrar numa casa de banho de um restaurante é uma contradição nos termos: ou vai ao restaurante ou vai à casa de banho; mas não aos dois.
O que torna a coisa realmente incompreensível é haver, sempre, inevitavelmente, duas casas de banho minúsculas - uma para os homens e outra para as senhoras. Dado que dentro dessas casa de banho só pode estar uma pessoa de cada vez (o que não deixa, parfois, de ser lamentável) não consigo impedir-me de perguntar porque não fazem os restaurantes uma casa de banho só, maior.
Um amigo arquitecto, instado sobre tão premente questão, esclareceu-me que na realidade a legislação obriga os locais públicos, minúsculos que sejam, a ter três - 3 - casas de banho: as duas acima citadas e uma para as e os empregados. Por que (é caso para dizê-lo) carga de água os restaurantes não podem eles próprios decidir se querem ter uma, duas ou três casas de banho é questão que me intriga e entristece.
Das duas uma: ou os políticos que decidem tais coisas, coitados, são uns magrichões ginasiados e cabem nas ditas cujas; ou só vão a restaurantes de luxo, onde o comum dos portugueses não pode ir mais do que uma ou duas vezes por semana (como o Gambrinus, por exemplo); ou os donos dos restaurantes não se lembraram, ainda, de lá fechar uns quantos deles, durante meia-dúzia de horas.
A verdade é que as casas de banho são uma imagem do país que temos: pequenas, inacessíveis, incompreensíveis e totalmente desconhecidas dos senhores que fazem as normas (que vivem, eles, noutro país - o que só demonstra que não são completamente estúpidos).
Refiro-me às casas de banho dos locais públicos em Portugal. Mesmo para uma pessoa como eu, que poderia ser pequenina e ágil se quisesse - mas não quer - entrar numa casa de banho de um restaurante é uma contradição nos termos: ou vai ao restaurante ou vai à casa de banho; mas não aos dois.
O que torna a coisa realmente incompreensível é haver, sempre, inevitavelmente, duas casas de banho minúsculas - uma para os homens e outra para as senhoras. Dado que dentro dessas casa de banho só pode estar uma pessoa de cada vez (o que não deixa, parfois, de ser lamentável) não consigo impedir-me de perguntar porque não fazem os restaurantes uma casa de banho só, maior.
Um amigo arquitecto, instado sobre tão premente questão, esclareceu-me que na realidade a legislação obriga os locais públicos, minúsculos que sejam, a ter três - 3 - casas de banho: as duas acima citadas e uma para as e os empregados. Por que (é caso para dizê-lo) carga de água os restaurantes não podem eles próprios decidir se querem ter uma, duas ou três casas de banho é questão que me intriga e entristece.
Das duas uma: ou os políticos que decidem tais coisas, coitados, são uns magrichões ginasiados e cabem nas ditas cujas; ou só vão a restaurantes de luxo, onde o comum dos portugueses não pode ir mais do que uma ou duas vezes por semana (como o Gambrinus, por exemplo); ou os donos dos restaurantes não se lembraram, ainda, de lá fechar uns quantos deles, durante meia-dúzia de horas.
A verdade é que as casas de banho são uma imagem do país que temos: pequenas, inacessíveis, incompreensíveis e totalmente desconhecidas dos senhores que fazem as normas (que vivem, eles, noutro país - o que só demonstra que não são completamente estúpidos).
12.11.08
Diplomacia do croquete
Todos nós conhecemos o papel fundamental que os croquetes desempenham na nossa vida quotidiana. Acho que se impõe, portanto, um pódio dos ditos em Lisboa. Aqui fica, em ordem inversa:
3º : Gambrinus (ex-aequo com muitos outros, excepto no quadro, na qualidade do serviço - enfim, tudo o que está à volta do croquete sem o ser);
2º : Pastelaria Bénard, no Chiado;
1º : Versailles, na Av. da República.
3º : Gambrinus (ex-aequo com muitos outros, excepto no quadro, na qualidade do serviço - enfim, tudo o que está à volta do croquete sem o ser);
2º : Pastelaria Bénard, no Chiado;
1º : Versailles, na Av. da República.
11.11.08
Just three stories.
Com o meu pedido de desculpas ao Jansenista. Não resisto a copiar isto.
É realmente notável.
"When I was young, there was an amazing publication called The Whole Earth Catalog, which was one of the bibles of my generation. It was created by a fellow named Stewart Brand not far from here in Menlo Park, and he brought it to life with his poetic touch. This was in the late 1960's, before personal computers and desktop publishing, so it was all made with typewriters, scissors, and polaroid cameras. It was sort of like Google in paperback form, 35 years before Google came along: it was idealistic, and overflowing with neat tools and great notions.
Stewart and his team put out several issues of The Whole Earth Catalog, and then when it had run its course, they put out a final issue. It was the mid-1970s, and I was your age. On the back cover of their final issue was a photograph of an early morning country road, the kind you might find yourself hitchhiking on if you were so adventurous. Beneath it were the words: "Stay Hungry. Stay Foolish." It was their farewell message as they signed off.
Stay Hungry. Stay Foolish. And I have always wished that for myself. And now, as you graduate to begin anew, I wish that for you.
Stay Hungry. Stay Foolish.
Thank you all very much."
Stewart and his team put out several issues of The Whole Earth Catalog, and then when it had run its course, they put out a final issue. It was the mid-1970s, and I was your age. On the back cover of their final issue was a photograph of an early morning country road, the kind you might find yourself hitchhiking on if you were so adventurous. Beneath it were the words: "Stay Hungry. Stay Foolish." It was their farewell message as they signed off.
Stay Hungry. Stay Foolish. And I have always wished that for myself. And now, as you graduate to begin anew, I wish that for you.
Stay Hungry. Stay Foolish.
Thank you all very much."
É realmente notável.
10.11.08
Vendée Globe
Três dos favoritos estão de regresso ao ponto de partida, com avarias.
Dominique Wavre - de novo na regata;
Bernard Stamm;
Michel Desjoyaux.
Dominique Wavre - de novo na regata;
Bernard Stamm;
Michel Desjoyaux.
Terminal de Contentores de Alcântara, Lisboa et al.
A partir de hoje o Don Vivo vai regressar às suas origens umbiguistas: começarei a escrever sobre os temas relacionados com Lisboa no Cidadania Lx. Quero aqui deixar expresso o meu agradecimento a todos os participantes do Cidadania Lx. É um prazer, e uma honra, integrar aquele colectivo.
A pressa era tanta...
"Protocolo entre a Refer e a APL está em fase final de negociação"
O novo contrato de concessão, entre a Administração do Porto de Lisboa (APL) e a Liscont (empresa do Grupo Mota-Engil que explora o terminal de contentores de Alcântara ) compromete a Refer com a realização de um conjunto de obras, apesar de a empresa pública que gere as linhas ferroviárias não ter assinado esse contrato, nem formalizado ainda qualquer acordo nesse sentido com a APL.
Segundo o jornal «Sol», o contrato entre o Porto de Lisboa e a Liscont diz que estas obras são condição «indispensável à expansão e modernização do terminal». E determina prazos para a sua execução, prevendo mesmo que a Liscont seja indemnizada pela APL se esses prazos não forem cumpridos.
Protocolo em negociação
Só que o facto de a Refer não integrar as «partes contratantes» deste contrato, na prática não a obriga a esse compromisso. Por outro lado, o valor e as condições em que as obras vão ser feitas ainda não estão sequer determinadas com rigor.
«O protocolo entre a Refer e a APL está em fase final de negociação», disse fonte oficial desta empresa, acrescentando: «Decorrem actualmente os trabalhos relativos ao estudo de impacto ambiental. Será a partir das soluções que vierem a ser retidas em sede de processo de avaliação de impacto ambiental, e no seu posterior desenvolvimento em projecto de execução, durante o ano de 2009, que se farão novas estimativas de investimento, baseadas em informação mais detalhada e rigorosa», acrescentou a mesma fonte."
(Via Câmara de Comuns)
O novo contrato de concessão, entre a Administração do Porto de Lisboa (APL) e a Liscont (empresa do Grupo Mota-Engil que explora o terminal de contentores de Alcântara ) compromete a Refer com a realização de um conjunto de obras, apesar de a empresa pública que gere as linhas ferroviárias não ter assinado esse contrato, nem formalizado ainda qualquer acordo nesse sentido com a APL.
Segundo o jornal «Sol», o contrato entre o Porto de Lisboa e a Liscont diz que estas obras são condição «indispensável à expansão e modernização do terminal». E determina prazos para a sua execução, prevendo mesmo que a Liscont seja indemnizada pela APL se esses prazos não forem cumpridos.
Protocolo em negociação
Só que o facto de a Refer não integrar as «partes contratantes» deste contrato, na prática não a obriga a esse compromisso. Por outro lado, o valor e as condições em que as obras vão ser feitas ainda não estão sequer determinadas com rigor.
«O protocolo entre a Refer e a APL está em fase final de negociação», disse fonte oficial desta empresa, acrescentando: «Decorrem actualmente os trabalhos relativos ao estudo de impacto ambiental. Será a partir das soluções que vierem a ser retidas em sede de processo de avaliação de impacto ambiental, e no seu posterior desenvolvimento em projecto de execução, durante o ano de 2009, que se farão novas estimativas de investimento, baseadas em informação mais detalhada e rigorosa», acrescentou a mesma fonte."
(Via Câmara de Comuns)
9.11.08
Escultura, vida
Começo por me apresentar: chamo-me Martim, sou escultor. Não sei a minha idade. É-me indiferente, indefinida. O meu material de trabalho é a pedra: mármore, granito, xisto, basalto, quartzo; a matéria é a vida. "Vasto programa", dirão alguns. Eu não acho. A vida é uma coisa simples: nasce-se, estuda-se, trabalha-se, ama-se, morre-se (a ordem de alguns destes factores é indiferente).
É um programa relativamente limitado. O meu sucesso (sou um escultor reconhecido, ganhei vários prémios, represento o nosso país em exposições internacionais, chamam-me muitas vezes para programas de televisão) deve-se, penso, a esta capacidade para definir claramente os limites do meu tabalho e daquilo que quero exprimir.
Gosto da pedra, da sua inflexibilidade, da sua intolerância. Os outros artistas - escritores, poetas, fotógrafos, músicos - têm muito mais sorte; o material deles é soft, apaga-se e recomeça-se. A minha não: um erro e é todo o bloco que vai embora, ou para obras mais pequenas. A vida não é assim; aceita uma determinada quantidade de erros, de tentativas, e não é por isso que fica inutilizada. Parece-me. Não sei.
A verdade é que escrevo estas linhas porque me apareceu um problema novo: como transformar em pedra a solidão? Primeiro tentei aprender a chorar, o que consegui com uma relativa facilidade. Fiz uma lágrima, uma enorme lágrima: três metros por um, linda, toda em mármore. Mas essa lágrima (que hoje está exposta num jardim público da nossa cidade e é vista todas os dias por milhares de pessoas) não exprime o que quero dizer. A solidão não é isso, um bocado de mármore numa praça pública. É um peso a cada passo, um eco afónico, trocista que nos persegue onde quer que estejamos.
E isso eu não sei transformar em pedra.
É um programa relativamente limitado. O meu sucesso (sou um escultor reconhecido, ganhei vários prémios, represento o nosso país em exposições internacionais, chamam-me muitas vezes para programas de televisão) deve-se, penso, a esta capacidade para definir claramente os limites do meu tabalho e daquilo que quero exprimir.
Gosto da pedra, da sua inflexibilidade, da sua intolerância. Os outros artistas - escritores, poetas, fotógrafos, músicos - têm muito mais sorte; o material deles é soft, apaga-se e recomeça-se. A minha não: um erro e é todo o bloco que vai embora, ou para obras mais pequenas. A vida não é assim; aceita uma determinada quantidade de erros, de tentativas, e não é por isso que fica inutilizada. Parece-me. Não sei.
A verdade é que escrevo estas linhas porque me apareceu um problema novo: como transformar em pedra a solidão? Primeiro tentei aprender a chorar, o que consegui com uma relativa facilidade. Fiz uma lágrima, uma enorme lágrima: três metros por um, linda, toda em mármore. Mas essa lágrima (que hoje está exposta num jardim público da nossa cidade e é vista todas os dias por milhares de pessoas) não exprime o que quero dizer. A solidão não é isso, um bocado de mármore numa praça pública. É um peso a cada passo, um eco afónico, trocista que nos persegue onde quer que estejamos.
E isso eu não sei transformar em pedra.
Praga, benção
Rai's partam a jovem, com um par de seios empinados como dois potros a fazer cabriolas. Abençoada seja. Sejam.
Gostos não se discutem
Gosto de mulheres pequenas, magrinhas, secas, daquelas que ao primeiro olhar nos dizem "vou transformar-te a vida num inferno, ad seculum seculorum. Também gosto de mulheres grandes, enrobées, altas, sorridentes, para quem os próximos séculos serão uma versão terrestre do paraíso.
E gosto de todas as que estão no meio.
E gosto de todas as que estão no meio.
Sequências
Há sequências agradáveis: o pedido de um Alexander e o ruído do shaker logo a seguir, por exemplo. Um olhar e um sim.
Subscrever:
Mensagens (Atom)